quinta-feira, 25 de dezembro de 2008


CARLOS HEITOR CONY

Lições do Natal

RIO DE JANEIRO - A iconografia cristã tem dois momentos fundamentais: a criança recém-nascida na estalagem de Belém, tendo a aquecê-la o hálito de um burro e de uma vaca; e o corpo nu e maltratado de um homem coberto de chagas e opróbrio.

Entre as duas imagens, a história que mudaria a história para a grande parcela da humanidade concentrada no Ocidente.

Giovanni Papini inicia famoso livro sobre a vida de Cristo narrando o seu nascimento: "O presépio não é o pórtico airoso com que os pintores da Renascença, envergonhados com a pobreza de seu Deus, criaram para o consumo dos crentes".

Bem verdade que, antes mesmo da Renascença, a tradição apoiada nos evangelhos coloca fatos maravilhosos em torno da gruta de Belém: os pastores avisados pela milícia celeste, cantando a glória de Deus nas alturas e a paz aos homens de boa vontade.

Houve também a estrela que guiaria os Reis Magos para a oferta do ouro, do incenso e da mirra: "Vimos sua estrela no Oriente e viemos com presentes adorá-lo". Os exegetas deste versículo bíblico tiram duas lições desta simples frase: a ida e os presentes. Não adianta ver um sinal, é preciso ir em busca dele, tentar conhecê-lo e interpretá-lo.

Tampouco esta ida, este movimento de um ponto a outro não deve ser feita de mãos vazias, apenas para receber sem nada dar em troca. Os Magos foram "cum muneribus", com presentes, na velha tradição oriental.

Esquecendo o episódio cristão em si, tudo na humanidade implica uma viagem em busca de um sinal, não exatamente a viagem da alucinação química (drogas) ou da religiosa (preces), mas na capacidade de caminhar na direção da esperança.

Ainda que não se encontre a salvação, o simples fato de "ir" justifica grande parte da miséria humana.

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