sábado, 16 de outubro de 2010



17 de outubro de 2010 | N° 16491
PAULO SANT’ANA


O ápice do artista

Depois de descrever meu zelo devotado e minha decepção suprema naquela coluna de ontem, sobre a mudança do nome do Hospital de Pronto Socorro, como ouso escrever hoje algo igual ou superior àquilo?

Por sinal, nunca se consegue superar o que se fez bem noutro dia. Quem conseguisse ter um filho belo e talentoso não deveria tentar ter um segundo filho. Assim como só deveria partir para um segundo casamento quem tivesse sido infeliz no primeiro.

Depois de pintar a Gioconda, Leonardo Da Vinci tinha que ter se aposentado e ir criar cabras na Ilha de Capri.

Depois de esculpir seu Davi, Michelangelo deveria ter encerrado suas atividades como artista plástico e se dedicado pelo resto da vida a produzir vinhos na Toscana.

O que eu quero dizer é que, depois de produzirem – os gênios em geral – as suas obras-primas, tudo o que fizerem além delas virá marcado pela inferioridade.

Albert Einstein deve ter engendrado centenas de teorias geniais, mas ele será sempre marcado pela Teoria da Relatividade.

Um pintor, um escultor, um jornalista, um advogado, um juiz, um promotor, um eletricista, qualquer pessoa de qualquer atividade, deve sempre tentar fazer o melhor, ir se superando.

Mas o que eu prego é que, quando eles atingem seu ápice, tenham a sensibilidade de entender que nada de melhor poderão fazer do que aquilo e mudem de atividade ou encerrem para sempre a sua carreira.

É desnecessário continuar o artista a obrar sua arte depois que atingiu seu ápice.

Não fica bem para o artesão de qualquer obra que ele continue a fabricar seus intentos depois de ter chegado ao seu êxtase motivacional.

Isso é como no amor, depois de se viver um grande amor, a alma, o coração, o espírito e o corpo da gente restarão estéreis para pretensas e futuras paixões.

Só deve o homem tentar se superar enquanto ele não tiver atingido o cume da sua criação.

Depois que ele chegar ao topo da montanha e com isso ter-se aproximado do céu, tudo o mais que ele fizer será inútil ou secundário.

Haja vista, desculpem se recorro ao futebol para exemplificar minha tese, o que ocorre com o Internacional no momento: depois que ganhou o direito de disputar o mundial, ficou confuso, estranhamente dispersivo e atrapalhado no campeonato nacional, no qual se atira tremulamente a esse outro objetivo, sem sentido, vazio, inerme e sem graça, deixando aparvalhada a sua torcida.

Os grandes vitoriosos não deveriam tentar mais nada, falta-lhes a motivação.

Depois que deu aquele agudo invencível e tonitruante na ópera La Traviatta, em agosto de 1993, no Scala de Milão, Luciano Pavarotti nunca mais deveria ter cantado em público, começou ali a decadência do notável e insuperável tenor.

Por isso é que eu digo sempre: só continue tentando se você sentir que ainda não atingiu seu auge.

Se já chegou a sua suprema realização, ensarilhe suas armas, fique consagrado e abra caminho a outro que tente mais tarde superá-lo.

Não há momento mais propício para dependurar as chuteiras do que quando você conseguiu driblar cinco adversários e ainda terminou a jogada com um gol de bicicleta.

Esse regra vale para tudo na vida.

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