quarta-feira, 27 de outubro de 2010



27 de outubro de 2010 | N° 16501
DIANA CORSO


Maturidade

Era inevitável, mas eu não esperava que fosse tão cedo: fiz cinquenta anos. Não se trata de surpresa, mas sim de aceitação. Pisquei os olhos e passou uma década, foi rápido não por terem sido anos insignificantes, foram bons, talvez dos melhores da minha vida.

Tenho cabelos brancos desde moça e faz muito que deixei de cobri-los com tinta, mas só agora começo a temer que eles acabem combinando com o resto, pois a jovem que espero encontrar no espelho já não comparece lá.

Não sou uma exceção à regra: vivemos tempos de obsessão com a juventude, ninguém aceita fácil ser adulto, carecemos do tempo em que nos sobravam idealizações e promessas. A existência que nos toca parece curta para tudo o que esperamos dela, mas a dificuldade de reconhecer-se adulto talvez não se restrinja a isso.

A evocação do jovem que fomos um dia é nossa memória mais vívida e preciosa: conhecemos seu jeito, seus gostos, lembramos seus feitos.

Tudo o que diz respeito aos anos da adolescência nos causa certo frisson, um envolvimento que tornou-se perene com certas músicas (são as que sabemos a letra), programas de televisão, amigos, foi nessa época que construímos nosso estilo. Ninguém lembra de si criança sem um estranhamento, ao ver fotos da nossa da infância sentimos uma distância. Sabemos que estamos ali, mas não há familiaridade com a cena.

Nessa época estamos tão misturados com os pais, irmãos, e todas as figuras cuja história e traços acabam sendo os nossos, que não sentimos propriedade sobre essas memórias. Já na juventude, nos distanciamos da família e alguma individualidade adquirida nos liberta dessa alienação. Com o fim da infância, passamos a ser sujeitos da própria história, enquanto as crianças ainda funcionam como objetos da narrativa alheia, por isso a partir da adolescência lembramos mais.

É, portanto, essa jovem que conheço tão bem que ainda mora no meu olhar. Ela está na origem da mulher que me tornei, mas pouco me conscientizei da transformação, acho que andava muito ocupada.

O adulto, em seus anos de trabalhar, amar, procriar, reencontra essa dimensão da criança: envolve-se num ser-nos-outros, esquece-se de si enquanto constitui família e tenta provar-se no mundo.

Nessa época, a necessidade de reflexão e certo egoísmo que caracterizam os jovens ficam para trás. Porém, aos cinquenta os filhos estão crescidos, muitas decisões foram tomadas, e novamente há espaço para refletir como fazem os adolescentes, para reavaliar-se no espelho. Tempo de encontro consigo mesmo, deve ser isso que chamam de maturidade, além das ruguinhas.

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