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domingo, 21 de dezembro de 2008
diego Mainardi
Capitu traiu
"Até você, cara - o enigma de Capitu? Essa, não: Capitu inocente? Começa que enigma não há: o livro, de 1900, foi publicado em vida do autor - e até sua morte, oito anos depois, um único leitor ou crítico negou o adultério?"
Acabo de citar Dalton Trevisan. "Dom Casmurro" é um tema recorrente em seus livros. Em particular, a obtusidade de quem enxerga um enigma onde "enigma não há". Dalton Trevisan achincalha a professorazinha que emporcalha a obra de Machado de Assis, espalhando por aí que a grandeza de "Dom Casmurro" está justamente na incerteza sobre o adultério cometido por Capitu. Incerteza?
Que incerteza? O romance só faz sentido com o adultério. Sem ele, é um mau romance. Ou, citando mais uma vez Dalton Trevisan: "Se a filha do Pádua não traiu, Machadinho se chamou José de Alencar."
Desde 1960, quando a brasilianista Helen Caldwell publicou um estudo sobre "Dom Casmurro", difundiu-se estupidamente a idéia de que Bentinho é um narrador suspeito. Nesse caso, o adultério de Capitu com Escobar teria sido apenas uma fantasia, fruto de sua mente enlouquecida pelo ciúme.
O problema dessa idéia é o seguinte: desconfiar de Bentinho significa desconfiar de Machado de Assis. Bentinho - o Bentinho de Machado de Assis - é um narrador perfeitamente ponderado. Os fatos relatados por ele pertencem a um passado remoto.
Ele descreve os eventos de sua vida com um distanciamento absoluto. Quando conta sua história, os protagonistas da trama, Capitu, Escobar e Ezequiel, o filho bastardo, já morreram. Seu cíume desapareceu completamente. É só uma lembrança longínqua.
O Bentinho do tempo presente, que narra em primeira pessoa, sabe dizer o que é realidade e o que é fantasia. Mais do que isso: ele é capaz de analisar todo aquele seu processo de enlouquecimento provocado pelo adultério. Com o passar dos anos, sua mágoa e seu desespero se transformaram num estranhamento irônico.
Bentinho resolve escrever suas memórias por tédio, para tentar ocupar o tempo. Em nenhum momento ele parece querer acertar as contas com Capitu. Depois de terminar "Dom Casmurro", ele se prepara para escrever outro livro: uma história dos subúrbios. Essa é a chave para compreender o romance. Olhando para trás, Bentinho se dá conta da mesquinharia de sua vida, de sua sociedade, de seu tempo.
O que, no passado, tinha um aspecto mítico, como o adultério de Capitu, revela agora toda a sua miudeza. No auge de sua loucura, Bentinho se compara a Otelo.
Mas o paralelo com o herói shakespeareano é usado por Machado de Assis apenas como contraponto para ridicularizar seu protagonista. Otelo está para Bentinho assim como os heróis dos romances de cavalaria estão para Dom Quixote.
Vinte anos depois de "Dom Casmurro", James Joyce usou o mesmo recurso em "Ulisses". Se a Penélope de Homero é um paradigma de fidelidade, a Penélope de Joyce é a irlandesa adúltera, promíscua.
Capitu traiu Bentinho. E ela traiu porque Machado de Assis, em "Dom Casmurro", tinha um propósito: transmitir o legado de nossa miséria.
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