Aqui voces encontrarão muitas figuras construídas em Fireworks, Flash MX, Swift 3D e outros aplicativos. Encontrarão, também, muitas crônicas de jornais diários, como as do Veríssimo, Martha Medeiros, Paulo Coelho, e de revistas semanais, como as da Veja, Isto É e Época. Espero que ele seja útil a você de alguma maneira, pois esta é uma das razões fundamentais dele existir.
quinta-feira, 18 de dezembro de 2008
18 de dezembro de 2008
N° 15823 - L.F. VERISSIMO“Zeitgeist”
“Prezado M:
Entendo seu entusiasmo com o verso que acaba de me mandar. Realmente, é um raro exemplo de exteriorização poética, a começar pela reiteração inicial:
‘Eu mato, eu mato...’
A brutal assertiva evoca à perfeição a têmpera destes dias, o nosso ‘zeitgeist’. Perderam-se as ilusões com a justiça e as esperanças de regeneração, e com todas as instâncias jurídicas. Vivemos num deserto de valores morais. O poeta não diz ‘eu reprimendo’, ‘eu castigo’, ‘eu mando prender’. Diz e repete ‘eu mato’.
Que retribuição se pode esperar onde a justiça não faz justiça e a cadeia não segura o ladrão? O poeta ameaça fazer sua própria justiça porque não tem outra. Revertemos ao animal primevo com as presas à mostra, num ricto de vingança selvagem. Uma hiena ganindo entre as ruínas de uma civilização falida.
Segue o poema:
‘...quem roubou minha cueca...’
Há aqui algo que evoca Eliot, com seu constante recurso ao aparentemente banal – no caso, a cueca – em contraponto às alusões clássicas e míticas, e que acabou sendo um viés da poesia moderna (Auden, Drummond). Não seria, talvez, demais ler a cueca como metáfora. A cueca representa o que temos de mais íntimo, recôndito, profundo. O que temos de mais nosso. O que o ‘zeitgeist’ nos roubou. Ou seja: a nossa alma. Onde está ‘cueca’ leia-se ‘alma’. Sem a cueca, ficamos nus. Sem a alma, também estamos reduzidos a apenas o nosso corpo.
Mas quem roubou a nossa cueca/alma? Quem nos trouxe, desprotegidos, para este deserto?
Quem merece a raiva do poeta? Que a raiva é merecida fica evidente na última linha do verso:
‘... pra fazer pano de prato!’
A suprema degradação. Nossa alma secando pratos. O fim de uma geração que conseguiu chegar à Lua mas se perdeu no caminho da privada. Quem é o culpado? Também queremos ganir de indignação como o poeta, mas não sabemos em que direção. Para o alto? Para o lado? Para que lado? Quem, afinal, roubou nossa cueca pra fazer pano de prato?
Mas, enfim, poesia é isso mesmo, não é não? Perguntas sem respostas. Se houvesse resposta não seria poesia. Um grande abraço do L.”
“Prezado L:
Gostei muito do que você escreveu sobre o verso que mandei, mas preciso fazer uma confissão: mandei o verso errado. Queria que você comentasse um poema do Baudelaire mas me atrapalhei (sou um pré-eletrônico, você sabe) e acabei mandando a letra de uma marchinha de Carnaval que, sei lá por que, estava armazenada no meu laptop. Mas obrigado assim mesmo. Grande abraço, M.”
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