quarta-feira, 25 de novembro de 2015


25 de novembro de 2015 | N° 18366 
DAVID COIMBRA

No tempo do Fuscão


No domingo, o zagueiro Erazo, do Grêmio, me fez voltar suavemente ao passado. Erazo é chamado de El Elegante em seu país, o Equador. Ele é elegante mesmo. Tem um jeito de jogar sofisticado.

Ocorre que, nos anos 1970, o Grêmio tinha, na mesma posição de Erazo, então chamada de “quarta-zaga”, um jogador igualmente elegante e sofisticado, o Beto Fuscão.

Beto Fuscão gostava de sair jogando com a bola nos pés, a cabeça erguida, pronto para o passe escorreito, para a jogada que tiraria um ó da torcida.

Beto Fuscão queria ser Luís Pereira, o zagueirão, do supertime do Palmeiras, jogador de Seleção Brasileira, homem que, por coincidência, também tinha codinome de carro: Chevrolet.

Uns diziam que era por isso que o Beto Fuscão fora apelidado de Fuscão, outros diziam que era por seu par de glúteos assemelhar-se a um capô de Fusca. Não sei, não consigo me lembrar das nádegas do Beto Fuscão, e nem quero ter essa recordação impressa em minha mente. Só sei que Beto Fuscão acabou indo jogar, justamente, no Palmeiras, depois de sair do Grêmio, o que me leva a acreditar, aliviado, na comparação com o Luís Pereira.

De qualquer forma, o fato é que Beto Fuscão também poderia ser chamado de El Elegante. Seria capaz de fazer o que Erazo fez nesse domingo de reminiscências: entrar flutuando numa dividida na última instância da grande área, durante um clássico Gre-Nal, e tentar tirar a bola de letra, delicadamente.

No outro lado da bola e do campo, no Inter, havia, agora, um Rodrigo Dourado nem tão delicado, nem tão elegante, poder-se-ia dizer até rude. Assim como rudes eram, nos anos 1970, os dois quartos-zagueiros que se revezavam no time do Inter, em oposição a Beto Fuscão. Eles poderiam ser chamados, ambos, de El Tosco.

Um, Bibiano Pontes, pertencia a um clã de homens maus dos campos de futebol. Eram chamados, não sem medo, de Os Irmãos Pontes: João, Daison e Bibiano. Construíram a lenda de um time histórico, o Gaúcho de Passo Fundo. Nenhum atacante entrava na área do Gaúcho impunemente. Bibiano jogava falando o tempo todo, como se narrasse a partida. Às vezes, no Inter, quando o atacante tentava driblá-lo, ele dizia:

– Vai pra cima do Figueroa, que ganha mais! E em seguida mandava o adversário para o alambrado com um ombraço ou uma bicanca. Nada educado.

O outro quarto-zagueiro era o Hermínio. Não foram poucas as vezes que ouvi chamarem-no, carinhosamente, de açougueiro. Tenho a impressão de que Hermínio ficou marcado por uma derrota do Inter, um dos maiores jogos que vi: 5 a 4 para o Cruzeiro, no Mineirão. Se foi isso, foi injustiça. Naquele jogo, quem falhou foi Figueroa. Os erros que Figueroa cometeu, pelo menos três, gravíssimos todos, não condiziam com a imagem de implacável zagueiro que ele era.

Aliás, implacável é adjetivo adequado para o caso de Figueroa. Como Pontes e Hermínio, ele era duro, firme, às vezes malvado e, longe da área, não raro também elegante, como Erazo.

Mas sempre longe da área. Perto da área, ou angustiantemente dentro dela, elegante era o Beto Fuscão.

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