quinta-feira, 2 de abril de 2009


ELIANE CANTANHÊDE

Ouvidos moucos

BRASÍLIA - Ao anunciar o seu pacote de bondades, reduzindo impostos para carros, motos e construção civil, o governo avisou solenemente que intermediara um acordo entre montadoras e trabalhadores, suspendendo cortes de vagas. Um legítimo e apropriado toma-lá-dá-cá. Mas...

Bem fez o meu colega Vinicius Torres Freire, que, logo abaixo da manchete sobre a redução dos impostos e o tal acordo, já foi logo avisando aos navegantes e ao pessoal do setor: "Acordo não deve impedir demissões". Na bucha.

No dia seguinte à boa notícia (da redução dos impostos), já vinha a má notícia (da redução de empregos). A Peugeot Citroën alegou uma queda de 30% nas exportações de veículos e demitiu cerca de 250 dos 700 funcionários de sua fábrica no Estado do Rio.

A medida foi justamente entre o anúncio, na segunda, e a entrada em vigor, ontem, do acordo e da prorrogação do IPI reduzido. E o Ministério da Fazenda saiu-se com essa: "O governo não pode obrigar as montadoras a não demitirem".

Se não pode, porque anunciou o acordo? Aliás, o acordo existe ou não? Por vias das dúvidas (e quantas dúvidas), a Fazenda fez um ligeiro ajuste na retórica. Não foi propriamente um acordo, foi só "um acordo de cavalheiros". Ah, bom!

Fica o dito pelo não dito, e cada um faz o que bem entende. A redução de tributos, parcialmente compensada pelo aumento do IPI e da Cofins sobre cigarros, visa aquecer a economia e manter aquecidas a popularidade de Lula e a candidatura Dilma.

Se esqueceram do tal acordo, não se devem esquecer da nítida sincronia entre o nível de emprego e o índice de Lula nas pesquisas. Cai um, cai o outro.

O pacote de bondades é bem-vindo, mas, para se encaixar igualmente bem no formato político e no econômico, é preciso antes de mais nada garantir os empregos.
Senão não tem mesmo acordo.

elianec@uol.com.br

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