23 de setembro de 2014 |
N° 17931
DAVID COIMBRA
HOMENS DE VERDADE
Os valores masculinos estão em
extinção. Disso eu já sabia. E, antes que os vigilantes ideológicos saltem
feito salmões de suas redes sociais, corro a ressaltar: valores masculinos não
têm nada a ver com homofobia ou machismo. Um homem de verdade pode ser homossexual.
Um homem de verdade defende as mulheres quando outros, homens ou mulheres,
tentam diminuí-las.
Feita essa ressalva em homenagem
aos chatolas da nação, prossigo: os valores masculinos estão em extinção. Ser
homem, um dia, significou ser leal, inclusive aos seus inimigos. Significou
enfrentar as contingências da vida sem se lamuriar. Significou ter respeito
pela privacidade e pela liberdade dos outros, mesmo que você não fizesse o que
os outros faziam com a sua privacidade e a sua liberdade.
O homem resistia de espinha
ereta. O homem não era sórdido, traiçoeiro, fofoqueiro, manhoso. Ser homem era
adjetivo. “Seja homem!”, alguém dizia, e você sabia que tinha de se recompor,
você sabia que estava à beira do fiasco.
Isso começou quando esses caras
passaram a usar brinco. Sim, eu sei que lutadores de MMA usam brinco. Mas quem
diz que um sujeito, por ser mais forte do que os outros, é homem de verdade? O
Stephen Hawking não dá em ninguém, e lá está um homem de verdade.
Mas, como dizia, os caras passaram
a usar brinco. Lembro quando o Celso Roth mandou um jogador dele tirar o
brinco. Ninguém entendeu. Diziam que o comportamento do Roth era anacrônico,
ultrapassado. Nada disso. Celso Roth estava tentando fazer um time com homens
de verdade. Grande Celso Roth. Sabe das coisas.
Em 1977, o Grêmio montou um time
com homens de verdade. O símbolo desse time era o zagueiro Oberdan, que um dia
declarou:
– Quando esse time for campeão,
ninguém vai chorar.
Aquele time foi campeão. E
ninguém chorou.
Aquele time foi campeão contra
outro time de homens de verdade. O Inter dos anos 70 era feito por jogadores
que andavam com o queixo erguido. Não por acaso, o símbolo daquele Inter era
outro zagueiro: Dom Elias Figueroa.
Lembrar de Figueroa faz pensar
como o futebol se efeminou de lá para cá. Figueroa quebrava narizes de
centroavantes a cotoveladas, Tarciso e Palhinha que o digam. Era errado, todo
mundo achava errado, todo mundo continua achando errado e, não, florzinhas,
não: não é por isso que Figueroa era um homem de verdade. A violência não faz
de ninguém homem de verdade, ao contrário. No caso de Figueroa, o que ele fazia
era intimidar o adversário. Todo mundo sabia disso, inclusive o adversário. Ao
tentar a intimidação, Figueroa corria riscos, e os assumia.
Podia ser expulso, o que seria
ruim. Ou podia encontrar um adversário que não se intimidasse, o que seria
pior. Joãozinho, por exemplo, não se intimidava: enfiava a bola goela abaixo do
Figueroa de tanto driblá-lo e, assim, o Cruzeiro venceu a maioria dos inesquecíveis
duelos dos anos 70 contra o Inter.
Joãozinho era homem de verdade.
Os melhores atacantes sabiam ser homens de verdade: Romário nunca reclamou de
zagueiro; enfrentou-os. Pelé, se tentassem se meter com ele, teriam troco em
gols.
Hoje, mesmo os zagueiros são
manhosos. Felipão está tentando ensinar a seus zagueiros como se comportar
dentro da grande área: sem queixas, sem hesitações, sem tergiversar, sem
brincos na orelha. Como homens de verdade. Desses que não existem mais.
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