10 DE ABRIL DE 2021
CLAUDIA TAJES
O causo da fechadura
Ele olhou bem na minha cara e disse:
- 260. Eu olhei bem na cara dele e falei: - O quê?
E em seguida:
- What? - Qué? - Quelle? - Quid?
A fechadura da porta estragou, e fiquei na rua às 18h, depois de uma ida relâmpago ao supermercado para pegar o maior número de coisas faltantes no menor número de minutos possível. Resultado dessa conta: um monte de sacolinhas para além da ecobag que sempre levo. Nem vamos entrar no mérito de que, a cada ida ao súper, é preciso mais dinheiro para comprar os mesmos produtos. Se há quem saiba transformar a crise em oportunidade, são os supermercados.
Voltando à fechadura. Todo mundo já passou por esse momento de pânico, a chave que não se mexe para lado algum. Bem verdade que ela andava meio estranha, trancando levemente antes de girar. Nada que aquele pó de grafite que mamãe ensinou a introduzir nas entranhas do aço não resolvesse.
A essa altura, as sacolinhas de supermercado estavam espalhadas pelo chão do corredor, e a velha máxima do "não forçar para não estragar" tinha ido para o inferno. Deixei minhas abobrinhas e leites e cenouras e águas e sabonetes na frente na porta e liguei para o chaveiro.
Nas vezes em que ficamos na rua, e não foram poucas, sempre chamei o mesmo chaveiro, perto da casa do meu filho. Liguei, e o rapaz disse que chegava em minutos. Com um pingo de bateria, como só acontece nesses momentos, sentei para esperar.
E nada. E nada. E nada.
Meia hora depois, mas que pareceram cinco, liguei para perguntar onde ele andava. E o rapaz: "Quase aí".
Ainda demorou até surgir um sujeito que poderia se chamar Montanha ou Armário de Doze Portas com Maleiro. Ele enfiou um palitinho de metal na fechadura e movimentou por um segundo. A porta abriu e ele guardou o palitinho no bolso.
- Mas o senhor não vai consertar? A lingueta (NR: que palavra horrível) está trancando.
- Qué isso, ela é perfeita, como nova.
Foi tudo tão simples que, na onda da facilidade, pedi para ele abrir também a caixa de correspondência, emperrada há anos. Agora que as contas todas chegam por e-mail, abrir a caixa de correspondência para quê?
Dois segundos depois, perguntei quanto devia. Ele olhou bem na minha cara e disse:
- 260. Eu olhei bem na cara dele e falei:
- O quê? E em seguida: - What? - Qué? - Quelle? - Quid?
Para encurtar o caso, que nós temos prazo. Por alguma dessas tretas do Google, achei que ligava para um chaveiro de confiança, mas a ligação foi parar no tal do Montanha. Que, pelo tempo que levou, atravessou a cidade. E ainda alegou que estava cobrando barato. Pelo sindicato, o preço deveria ser o dobro, ele disse, olhando nos meus olhos.
Um dia depois, quando a fechadura estragou novamente, liguei para o chaveiro certo. É o Marcelo da Avenida Nilópolis, que atende com o Guilherme, que veio em 10 minutos, levou a fechadura para consertar, voltou, colocou no lugar e cobrou pouco mais de um quarto do preço do Montanha. Moral da história: essa história não tem moral. É só mais um causo de consumidor trouxa.
E assim segue a vida nesses tempos de pandemia.
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