sexta-feira, 29 de outubro de 2010



29 de outubro de 2010 | N° 16503
PAULO SANT’ANA


Nada mais de cartas

A minha coluna de ontem, como era de se esperar, obteve resposta do presidente da Empresa Pública de Transporte e Circulação (EPTC), Vanderlei Cappellari, que defendeu seus azuizinhos e cantou um hino de exaltação a todos os valores que podem levar à diminuição das mortes no trânsito.

Eu decidi e vou ver se cumpro não mais publicar carta de ninguém na minha coluna: foi tanto o protesto de acionistas da RBS, de dirigentes da empresa e de leitores contra as cartas de respostas que eu publicava, que cedi, daqui por diante não tem mais carta na minha coluna.

É que as pessoas pagam caro para assinar Zero Hora com o objetivo de me ler. E vez por outra davam de cara com uma carta, o que as decepcionava.

Então, não tem mais carta. Eu só quero ver como é que fica o direito de resposta, mas, por enquanto, vamos levando.

Entreguei a carta do presidente da EPTC à chefia da Redação, e ela está publicada, resumida, na página 2 desta edição.

Recebi dezenas de e-mails sobre a coluna de ontem. A metade deles rigorosamente me apoiando na restrição que faço aos azuizinhos. A outra metade energicamente discordando de mim e declarando que “tem mesmo de multar esses infratores e desordeiros do trânsito”.

Até fiquei surpreso com a metade que me apoiou: é que o povo brasileiro foi assaltado de um ímpeto punitivo ultimamente. Quer prender e arrebentar, quer condenar à morte, quer ver os presidiários sofrerem tortura e fome. Todo mundo, aterrorizado pela insegurança das ruas, quer vingança contra os criminosos.

Sabendo que têm metade da opinião pública a seu favor e só um colunista idiota contra, os azuizinhos saem todas as manhãs de seu quartel para multar a torto e a direito.

Ninguém pode ser punido pelo Estado sem um processo regular, com amplo direito de defesa.

No caso das multas de trânsito, não há lugar nenhum para a defesa dos multados. Eles podem jurar que são inocentes, que as juntas de julgamento não lhe concedem razão.

É uma inconstitucionalidade flagrante, atenta contra o bom senso. A palavra de um agente não pode ter predominância sobre a palavra do cidadão atingido pela multa. Mas só vale a palavra do agente.

É uma ditadura policialesca que tem o fim arrecadatório, que se vale do pretexto de salvar vidas para impor seu autoritarismo.

Quero, no entanto, ressalvar que sou radicalmente contrário à desordem no trânsito. Acho monstruoso o que fazem os que se excedem em velocidade e põem em perigo a vida dos outros, quando não matam ao volante.

Já cansei de escrever nesta coluna contra os motoristas que violam a faixa de segurança dos pedestres. Cheguei a escrever aqui um exagero que não retiro porque me amparo no Código de Trânsito subjetivamente: o motorista tem o dever de parar na faixa de segurança mesmo quando o sinal for verde para ele, se estiver atravessando um pedestre ou se aprestar-se somente a atravessar um pedestre.

Então, acho que meus leitores não me confundem com um anarquista. Me assenta melhor o adjetivo libertário do que anarquista.

Mas, enquanto houver voz em meu peito e inteligência no meu cérebro, não vou me calar diante daquilo que considero injusto.

Alguém em algum lugar há de erguer-se para defender os legítimos direitos dos cidadãos. Eu me ergo.

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