23 de setembro de 2014 | N° 17931
FABRÍCIO CARPINEJAR
Quanto mais conexões, melhor
Mais gente está andando de avião.
O pobre está andando de avião.
Nunca se andou tanto de avião.
São frases reais. Políticos e empresários se gabam de
converter o avião em um transporte acessível, barato, em comparação às décadas
de 80 e 90.
O que ninguém fala é que o avião virou um ônibus
pinga-pinga, para em tudo que é lugar até encher.
É um calvário, uma romaria, uma procissão, parece que a
aeronave receberá a autorização para decolar se estiver lotada.
Uma viagem que poderia ser de três horas acaba concluída em
seis horas.
Partir de Porto Alegre para Fortaleza, por exemplo, costuma
envolver três conexões. E com paradas de mais de uma hora.
O Brasil é imenso, mas as empresas aéreas conseguem a proeza
de aumentá-lo.
Está sendo criado um novo turismo. O turismo da escala.
Não se entra na cidade, mas aguardar no aeroporto é
suficiente para contar vantagem.
Se você vai a Belém, você visitou também São Paulo e
Brasília.
Não pôs o pé para fora do aeroporto de Guarulhos nem do
Juscelino Kubitschek, ninguém precisa descobrir, pode computar que esteve em
São Paulo e Brasília. Não é bem uma mentira. Sem nenhuma pergunta a mais, fica
sendo uma verdade. Ok, uma verdade magra, raquítica, porém ainda verdade.
Paga por um destino e já tem condições de alardear que
esteve em mais três de presente.
Olha que maravilha! É uma promoção. Toda viagem é uma turnê,
uma volta ao mundo pelas nossas culturas e folclores.
As conexões são uma bênção para o selfie. As escalas são uma
dádiva para marcações no Facebook e no Instagram.
Você viaja a Manaus e recebe de bandeja a chance de dizer
que pisou em São Paulo, Brasília, Belém e Rio Branco.
Você tem o desejo de conhecer Recife e goza do privilégio de
esperar no Rio de Janeiro, em Salvador, Teresina e Fortaleza. Esteve em cinco
Estados em um dia. É uma façanha para contar aos netos.
Não sobrará em nenhuma conversa que envolva tais capitais. Encha
a boca para comentar:
– Já estive em Salvador!
Ponto. É um mérito proporcionado pelas conexões sem fim da
malha aérea brasileira. Não acrescente nenhuma informação. Só você saberá que
não saiu do aeroporto Deputado Luís Eduardo Magalhães. Seus amigos se
encantarão com suas experiências, receberá um outro tratamento no seu bar
predileto, a cerveja chegará mais gelada em sua mesa.
Compre uma lembrança para comprovar sua passagem. Já levei
bonecos de Olinda em rápido trânsito de malas pelo terminal pernambucano.
Sempre tem uma lojinha com uma camiseta homenageando a cidade em que
desembarcou rapidamente.
As escalas são o melhor e mais barato pacote turístico.
Quando há a obrigação de viajar para o Acre e o atendente me
oferece apenas duas paradas, respondo que não. Acho um desaforo. Quero mais
conexões. Quero mais capitais para acrescentar ao meu currículo.
Quem faz viagem direta não tem nem entende esse luxo. Além
de pagar mais, perde a chance de aumentar seu histórico.
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