segunda-feira, 16 de novembro de 2015



16 de novembro de 2015 | N° 18357 
DAVID COIMBRA

O Ocidente não tem culpa

Houve algo que me surpreendeu quando encontrei os guerrilheiros das Farc no alto dos Andes, década e meia atrás.

Já contei essa história, não vou repeti-la, que é longa. Apenas explico que entrevistei guerrilheiros das Farc nas montanhas colombianas, e o que me espantou, ao deparar com eles, foi vê-los tão arrumadinhos. Vestiam, todos, fardas militares muito alinhadas, como se fizessem parte de um exército regular.

Ora, guerrilheiros e terroristas simplesmente não podem andar uniformizados, porque a clandestinidade é sua maior força. A tática é essa. É nunca lutar em campo aberto, é bater e tirar a mão, é dar o soco e correr.

Na II Guerra, alemães bombardearam Londres, ingleses destruíram Dresden, americanos lançaram duas bombas atômicas sobre o Japão, japoneses escravizaram chineses e russos estupraram 2 milhões de mulheres alemãs. Crimes terríveis, mas, quando a paz foi assinada, as hostilidades cessaram e os povos reataram velhas amizades. Com o terror isso é impossível, porque o terror é diluído e fugidio, não existe oficialmente, não é uma luta de exército contra exército, ou de governo contra governo, é uma luta de assassinos armados contra vítimas indefesas.

O Estado Islâmico não é um Estado. É uma reunião de monstros em busca de justificativa para exercer sua monstruosidade. Tanto faz, para o fanático, a razão de seu fanatismo. Pode ser religião, pode ser ideologia, pode ser futebol. Pouco importa. Um radical sempre é um idiota, esteja ele à esquerda ou à direita, leve ele um crucifixo pendurado no peito ou porte uma bandeira com um crescente e uma estrela.

Ninguém é responsável pelo fato de o idiota ser um idiota, a não ser ele mesmo. Essa história de que o Ocidente tem culpa pela existência do Estado Islâmico é uma simplificação obtusa com aparência de análise histórica. Nenhum fanático precisa de ajuda para ser fanático.

É óbvio que as políticas externas dos países do Ocidente não são ideais, e isso é muito criticado, exatamente, no Ocidente. Nos Estados Unidos, é liberal e progressista ser contra a política externa americana.

Na semana passada, eu caminhava por uma das principais avenidas de Boston, a Beacon Street, e deparei com um cartaz com uma foto de Obama ostentando, debaixo do nariz, o bigodinho de mosca de Hitler. Ao lado, outro cartaz em que estrelava a nossa Dilma Rousseff. Fiquei surpreso. Era uma manifestação de um casal americano moderno, por assim dizer. Eles pediam o impeachment... de Obama! Fui perguntar por quê. Responderam que são contra a política externa dos Estados Unidos e que defendem a entrada do país... nos Brics!

Veja só.

Bem, é evidente que esse é um caso folclórico, mas há muitos analistas respeitáveis, estrelas de universidades caríssimas, que estão prontos a jogar nas costas dos Estados Unidos e da Europa a responsabilidade por cada mulher que é castrada na África, cada apedrejamento de adúltera na Arábia Saudita, cada homem que é queimado vivo no Iraque, cada cristão que é crucificado na Síria. Não passa de mera balela ideológica. 

As políticas externas da Europa e dos Estados Unidos têm de ser reajustadas, sim; têm de apoiar democracias e rejeitar tiranias, sim; têm de levar em consideração que um erro cometido na periferia do mundo se reflete em todas as capitais, sim. Tudo isso é verdade. Mas o culpado pelos atentados de Paris é o Estado Islâmico. E o Estado Islâmico tem de ser derrotado. Sem ponderações, sem relativizações, sem hesitação e, sobretudo, sem demora.

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