terça-feira, 2 de dezembro de 2008



HERÓIS ESQUECIDOS

Os professores da rede estadual do Rio Grande do Sul perderam mais uma batalha.

Ficaram sem receber pelos 16 dias de greve contra o projeto de lei do governo gaúcho com a finalidade de rejeitar o piso como vencimento inicial, a partir de 2010, fixado por legislação federal.

Foi o presente de Natal de Marisa Abreu e Yeda Crusius para o magistério. Presente grego, claro. Isso todo mundo já sabe. Os professores perderam um combate.

Ganharam outro. A urgência na votação do projeto governista foi retirada na Assembléia Legislativa. Pouco antes, os funcionários da Caixa Federal mantiveram uma greve de 24 dias. Não tiveram o ponto cortado e até agora nem horas extras fizeram para pagar o tempo não trabalhado.

Eu tenho toda a admiração do mundo por esses homens e mulheres que devem nos educar. Lembro-me dos meus professores em Palomas, dona Eulália, minha primeira paixão, ela com 19 anos, eu com 6, seu Modesto, dona Madalena, severa, rigorosa, durona, e seu Luis, que se chama Dartagnan, e me deu os primeiros livros a ler.

Ele caminhava cerca de 5 quilômetros, da atual BR 158 até a vila, para nos dar aula. Imagino a fortuna que ganhava. Esses heróis anônimos e esquecidos continuam maltratados.

Deles se espera o melhor. Que nos formem bem, com vocação missionária e conhecimentos seguros, para a profissão e a cidadania. Como eles são muitos, porém, a sociedade julga que não pode pagar-lhes bem.

Pede que se conformem. Quando reclamam, saturados de exploração, ainda ouvem de cínicos travestidos de pragmáticos que, se não estão contentes, mudem de atividade. A perversidade é gratuita.

Não pude dar respostas às centenas de e-mails que recebi nos últimos dias de professores contando as suas histórias de sacrifícios, baixos salários, altas cargas de trabalho, menosprezo das autoridades e paixão pelo ofício. As sociedades são como são e pouco podemos fazer contra os seus paradoxos.

Num mundo em que um técnico de futebol quase analfabeto pode ganhar R$ 500 mil por mês, sem qualquer compromisso com bons resultados, não há muito a esperar em educação.

Certamente não seria difícil mobilizar milhares ou milhões de pessoas para que fizessem doações destinadas a reter um craque no seu clube.

Mas seria impossível reunir contribuições para sustentar a greve dos professores até os governantes encontrarem soluções para o histórico problema dos baixos salários do magistério estadual.

A sociedade tem suas prioridades. Quer entretenimento e espetáculo. Aceita pagar mais por um gol, não por uma aula bem dada.

Sacrificados e desprezados, vítimas de todos os golpes possíveis, os professores ainda são acusados de vagabundagem e de ideologização. Esse ardiloso mecanismo de desqualificação se finge de não-ideológico.

Qualquer um sabe, no entanto, que isso é ideologia pura, reacionária, vil, selvagem e contraditória.

Bom mesmo é o Estado dar dinheiro para salvar bancos da falência. Na guerra dos clichês, sempre vence o lugar menos comum, aquele que encarna a posição dos donos do campinho. Enquanto isso, os professores, esquecidos do Estado, contam centavos.

juremir@correiodopovo.com.br

Nenhum comentário: