quarta-feira, 13 de setembro de 2023

13 DE SETEMBRO DE 2023
MÁRIO CORSO

Ainda dá tempo

O mundo perdeu um dos seus críticos. Domenico De Masi morreu na semana passada. Quando ele começou a denunciar a insanidade da correria de nossos dias, a falta de tempo de qualidade, foi profético, pois não estava tão ruim como agora. Já trabalhávamos muito e vivíamos pouco, agora piorou.

Sua questão era como equilibrar nossa vida para não nos enredarmos numa intensidade de trabalho, que parece ser muito produtiva, mas não é. Ele defende mais ócio, um período para não fazer nada, para podermos assimilar o que vivemos e sermos mais criativos. Sem distanciamento, sem um olhar de fora, a tendência é continuar nas rotinas insensatas e pouco produtivas. É um paradoxo: se você não se desfocar, depois não acerta o melhor foco.

Walter Benjamin tem uma frase síntese: O tédio é o pássaro que choca os ovos da experiência. A questão não é só ter vivido algo, é preciso assimilar. Para tanto são imprescindíveis a pausa e o vazio, para que incorporemos o vivido como experiência. Um mundo sem tempo livre tende à pobreza de experiências. Sem a lenta assimilação, o que foi vivido, e não narrado, escorre com a chuva da rotina.

Uma vida sem experiências vai além do empobrecimento. O consumismo impera. Nele evidencia-se que não se ultrapassa a dinâmica do trabalhar/comprar. E revela que os objetos não nos suprem. Insistimos na deriva das compras, para não enfrentarmos que navegamos uma existência insípida. Nos endividamos para ter um guarda-roupa para três encarnações. Trocamos horas de vida por um carro acima das nossas posses, para que nosso vazio ao menos tenha moldura.

Quanto tempo suamos para comprar bugigangas que sinalizariam termos uma boa vida para outras pessoas que trabalham para fingir ter uma boa vida?

Outra causa da falta de experiência é a aceleração da vida. Quando se vive velozmente, pouco retém-se do vivido. Vive-se freneticamente na tentativa de sentir algo duradouro. É como a compulsão por comida, como nada sacia, segue-se devorando sem nunca se sentir satisfeito. O espírito fabril vazou para o mundo de tal forma que agora exigimos de nós melhores performances até no gozo da vida.

Quando pergunta-se aos idosos em que eles mudariam se pudessem voltar no tempo, a resposta é quase sempre a mesma: teriam trabalhado menos para passar mais tempo com seus queridos. Ainda dá tempo.

MÁRIO CORSO

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