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terça-feira, 1 de março de 2011
01 de março de 2011 | N° 16626
PAULO SANT’ANA
A noiva temida
As vezes somos obrigados a falar da morte, afinal ela faz parte da vida.
No dizer do meu poeta Augusto dos Anjos, “a morte, esta carnívora assanhada/ serpente má de língua envenenada/ que tudo que acha pelo caminho come/ sinistra e atra mulher que a 1 de janeiro/ saiu para matar o mundo inteiro/ e o mundo inteiro não lhe mata a fome”.
É que eu estava pensando se os mortos sabem ou não do que pensamos ou dizemos deles. Será que nos ouvem, será que nos veem?
Será que nos ouvem a falar bem deles? Ou a falar mal deles?
Uma outra coisa que sempre me assaltou o espírito é se o espírito (ou a alma) dos mortos assiste ao seu próprio sepultamento.
Porque vejo outras pessoas (e até mesmo eu) desejar o seu próprio enterro da seguinte forma, como se vão estar presentes ao seu próprio enterro.
Será que os mortos estão nos vendo chegar próximos ao seu caixão e reverenciarmos a sua memória?
Será que os mortos enxergam as flores que nós lhes levamos em seus enterros ou essas flores servem somente para se tornar belas para as outras pessoas que comparecem aos enterros?
Bobagem minha escrever sobre isso, afinal o grande mistério da vida é justamente a morte. Há vida depois dela? Tudo termina com a morte ou foi apenas uma passagem do morto pela vida, ressuscitando depois sua alma e tendo de comparecer a julgamento final de seus atos?
Tudo é interrogação, embora o espiritismo afirme que há vida evolucionista depois da morte.
Mas é interessante, só se morre uma vez. Assim como só se nasce uma vez. Nascimento e morte são as datas mais importantes da vida de uma pessoa, tanto que as datas mais comemoradas da vida de Cristo são o Natal e a Sexta-Feira Santa.
Eu tenho com a morte uma relação estranha. Quando eu era criança, como todas as crianças, nem pensava em morte.
Depois fiquei adulto e comecei a desconfiar remotamente que a morte existia.
E agora que estou velho ando namorando a morte, somos vistos seguidamente de mãos dadas no Parque Farroupilha: ela cheia de atenções comigo, como se fôssemos noivos e estivéssemos prestes a casar.
Isto mesmo, eu e a morte somos dois nubentes, todos esperam nossas bodas: quando passeamos juntos pela Redenção, as pessoas atiram grãos de arroz sobre os nossos corpos.
E num passeio destes, um dia, vinha um monte de gente atrás de nós, quando a morte, com seu negro vestido de noiva, atirou para trás o ramalhete de flores que tinha nas mãos e foi gente correndo apavorada por todos os lados.
Não sei que medo estranho é este que as pessoas têm desta noiva!
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