PIB E CLIMA
Vistos isoladamente, sem contexto, parecem números expressivos. O PIB do Rio Grande do Sul cresceu 2,3% no segundo trimestre frente aos três meses iniciais do ano. No primeiro semestre, o avanço foi de 4,5% na comparação com igual período de 2022, de acordo com os cálculos do Departamento de Economia e Estatística (DEE), vinculado à Secretaria de Planejamento, Governança e Gestão do governo gaúcho.
O desempenho, no entanto, tem de ser relativizado, em função da base baixa de comparação. O Estado, afinal, viu a soma de suas riquezas encolher 5,1% no ano passado devido à severa estiagem que devastou as lavouras de verão, em especial as de soja, de maior peso nas contas. Este ano, a agropecuária gaúcha também sofreu com a falta de chuva, mas o impacto foi menor do que no ciclo anterior, o que ajuda a fazer parecer que o PIB do Rio Grande do Sul teve uma boa performance na metade inicial de 2023.
Não bastasse o déficit hídrico em três dos últimos quatro anos, o quadro se reverteu drasticamente para o outro extremo, com o excesso de chuvas. As enxurradas impuseram perdas significativas à economia do Vale do Taquari, uma das regiões mais dinâmicas do Estado, e tendem a causar prejuízos às lavouras de inverno, em especial o trigo, com impacto na economia na segunda metade do ano.
A grande capilaridade do agronegócio do Rio Grande Sul torna inevitável que ocorram reflexos em outros setores, como indústria, comércio e serviços. O aguaceiro e as inundações também causam estragos à infraestrutura, notadamente a rodoviária, atrapalhando a logística. De acordo com a Confederação Nacional dos Municípios (CNM), secas e chuvaradas levaram a perdas de R$ 83 bilhões no Rio Grande do Sul de 2013 a 2023.
Os vários desastres naturais que afetaram a atividade nos últimos anos reforçam a importância de a resiliência climática não ser mais um fator negligenciado daqui para a frente. Os principais setores da economia, com a colaboração da academia e do poder público, que exercem importante papel, em especial quanto ao planejamento, terão de se adaptar à chegada de novos eventos extremos. Não se trata mais de apenas ser previdente em relação a secas, com investimentos em irrigação, tema recorrente entre os gaúchos nos últimos tempos, mas de mitigar os perigos relacionados a inundações.
Se no futuro chuvas torrenciais tendem a ser mais repetidas e intensas, há necessidade de maiores cuidados com áreas de risco, não apenas em relação a moradias, mas às atividades econômicas desenvolvidas nestes locais. São imprescindíveis também intervenções voltadas a evitar ou diminuir o impacto de enchentes, evitando prejuízos e perdas de vidas. Vale o mesmo para estradas ou pontes, que terão de ser mais resistentes à fúria das águas.
As mudanças climáticas, ao que parece, eram na prática uma preocupação distante, imaginada para as próximas décadas. Um exemplo dessa postura é o estudo financiado pelo Banco Mundial, concluído em 2017, para nortear a política de gestão de risco de desastres para o Rio Grande do Sul. O trabalho, como revelou em Zero Hora ontem o repórter Vinicius Coimbra, foi contratado para embasar um projeto de lei, o que não ocorreu.
O governo sustenta que implementou as sugestões do estudo ao longo dos últimos anos, mas é fato que a consolidação da legislação não avançou. Os gaúchos constatam da pior forma que é um tema urgente. Aguarda-se que seja retomado e, em breve, transforme-se em uma ferramenta para o Estado enfrentar um problema que não está mais no futuro. É do presente.
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