sábado, 27 de setembro de 2014


27 de setembro de 2014 | N° 17935
NÍLSON SOUZA

UMA MENINA CHAMADA CONSCIÊNCIA

Ela completará 50 anos na próxima segunda-feira, mas será sempre menina – e será também eterna, creio, pois vem resistindo ao tempo e ao desencanto de seu criador. Falo de Mafalda, a genial personagem do cartunista argentino Quino, uma garotinha de seis anos que reúne lucidez, inteligência, ironia, humanismo e faz o leitor pensar e sorrir amarelo em apenas quatro quadrinhos. Mafalda é tudo de bom.

Conheci-a na década de 1970, quando visitei a Argentina pela primeira vez, em viagem de trabalho. Na época, o escriba aqui passava a sanduíches para poupar os trocados da diária. Mas o encontro com Mafalda abalou a minha poupança: deixei tudo na banca de jornal em troca de uma coleção de 10 revistas que aumentaram o peso da minha bagagem na volta. Mas valeu a pena. Ainda me lembro de pérolas da Guerra Fria, como a tirinha em que a professora de matemática anunciava para os alunos:

– Hoje vamos estudar o pentágono.

E Mafalda, com seu senso de justiça saindo pelos poros do dedo levantado:

– E amanhã o Kremlin?

Quino parou de desenhar Mafalda em 1973, mas a garota e sua turminha já tinham ganhado vida própria e conquistado o mundo. Impossível não simpatizar com aquelas crianças que interpretavam tão bem sentimentos universais:

Mafalda, questionadora dos políticos e dos poderosos, crítica das injustiças e inimiga da sopa; Filipe, angustiado com as obrigações escolares; Manolo, obcecado por negócios e pelos lucros do armazém do pai; Susanita, fútil, egoísta e invejosa; Miguelito, ingênuo e hesitante; Libertad, pequena e corajosa como a liberdade; Guile, o irmãozinho da heroína, concentrado no seu aprendizado de mundo, e mais os adultos, sempre entre o espanto e a perplexidade.

Na semana passada, reencontrei Mafalda numa livraria de Porto Alegre em álbuns de capa grossa. Não tive dúvida: levei a menina chamada consciência para passar o seu aniversário lá em casa.

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