segunda-feira, 25 de setembro de 2023


25 DE SETEMBRO DE 2023
CARPINEJAR

Setembro Amarelo. Precisamos falar sobre suicídio, sobre o Setembro Amarelo. Há vários erros de interpretação do comportamento de quem se mata que enganam a prevenção.

Em primeiro lugar, você procura um motivo. Raramente há. Um motivo é como um objetivo, exige esperança. E o suicida não tem vontade mais de esclarecer coisa alguma. É uma desistência de ser ouvido, é uma neutralidade oriunda do cansaço mental. Acha que ninguém vai compreender o que está passando, já que ele não sabe explicar. Os dias se parecem nos altos e baixos, os dias são paredes moucas de interlocutores.

Quando o intento não é político, ou passional, ou devido a uma doença, ele não encontra ânimo sequer para a reciprocidade de um bilhete. Existe um analfabetismo emocional: não consegue mais ler, escrever e falar, numa condição iletrada e ilhada do desespero.

Redigir uma carta já o salvaria, porque colocaria a culpa represada para fora, recuperaria a consciência do seu corpo, a possibilidade de comunicação. O segundo ponto é que o suicida tampouco detesta a vida, pelo contrário, ama loucamente a vida. Esse é o principal equívoco que não nos permite enxergar aquele que está carecendo de ajuda.

Ele usufrui a vida com tamanha intensidade que se perde na medida e no controle. Entrega-se a cada instante com imensa fragilidade, não guardando energia para o recolhimento ou a solidão. Simplesmente não se protege dos relacionamentos, esperando que possam corresponder às suas expectativas ou apresentar o mesmo padrão de doação.

É mais suscetível a disparates e faíscas que possam subtrair a sua existência por um momento irrefletido. Não conta com a retaguarda das incertezas, com o escudo das dúvidas, com as censuras alertas.

Assim como se dedica, do nada, a gestos de extrema generosidade, também é impulsivo para se destruir gratuitamente. Sua impulsividade é para o bem e para o mal.

Num repente, explode. Ele sente muito mais do que pensa. Seu desaparecimento é um entre tantos atos impensados que adotou antes em sua trajetória. Nunca chamaram atenção por não representar algum risco letal. É alguém que jamais planeja a volta, só se dedica a ir, a testar os seus limites.

O terceiro ponto, o mais controvertido de todos, vem da dificuldade de desconfiar da ação intempestiva. Ele se mostra cheio de planos e projetos, segue a sua agenda como se fosse viver até a velhice, é capaz de participar festivamente de um encontro na véspera, de passar a sua roupa para a manhã seguinte, de fazer o check-in de uma viagem para o próximo final de semana. Não demonstra as suas sombras e trevas, pois nem sempre está se sentindo insignificante.

A faceta mais perigosa para o fim prematuro não é a tristeza - quem está triste chora -, mas a euforia, indicando que ele está exageradamente fora de si, com promessas exigentes de interação.

Pagará um preço alto no retorno à normalidade. Trata-se de experimentar uma potência absurda que não admite depois o tédio. É como ter sucesso fenomenal num dia e fracasso retumbante no outro.

É comum que ninguém entenda o que aconteceu, já que a vítima tinha tudo para ser feliz. A brutal ressaca existencial faz com que ela acredite que não é ninguém importante, que não fará diferença no mundo. Ela mesma mudaria de ideia se sobrevivesse.

CARPINEJAR

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