26 de setembro de 2014 |
N° 17934
MOISÉS MENDES
Eu voto, tu votas, ele anula
Até os 30 anos, eu carregava 50
certezas absolutas. Venho perdendo, em média, uma por ano. Se minhas contas
estiverem certas, não terei nenhuma certeza categórica por volta dos 80 anos e
passarei então a viver na dúvida.
Hoje, uma das certezas que tenho
é de que a democracia não conta com a submissão incondicional de pelo menos um
quarto dos brasileiros habilitados a votar. Me baseio no número dos que não
aparecem nas eleições, votam em branco ou anulam o voto.
No segundo turno da última
eleição para a Presidência, esse pessoal chegou a 36,6 milhões de eleitores, ou
26,76% do total.
Você, que detesta este tipo de
conversa, não desista da leitura, porque você pode ter o perfil desses 26,76%
que não escolhem ninguém, porque se abstêm ou decidem que nenhum candidato
merece mesmo seu voto. Neste ano, mantido o percentual, seriam 38 milhões de
pessoas. É muita gente. São dois Rios Grandes do Sul e uma Bahia.
A abstenção é o dado mais
instigante, considerando-se que votar é uma obrigação: 21,5% não participaram
da eleição no segundo turno de 2010.
O que há com esse povo? Sabemos
que a abstenção é provocada por chuvaradas, dificuldade de transporte, doença,
falta de hábito (no caso dos jovens) ou dor de dente. Pode ser, mas não dá pra
explicar tanta ausência apenas por imprevistos e fatores alheios à vontade do
eleitor. Abster-se não é, como se pensa, só coisa de pobre ou de áreas rurais.
Quem vota em branco ou anula o
voto também manda recados. Pode, claro, errar na hora de apertar botões ou
estar alheio a tudo e apenas bater ponto. No mínimo, é indiferença aos apelos
de uma eleição.
Se você tem 12 eleitores na
família, contando casal, filhos e o entorno de sogra, sogro, cunhados e
agregados, pelo índice citado acima, três podem estar fora da escolha direta no
segundo turno das eleições. Mas estarão participando, indiretamente, com alguma
forma de negação – ausência, voto em branco ou voto nulo.
Até agora, esses três podem estar
negaceando. Um dia dizem que vão de Zé Maria, no outro se apegam ao Fidelix ou
ao Eymael. Os três parentes podem pegar a freeway no dia das eleições ou
aparecer na seção eleitoral só pra cravar branco ou nulo. E entrarão, então, na
estatística dos 26,76%.
Digo isso porque não conheço
ninguém que se enquadre nesse um quarto de eleitores que se ausentam ou refugam
todos os candidatos. Já saí a perguntar na Redação: quem vai votar em branco ou
anular? Quem vai pra praia nas eleições? Não acho ninguém. Faça o teste aí na
firma.
Esse eleitor é esquivo, você
raramente o localiza. É como achar algum conhecido que tenha passado pra
Medicina na UFRGS.
O anulador ou branqueador de voto
está misturado a anarquistas e fascistas convictos. Pode ser o desiludido com a
democracia, o enfarado com escolhas erradas ou o que acha que ninguém presta.
Quem viaja para longe das urnas
nas eleições, anula o voto ou vota em branco é alguém que perdeu certezas ou
talvez tenha se livrado de uma grande dúvida.
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