sábado, 20 de dezembro de 2008



20 de dezembro de 2008
N° 15825 - A CENA MÉDICA | MOACYR SCLIAR


Desemprego e doença

Um quarto dos brasileiros afirma que saúde é o principal problema nacional, revela recente pesquisa Datafolha. Em segundo lugar está o desemprego, citado por 18% dos entrevistados, mas chegando a 23% entre os que têm entre 16 e 24 anos.

O pior é que os dois problemas podem se combinar. É impressionante a massa de dados mostrando, de maneira inequívoca, que a perda do trabalho regular faz mal, muito mal, à saúde.

Desemprego adoece. Na Inglaterra verificou-se que desempregados têm 80% mais chances de apresentar problemas de saúde do que os empregados. Têm mais hipertensão arterial, níveis de colesterol mais altos; bebem mais, fumam mais, tendem à obesidade (nem sempre desemprego é passar fome) e ao sedentarismo.

Em termos de saúde mental a situação é igualmente sombria. O emprego é um fator de equilíbrio emocional, e não só por causa do salário, do seguro-saúde e de outros benefícios. Emprego é uma oportunidade para a pessoa mostrar seu conhecimento, suas habilidades; para conviver com outras pessoas; para valorizar-se socialmente.

Estudos realizados nos Estados Unidos, na Alemanha, na Austrália mostraram que desempregados desenvolvem ansiedade e depressão.

E isto tem repercussões, aumentando a chance de divórcio, de violência doméstica e até de gravidez não desejada. Conseqüência: como mostrou um pesquisa do governo australiano, desempregados recorrem mais a serviços médicos, ocupam mais leitos hospitalares, consomem mais medicamentos.

Os problemas do desemprego repercutem na saúde da família. Os filhos pequenos de desempregados têm 26% mais chances de adoecer; a mortalidade infantil nestas famílias é maior, e, segundo um estudo britânico, a mortalidade entre mulheres de desempregados é 20% mais alta.

Como é maior a mortalidade entre os próprios desempregados: 37% mais elevada, segundo uma pesquisa realizada na Inglaterra e em Gales. Se o desempregado tinha alguma doença, a chance de óbito é três vezes maior quando comparada à de outras pessoas com a mesma doença, mas empregadas. É maior, entre os desempregados, o número de óbitos por doença cardiovascular, acidentes, suicídios.

Claro, às vezes o desemprego é uma chance que o destino nos dá. A pessoa tem um trabalho, não está feliz, é despedida e de repente encontra o emprego de seus sonhos. Mas isto, convenhamos, é exceção, é coisa de Hollywood. De maneira geral, perder o lugar de trabalho é uma tragédia. Que, diferente das catástrofes naturais, não gera cenas impressionantes na televisão, não tem a capacidade de galvanizar a sociedade.

O problema contudo existe, é sério, e tende a se agravar: desemprego prejudica a saúde, e, com saúde precária, a pessoa tem menos chance de encontrar trabalho. Um círculo vicioso que precisa ser rompido, inclusive porque ao custo social do desemprego acrescenta-se o custo da assistência médica, sem falar, claro, na tragédia humana e no aumento da violência e do crime.

O país não pode assistir com resignação à extinção das vagas de trabalho. O governo desempenha aí um papel importante. Talvez não se possa mais criar as frentes de trabalho (estradas, por exemplo) que, nos Estados Unidos de Roosevelt, eram uma das bases do New Deal e ajudaram a terminar com a crise de 1929.

Mas o poder público tem muito a fazer. Quanto às empresas, este é o momento de mostrarem a sua responsabilidade social. Que, neste momento, pode salvar vidas.

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