26 DE SETEMBRO DE 2023
CARPINEJAR
Viagem perdida
Quando saí de uma palestra, a coordenação do evento solicitou veículo. Recebi a placa e o itinerário do condutor chegando. Calculei que era ele estacionado em frente à Fiergs. A pressa é inimiga do destino.
Entrei pela porta de trás do carro. Em vez de anunciar o nome do motorista, falei meu nome.
- Fabrício? - Fabrício!
A gente partiu para minha casa em Petrópolis. Estranhei o caminho, muito diferente dos itinerários tradicionais pelas avenidas principais. Não opinei, devia ser uma rota mais rápida e alternativa do Waze.
De repente, o sistema do Uber caiu. Como se a viagem tivesse sido cancelada pelo usuário. Como se eu não tivesse embarcado. Acreditei que fosse um bug. Não havia como conferir e tirar a teima porque não contava com o mapa do trajeto em tempo real. Para mim, era uma andança no escuro desprovida de controle, de monitoramento, encaminhada e paga por um terceiro.
Ele desligou e ligou o celular, e não existia mais nenhuma corrida em andamento. Nossos dados desapareceram, o aplicativo sequer apresentava algum registro de sua ocorrência.
Ele explicou a situação embaraçosa, sua incapacidade de seguir adiante. Retruquei que não havia como descer à 1h da matina, em bairro distante, que não se mostrava residencial, naquele deserto. Além do perigo e da insegurança, encontraria sérias dificuldades para localizar um novo veículo. Faltavam-me, inclusive, referências geográficas para dizer onde estava.
Sugeri de imediato uma solução: pagar com Pix. O motorista não tinha Pix.
Não sou de me entregar sem luta. Pensei, pensei e, no desespero da carência, ofereci o único pertence de que desfrutava no momento: o meu livro. - Aceita meu livro autografado como pagamento? Se ele recusasse, eu me sentiria o mais rejeitado dos escritores. Meu coração seria despejado num sebo. Corri um risco desnecessário para o amor-próprio.
Mas não é que ele aceitou? Ufa!
Talvez tenha sido para se livrar do problema, encerrar o nosso capítulo de constrangimento. Eu nem quis questionar o mérito da sua concordância. Logo perguntei seu nome para fazer a dedicatória e resolver o assunto (vá que ele mudasse de ideia).
Ele disse:
- Escreva para mim: Fabrício!
Era evidente que se tratava de um carro errado. Na minha entrada, o motorista pensou que o estava chamando quando eu só me apresentava. O equívoco partiu dos nomes iguais. Conheci um imprevisível xará. Essa história de pedir viagem por aplicativo em nome de alguém jamais dará certo. É princípio de confusão. É oferecer carona para o acaso.
Ainda não tenho certeza se ganhei um leitor, permaneço em dúvida. Desconfio que ele pode espalhar que aquele Carpinejar é mão de vaca, não tem dinheiro para nada.
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