11
de setembro de 2014 | N° 17919
L.F.
VERISSIMO
As família
No
meu tempo... Pronto. Só com este começo espantei metade dos meus 17 leitores.
Lá vem ele com reminiscências enquanto Roma arde, devem ter pensado. Nostalgia
é fuga. Buuu. Mas como eu dizia quando me interrompi tão rudemente, no meu
tempo de torcedor de arquibancada o futebol já não era mais um esporte fino,
assistido por moças de chapéu.
O
futebol tinha se transformado em coisa para homem, literalmente. Era raro
ver-se mulher num estádio. Quem levava a namorada a um jogo (irmã, filha,
esposa ou mãe, nem pensar) tinha que estar preparado para ouvir de tudo, do
fiu-fiu protocolar a comentários lúbricos sobre a sua anatomia. E pronto para
brigar, no caso de mão extemporânea na bunda ou alhures.
Mas
no meu tempo sobravam alguns resquícios da época em que o futebol começou. Por
exemplo: palavrões gritados pela torcida já eram comuns, mas sempre que se
ouvia um palavrão ouvia-se outra voz alertando:
–
Olha as família...
Era
pouco provável que houvesse alguma família por perto, mas os guardiões da moral
nunca deixavam de se manifestar. Não se esperava que, em consideração às hipotéticas
famílias no estádio, as especulações sobre a filiação do juiz fossem
substituídas por algo como “tá cego, seu rameiradescendente?”, mas havia um
consenso de que certas palavras não podiam ser ouvidas pelas famílias, ou ao
menos pelas mulheres.
Hoje,
claro, as famílias vão juntas ao estádio e gritam, juntas, os palavrões. Não há
nenhum que elas não conheçam, e já devem ter inventado alguns. E fico pensando
naquela voz solitária dos meus dias de torcedor de arquibancada, alertando:
–
Olha as família...
Deviam
ser homens antigos, os guardiões. Homens fora do seu tempo. Ou talvez se vissem
como os últimos resistentes de um mundo em vias de extinção, moralistas já
obsoletos desafiando o ridículo de uma causa perdida, as família. Sei lá.
PAPO
VOVÔ
Eu e
a Lucinda, nossa neta de seis anos, estávamos comendo sorvetes. Me atrapalhei
um pouco com o meu e ela me mostrou a maneira correta de comer uma casquinha
sem pingar sorvete na roupa. Não sem antes me dizer: “Aprenda com uma
profissional...”
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