sábado, 24 de abril de 2021



24 DE ABRIL DE 2021
CRISTINA BONORINO

PEDE PARA SAIR

Para os que reclamavam da evasão de cérebros do país, porque não há emprego nem políticas de financiamento à pesquisa, o governo resolveu acabar de vez com o problema: vamos parar de formar cientistas. Essa foi a resposta clara do resultado do edital de bolsas de doutorado e pós-doutorado do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) divulgado na semana que passou.

A bolsa é o salário dos jovens pesquisadores, que são a principal força de geração de conhecimento e inovação no Brasil - e no mundo. Há mais de 10 anos os valores não são reajustados. Foram solicitadas 3.080 bolsas e apenas 396 (13%) foram aprovadas para implementação. Esse edital previa R$ 35 milhões em recursos a serem usados em quatro anos. O CNPq reduziu para R$ 23 milhões, sem aviso, alegando que o restante será "reservado" para outra oportunidade.

Isso vem desde 2019 - mais de 80% do orçamento de todos os níveis do CNPq foram cortados. O CNPq é um órgão do Ministério da Ciência e Tecnologia, e a principal fonte de financiamento de pesquisa dessa pasta. Neste momento, o mundo inteiro sabe que depende de ciência e tecnologia para enfrentar esta que ficará para a história como uma das maiores crises mundiais de saúde pública. O mundo está sendo liderado por países que realizaram investimento constante e robusto em ciência e tecnologia. E a escolha do Brasil é agir exatamente na contramão disso. As políticas tecnológicas do governo brasileiro não são fruto de ignorância nem tampouco simbólicas; são ações pensadas, que resultarão no extermínio da ciência nacional.

A política de ciência e tecnologia de um governo deve servir - como servidor público que o governo deve ser - aos interesses da população e das gerações futuras. Deve garantir soberania nacional e independência tecnológica e oportunizar o máximo aproveitamento do capital humano. O treinamento científico forma pessoas com pensamento crítico, capacidade de resolver problemas e propor soluções inovadoras. A quem interessa eliminar esse tipo de formação?

A divulgação dos resultados do edital gerou um movimento forte entre os cientistas membros dos comitês de análise e seleção de projetos e bolsas submetidos ao CNPq para que renunciem coletivamente. Há dois anos trabalham voluntariamente, um trabalho altamente especializado que requer analisar problemas complexos e prever resultados, para que suas recomendações sejam desconsideradas pela diretoria do CNPq. Eu sinceramente discordo. Quem efetivamente não está fazendo o seu trabalho é que deveria pedir para sair.

CRISTINA BONORINO

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