03
de dezembro de 2012 | N° 17272
DAVID
COIMBRA
O futebol faltou à
despedida
O
último capítulo da história do Olímpico foi épico, como deveria ser. Mas foi
sem heróis, como deveria ter. Houve quase de tudo no 0 a 0 do Gre-Nal de
encerramento do Campeonato Brasileiro: expulsões, brigas, cotovelaço, dedo na
cara, choro, emoção, vibração e erro do juiz. Só não houve gol. E talvez também
tenha faltado um pouquinho de futebol. O problema é que os dois times entraram
em campo para não perder, cada qual com três volantes na frente da sua própria
área e um único atacante na frente da área inimiga. Resultado: um jogo tenso, mas
pastoso, com muita bravura e nenhuma ousadia.
O
jogo jogado ficou por conta de quem, muito apropriadamente, levava o número 10
às costas. Zé Roberto e D’Alessandro foram os melhores em campo pela razão
óbvia de que são os que mais sabem jogar. Dominavam a bola na intermediária,
giravam, encontravam um colega bem colocado e distribuíam o jogo com
competência. Foi assim o tempo todo. O primeiro lance de alguma agudeza na
partida foi de Zé Roberto pela direita, aos 14 minutos.
Ele
entrou na área e deu um passe na diagonal. A bola cruzou a pequena área e Elano
ficou a palmo e meio de alcançá-la. Três minutos depois, a primeira confusão:
Moledo e Léo Gago trocaram empurrões na linha lateral. Aos 23, foi a fez de
Moledo e André Lima tocarem as testas e se encararem como se fossem lutadores
de MMA. Em seguida, D’Alessandro e Luxemburgo discutiram às margens da área
técnica.
O
nervosismo se derramava pelas arquibancadas e contagiava os jogadores. Aos 30,
Werley saiu de campo lesionado. Saimon entrou em seu lugar para, mais tarde, se
tornar um protagonista da partida. Aos 37, Anderson Pico enfiou a bola entre as
pernas de Ratinho, irrompeu área adentro e cruzou à meia altura para André
Lima, mas Moledo conseguiu tirar para escanteio. Aos 40, o Inter construiu seu
único lance de perigo no clássico: Fred cruzou da esquerda e Leandro Damião
cabeceou para baixo. A bola passou a meio metro da trave.
Quando
os dois times se retiraram para o vestiário, a impressão que se tinha no
Olímpico era de que eles fechariam, naquele momento, um acordo para que o
placar ficasse no 0 a 0. Dois minutos depois de voltarem a campo, o Grêmio não
assinaria mais esse pacto. Porque, então, Saimon deu um lançamento de Roberto
Rivellino, uma bola que viajou 60 metros e caiu no pé de Elano, na frente da
área do Inter. Muriel saiu desesperado do gol, Elano tentou encobri-lo, Muriel
saltou e deu um tapa na bola. Como estava fora da área, o árbitro Héber Roberto
Lopes apitou falta e o expulsou.
Antes
que a falta fosse cobrada, Fred chutou a bola para longe, Guiñazu empurrou
Elano, Elano caiu e Anderson Pico correu para defendê-lo. Luxemburgo,
percebendo que seu jogador seria expulso, entrou em campo, puxou-o para fora da
confusão e lhe passou uma descompostura com o dedo em riste. Anderson Pico se
retirou, cabisbaixo. Serenados os ânimos, o árbitro expulsou Luxemburgo. O
técnico do Grêmio saiu esbravejando contra o que classificou como injustiça –
afinal, ele havia invadido o campo para acalmar seu jogador. Renan entrou em
lugar de Ratinho.
Mal
a partida recomeçou, Damião deu um cotovelaço em Saimon e foi expulso. O
Grêmio, agora, tinha dois jogadores a mais. O Inter se postou todo na frente da
sua área, disposto a resistir.
O
Grêmio começou a pressionar e a criar chances de gol: uma aos 22, com Leandro
chutando fraco; outra aos 26, num cruzamento de Souza, que Ygor tirou; depois
aos 27, com Leo Gago batendo por cima do travessão; aos 29, num cruzamento de
Leandro, que André Lima aparou da marca do pênalti e chutou alto; aos 30, numa
bicicleta de Zé Roberto que Renan defendeu; aos 31, em outro chute de Zé
Roberto, este rasteiro, que Renan espalmou para escanteio; aos 32, num
cruzamento de Pará da direita, quando André Lima se antecipou aos zagueiros e
colocou por cima do gol. Na arquibancada, a TV flagrou uma torcedora levando as
mãos ao rosto, sacudindo a cabeça e balbuciando, atrás dos óculos escuros:
–
Ai, André Lima!
Era
um jogo de um time só. O Grêmio precisava da vitória para chegar ao segundo
lugar no campeonato e se classificar para a fase de grupos da Libertadores, já
que o Atlético-MG estava vencendo o Cruzeiro. O Inter estava acantonado na sua
área, atento, vigilante, querendo que tudo acabasse de uma vez. Aos 45, a bola
saiu pela lateral e o técnico colorado, Osmar Loss, a chutou para longe. Saimon
foi cobrá-lo, Loss o segurou pela garganta, Saimon reagiu e foi expulso.
Mais
confusão. Um rojão explodiu ao lado do preparador físico do Inter, Flávio
Soares, que se jogou ao chão. O árbitro havia dado cinco minutos de acréscimos.
Em tese, seria esse o tempo que restava de jogo. Mas, quando a partida foi
retomada, Héber Roberto Lopes a encerrou. Os jogadores do Grêmio o cercaram,
cobrando o tempo de prorrogação. Mas não adiantava mais. Ele não voltou atrás.
Não
chegou a ser ruim para ninguém; afinal, não houve perdedores. Mas também não
foi bom para ninguém, porque não houve vencedores. Os colorados ensaiaram uma
pequena comemoração: o goleiro Renan repetiu a dança do goleiro Kidiaba,
relembrando, curiosamente, a malfadada partida em que o Inter foi batido pelo
Mazembe em 2010.
E o
outro goleiro, Marcelo Grohe, saiu de campo arrostando que “eles” (os
colorados) “não sentiram o gostinho” de dizer que venceram o Grêmio na última
partida do Olímpico. Não era muito, mas era o que eles tinham.
Sobrou,
na despedida da velha casa do Grêmio, a festa do torcedor. E a sua comoção.
Quando todos os jogadores já haviam descido aos vestiários, milhares de
gremistas continuavam nas arquibancadas, aos prantos, fitando a grama do
Olímpico, tristemente certos de que ali a bola nunca mais vai rolar.
Nenhum comentário:
Postar um comentário