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terça-feira, 16 de dezembro de 2008
16 de dezembro de 2008
N° 15821 - PAULO SANT’ANA
A crise que não se vê
Dizem que o pior inimigo é aquele que não se consegue ver.
Esse pensamento deve ter sido esculpido para explicar a derrota dos EUA na guerra do Vietnã.
As tropas norte-americanas eram dizimadas diariamente por vietcongues invisíveis na selva.
É que, a vingar esse pensamento, a pior crise econômica que sofreremos em todos os tempos é esta que está por vir.
Dizem que seu epicentro será no primeiro trimestre de 2009, haverá choro e ranger de dentes.
Porque até agora nada sucedeu. Eu não enxergo a crise. Os shoppings estão lotados de gente e prevê-se até 20% de aumento nas vendas com relação ao ano passado.
Todos já receberam seu 13º salário, que este ano foi até pago em dia aos funcionários públicos estaduais, sem necessidade de empréstimo bancário ao governo.
E o maior de todos os milagres acabou acontecendo: começaram a pagar os precatórios estaduais, são limitados, são os de menor valor, mas disso ninguém mais tinha esperança.
Ainda não houve aumento nos preços dos remédios e o dólar já aumentou 50% depois da crise.
Ainda não houve aumento na energia elétrica e o dólar já subiu 50%.
Os agricultores reclamavam mais dos preços dos insumos agrícolas (fertilizantes, fungicidas, herbicidas) quando o dólar estava a R$ 1,50 do que agora, que está a quase R$ 2,50.
A energia elétrica, os medicamentos e os insumos agrícolas estão atados dramaticamente ao dólar.
Eu não vejo a crise. Ela é anunciada, teima no noticiário, mas parece que o Natal e o Ano-Novo vão transcorrer normalmente.
Em alguns segmentos industriais, anunciam-se demissões e férias coletivas, mas isso já acontecia em muitos períodos que antecederam essa apocalíptica crise anunciada.
O grosso das empresas não praticou nenhuma demissão.
Longe de mim acreditar que não haverá nenhuma crise.
O que eu quero dizer é que, se vier essa imensa crise, ela será a maior de todas e nos levará a um Armagedon.
Exatamente: acredito que será maior de todas as crises porque não a estou vendo. Não consigo apalpá-la, este é o pior inimigo: aquele que a gente não consegue ver.
Onde está a crise, se aumentou o PIB brasileiro? Que crise invisível é esta, que o governo federal brasileiro vai gastar mais de R$ 1 bilhão para realizar uma Olimpíada Militar? Olimpíada Militar? Deve ser treinamento de guerra.
Que crise é esta, se estão aprovando, Senado e Câmara, o aumento de 7,3 mil vereadores no Brasil. Ou seja, estão sendo criados 7,3 mil novos cargos de vereadores em todo o país. Evidentemente que, se houvesse crise, a isso não se arriscariam nossos dignos representantes.
Que crise é esta, que só na semana passada o governo Lula criou cerca de 900 funções gratificadas para administrar os museus brasileiros?
Não existe crise. O que há é a bonança. E o desenvolvimento.
Foi feita uma pesquisa ainda agora que indicou que 79% dos brasileiros entrevistados querem a realização da Copa do Mundo no Brasil em 2014. Se existisse crise, não seriam a favor, o governo gastará uma fortuna colossal para realizar a Copa do Mundo de 2014.
Copa do Mundo absolutamente desnecessária, que só pode ser realizada em país rico.
Não há crise, o Brasil está rico. Se não estivesse, não pensaria no luxo de gastar dezenas de bilhões de reais numa Copa do Mundo.
Desnecessários e supérfluos bilhões.
Não há crise. Se a gente não enxerga, é porque não há. E se houver, está mal localizada quando se prevê que seu epicentro será no primeiro trimestre de 2009. Não pode ser, esta previsão está errada: no primeiro trimestre, haverá Carnaval. E toda crise sempre veio depois do Carnaval.
Não vai ser este ano que se desmentirá isso.
Mas eu, idiotamente, só acredito na crise porque não consigo enxergá-la.
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