sábado, 20 de dezembro de 2008



20 de dezembro de 2008
N° 15825 - CLÁUDIA LAITANO


O bom patrão

Dunder Mifflin é uma empresa de distribuição de papel com filial na pequena cidade de Scranton, Pennsylvania. O escritório de Scranton tem menos de 20 funcionários, entre eles os encarregados de vendas, os contadores, a recepcionista, o gerente de recursos humanos e, chefiando todos eles, um ex-vendedor promovido ao posto de comando porque sabia vender papel melhor do que os outros.

Esse ambiente de trabalho convencional e monótono, igual a tantos outros espalhados pela fatia capitalista do planeta, foi responsável por boa parte das minhas gargalhadas em 2008. E como o fim de ano exige balanços e homenagens, aqui vai meu reconhecimento ao seriado The Office, adaptação de uma série britânica que estreou em 2005 e atualmente está em sua quinta temporada – quatro delas já disponíveis em DVD em uma boa locadora perto da sua casa.

O engraçado em The Office é que qualquer pessoa que fez, ou faz, parte de um ambiente corporativo é capaz de reconhecer grande parte dos tipos (o puxa-saco, o mala, o fora da casinha...) e das situações (as reuniões, as intrigas, as disputas, os flertes...) retratados na série. Pessoas obrigadas a conviver durante várias horas por dia para garantir seu sustento costumam, aparentemente, comportar-se de forma muito parecida em qualquer parte do mundo.

Além disso, teorias de administração de empresas, assim como os vinhos e os hambúrgueres, tendem inexoravelmente à globalização: uma estratégia para economizar clipes inventada em Osaka chega à filial de Teresina na velocidade de um fax nos dias de hoje.

O resultado é que os escritórios acabam ficando todos muito parecidos – não importando se o negócio é distribuir papel, fabricar bombas ou produzir anúncios supercriativos para a televisão. Acrescente-se a isso o lado cômico da rede de micropoderes que se forma em qualquer ambiente de trabalho e está pronta a receita de sucesso desse retrato divertido e cruel do cotidiano corporativo.

The Office guarda ainda o mérito de flagrar o surgimento de um novo tipo de chefe, produto de uma época que consagrou a desconfiança e o desconforto com relação a qualquer tipo de autoridade – em casa, na sala de aula e obviamente também no ambiente de trabalho. O atrapalhado Michael (vivido pelo divertidíssimo Steve Carell) não se contenta em exercer seu poder baseado na hierarquia – ele quer ser “amigão” dos empregados.

Confunde bajulação com amizade e na hora em que deve orientar, distribuir tarefas e mesmo demitir fica apavorado, se omite ou mete o pé pelas mãos. Não quer ser como os chefes de antigamente, mas também não sabe como ser diferente – comandar uma equipe exige uma combinação de inteligência, observação e talento para administrar complexas relações humanas que obviamente está muito além da sua capacidade.

Chefes como Michael, inseguros quanto às formas de exercer a autoridade com serenidade e bom senso, podem ser uma tendência silenciosa espalhando-se pelo universo das baias e cadeiras reclináveis – a terceira ponta de um triângulo formado por pais que não conseguem dar limites e professores que têm medo de exigir demais dos alunos.

Mas até para que surjam os “Michaels” é necessário algum estágio de avanço nas relações humanas e de trabalho. Onde isso não existe, ainda vigora o velho método do desrespeito e do grita-mais-quem-pode-mais – tão eficiente, a longo prazo, para a produtividade de uma empresa quanto ajoelhar no milho para aprender.

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