PASQUALE CIPRO
NETO
"Optical Parking
System"
O problema é outro. Mais
precisamente, é a bizarrice de certos usos de estrangeirismos
Está nas páginas das revistas
especializadas em automóveis uma peça publicitária de um veículo produzido por
uma das multinacionais que têm fábrica no Brasil: "Optical Parking
System". A maravilhosa engenhoca é um dos equipamentos do veículo.
O caro leitor sabe o que vem a
ser o bendito "Optical Parking System"? Bem, para ser justo, convém
dizer que o próprio anúncio explica, imediatamente depois da construção em
inglês. A "tradução" (quase em português) vem entre travessões:
"Display do sensor de estacionamento".
Já sabe por que escrevi
"quase em português", não? Para quem não entendeu, explico: na
tradução, foi empregada a palavra "display", que talvez pudesse ser
substituída por "mostrador", "painel" ou sabe Deus o quê.
Antes que alguém se empolgue e
comece a pensar que este texto é um manifesto contra todo e qualquer
estrangeirismo ou a favor de purismos linguísticos etc., vou logo dizendo o que
os leitores habituais deste espaço já estão cansados de saber: devagar com o
andor, por favor.
Nada de pensar que temos de
trocar "futebol" por "ludopédio", "bola-pé" etc.
ou que temos de banir termos mais do que consagrados como "show",
"gol" ou "know-how".
O problema é outro. Mais
precisamente, é a bizarrice de certos usos de estrangeirismos. Se um
publicitário usa "target" no seu meio profissional, vá la. Qualquer
publicitário sabe o que é isso, mas quem não é do ramo não sabe (e não tem
nenhuma obrigação de saber) o que é essa bobagem, sobretudo porque há na língua
materna um termo absolutamente equivalente e infinitamente mais conhecido
("alvo").
Outra bobagem que o pessoal da
publicidade gosta de empregar em público é "share" (ou "market
share"). Lembra-se da antológica "Imagine", do imortal John
Lennon? Diz a letra do querido beatle: "Imagine all the people sharing all
the world" ("Imagine todas as pessoas dividindo, compartilhando o
mundo todo"). Pois o tal de "market share" nada mais é do que a
fatia ou quota de participação num determinado mercado ("A empresa tem X%
de share" significa "que X% do mercado é dela").
Voltemos ao "Optical Parking
System". Não lhe parece bizarro, caro leitor, que a peça publicitária se
valha de uma expressão alienígena, pouco compreensível para muita gente, e
(bizarrice das bizarrices) imediatamente a apresente mais ou menos traduzida?
Sob o ponto de vista da comunicação, não seria mais eficiente e racional
apresentar a informação (só) em português mesmo?
Aliás, por que será que as fábricas
de automóveis instaladas no Brasil insistem em montar em seus produtos painéis
cujas informações (e respectivas abreviações) aparecem em inglês? O marcador de
combustível, por exemplo, indica "E" (de "empty" =
"vazio") e "F" (de "full" = "cheio"); o
da temperatura do motor indica "H" (de "hot" =
"quente") e "C" (de "cold" = "frio").
Sim, já sei, muitos desses carros são exportados, então... Então coisa nenhuma.
Sabemos todos que as unidades exportadas são muuuuuuuito diferentes das que
ficam por aqui, por isso (creio) não deve ser muito difícil diferenciá-las em
mais um item. Ou nossa produção (em larguíssima escala -somos ora o quarto, ora
o quinto mercado do mundo) não justifica o custo de um painel tupiniquim?
Que fique claro: isto nem de
longe é um manifesto purista, xenófobo ou algo do gênero. O problema é outro; é
o uso gratuito do estrangeirismo, o que quase sempre se dá por esnobismo ou
tolice mesmo. O caro leitor conhece algo mais tolo do que os anúncios do
mercado imobiliário? Alguém é capaz de traduzir 20% daquela bobajada posta como
"qualidades" do imóvel? Xô, complexo de vira-lata! É isso.
inculta@uol.com.br
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