quarta-feira, 27 de outubro de 2010



27 de outubro de 2010 | N° 16501
MARTHA MEDEIROS


Máquina do tempo

Comecei a ler um livro que me conquistou em seus primeiros capítulos, até que desandou e eu o abandonei. A história se passa em 1908. É a história de um jovem nobre inglês que se apaixona por uma prostituta. Fica tão doido por ela, que resolve desafiar a família e abrir mão da sua herança para viver com a schifosa, mas, quando chega de mala, cuia e carruagem para morar no muquifo que ela habita, encontra seu corpo selvagemente esquartejado em cima da cama. O autor do crime: Jack, o Estripador. Um início de livro palpitante.

O rapaz volta para sua rotina aristocrática, mas nada o consola. Passam-se oito anos e ele não encontra graça na vida, até que resolve se suicidar. Já com a arma na mão, despedindo-se em pensamento de tudo o que deixará para trás, é surpreendido pela chegada de seu melhor amigo, que veio contar uma novidade bombástica: havia conhecido um cientista que inventara uma máquina do tempo. Inclusive ele, o amigo, já havia testado a geringonça, fazendo uma breve viagem de duas horas ao ano 2000.

Se ele havia conseguido passar um par de horas quase um século à frente, por que não tentar voltar meros oito anos para trás a fim de salvar a marafona da navalha de Jack?

Nesse ponto, larguei o livro. Mas você pode ir adiante, desde que volte para me contar o final. Chama-se O Mapa do Tempo, do espanhol Felix J. Palma.

Agora é conosco, caro leitor. Existisse uma máquina do tempo, para que ano você saltaria? Ou regrediria? Me fiz essas perguntas, e fiquei desolada com minha falta de curiosidade, pois acho que trocaria essa máquina por um iPad.

Se eu pulasse 20 anos no tempo, saberia o futuro das minhas filhas, o que tiraria toda a graça do trajeto, além de que contemplaria minha própria decadência: no, gracias. Se eu pulasse 200 anos, saberia se realmente faltará água no planeta e se o Brasil conseguirá virar uma potência mundial. Ok, na volta, renderia uma crônica que daria chamada de capa, mas quem confiaria na minha fonte?

Do futuro, quero distância.

Já uma viagem ao passado tem o mérito da correção. É interessante imaginar que podemos evitar acidentes que aconteceram, deixar de pronunciar o que deveria ter sido calado, mudar de atitude para evitar uma derrocada. Mas isso me soa mais como enredo de filme de ficção do que vida real, e sou viciada em vida real, incluindo os desacertos e todo o sofrimento que, não existindo máquina do tempo, tornam-se inevitáveis.

Concluí que não gostaria de ir nem um único dia para trás e nem um único dia para frente. Inventem uma máquina que faça o tempo parar, e aí sim, gracias.

Ainda que com chuva, que haja muito sol ai dentro desse coraçãozinho

Nenhum comentário: