17 de novembro de 2015 | N° 18358
DAVID COIMBRA
Civilização x barbárie
Em algumas nações do planeta, a civilização atingiu seus objetivos. Ou, pelo menos, grande parte deles. Pela primeira vez, na história do mundo, há lugares em que as diferenças entre as pessoas são respeitadas e garantidas pela lei, a imprensa é livre, o racismo e a homofobia são condenados, mulheres e homens têm os mesmos direitos, os animais e a natureza são protegidos, e a educação das crianças é assegurada pelo Estado.
Isso ocorre nos Estados Unidos, no Canadá, na Europa Central, nos países nórdicos, na Grã-Bretanha, no Japão, na Coreia do Sul, em Israel, na Austrália e na Nova Zelândia.
O que esses Estados têm em comum?
Todos são democracias capitalistas, seus governos são laicos e o funcionamento da sua sociedade está baseado no estrito cumprimento da lei – são sociedades legalistas.
O Brasil está quase lá. Falta tornar-se uma sociedade legalista.
Países de cultura muçulmana, em geral, não gozam de nada disso. São, quase todos, autocracias e teocracias. Os cidadãos não têm direito a voto, a imprensa não é livre e qualquer opinião pode ser perigosa. Em muitos desses lugares, as mulheres são obrigadas a andar cobertas da cabeça aos pés. Elas não podem dirigir, são apartadas dos homens e não saem sozinhas de casa. As adúlteras são apedrejadas até a morte, os condenados pela Justiça sofrem mutilações ou são espancados com chibatadas, os homossexuais sofrem violenta repressão e, em Estados mais radicais, podem ser executados.
Repare que não falei em religião muçulmana. Falei em “cultura” muçulmana. Porque os fundamentos da religião pouco importam; importa é a sua interpretação.
O Ocidente já passou por essa experiência. Mesmo esses desenvolvidos e civilizados países que citei já foram governados por autocracias ou por teocracias, já promoveram violenta discriminação racial, sexual e de gênero, já mataram, mutilaram, queimaram e açoitaram inocentes. Mas isso foi há muito tempo.
A dor fez o Ocidente civilizar-se. A Inquisição foi extinta, a escravidão foi banida e os Direitos Humanos se transformaram em lei internacional. A maior de todas as tragédias ocidentais, a II Guerra Mundial, enterrou filosoficamente as ditaduras e o racismo; economicamente, jogou a mulher no mercado de trabalho e, assim, assegurou-lhe direitos iguais aos do homem; socialmente, elevou o indivíduo e relativizou a importância do Estado. A posterior derrota do comunismo cristalizou ainda mais os direitos individuais e erigiu a democracia como um bem em si.
Não foi fácil chegar a esse estágio. Foi uma longa e sinuosa estrada, como diriam Lennon & McCartney. Mas o Ocidente conseguiu. Não são sociedades perfeitas, porque sociedades perfeitas não há, pela simples razão de que são, exatamente, sociedades. Ou seja, associações humanas, e nenhuma associação humana jamais será perfeita. Essa perfeição nunca será alcançada, portanto. Mas a excelência já o foi.
É o que temos diante de nós, agora: de um lado, a civilização; de outro, a barbárie. Se está correto afirmar que a religião muçulmana não é responsável pela barbárie, também está correto afirmar que a cultura da maioria dos países muçulmanos é. A cultura da discriminação, da exclusão e da tirania tem de ser repelida por todos, cristãos, judeus, budistas e muçulmanos, ocidentais ou orientais. Não em nome das nações.
Em nome do ser humano.
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