quarta-feira, 18 de novembro de 2015



18 de novembro de 2015 | N° 18359 
DAVID COIMBRA

Um cara na estação


Tinha um cara, na estação do trem, que não parava de olhar o celular. É claro que, tanto dentro dos trens como nas estações, todas as pessoas ficam olhando para seus celulares, mas aquele homem fazia diferente. A cada minuto, ele conferia a telinha e depois olhava em volta, nervoso. Estava esperando a chegada de alguém ou de alguma mensagem de texto. Ou ambos.

Era um jovem. Calculei que fosse estudante de uma dessas dezenas de universidades de Boston. Vestia o usual: tênis, jeans e um casaco acolchoado de esqui, que o inverno vem vindo, e com fúria.

A impaciência dele começou a me angustiar. Ele batia a perna, respirava fundo, suspirava, gemia, cutucava o celular com o indicador, esticava o olhar para ver se distinguia a luz do trem no fundo do túnel... Cristo! O rapaz estava muito aflito. Achei até que, em certo momento, ele elevou o olhar para o alto e implorou:

– God!

Não tenho certeza daquele God. Foi algo mudo. Mas que houve súplica ao Além, houve.

Fiquei compadecido. Ele parecia boa pessoa. Devia estar passando por alguma pesada dificuldade. Pus-me a especular: seria dinheiro ou mulher? São esses, em geral, os motivos dos dramas dos homens. Examinei-o outra vez. Era muito jovem para debater-se com problemas de dinheiro. Problemas de dinheiro só surgem quando as necessidades sofisticam-se, e um jovem só tem necessidades básicas a serem atendidas: uma cama em algum lugar para repor as energias, uma comida que iluda a fome e cerveja barata, porém gelada, para partilhar com os amigos.

Só podia ser mulher. No exato segundo em que cheguei a essa conclusão, ele esticou o pescoço, arregalou os olhos, abriu a boca e estendeu os braços para uma mulher que entrava correndo na estação.

“Ah!”, disse para mim mesmo, congratulando-me pela minha dedução de Hercule Poirot.

Os olhos dela eram castanhos. Ou negros, não tenho certeza. Cabelo escuro, à altura dos ombros. Morena. Magra. Bonita. Jovem também, mas não tanto quanto ele. Ele tinha uns vinte e poucos; ela, mais de 30. Trinta e um, arrisquei. Trinta e um, decidi.

Ela estava tão ansiosa quanto ele. Queria lhe dizer algo. E eu queria ouvir. Eu precisava ouvir!

Então, para meu supremo desespero, o trem surgiu lá adiante. As pessoas moveram-se na estação, preparando-se para embarcar. O rapaz continuou olhando para ela, só para ela, e ela se aproximava. Estava a uns 10 passos dele. O trem parou. As portas se abriram. Os passageiros começaram a entrar.

Ela também parou. Postou-se bem perto dele, os braços ao longo do corpo, olhando-o nos olhos. Dei um passo em direção à porta do trem. Tinha de entrar, ou ia perdê-lo. Avancei olhando para o lado, olhando para o casal. Alcancei a porta, ainda observando-os. O trem já ia partir. Eu via o rosto da morena e a nuca do rapaz. Apoiei o pé direito no degrau da porta do trem. Esperei um segundo. E ouvi, nitidamente, quando ela disse:

– Ele sabe. Entrei. O trem partiu, deixando-os na estação.

Ele sabe, pensei. Ele sabe. Como descobriu? Quem contou para ele? Ele sabe. Oh, Deus, ele não podia saber!

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