quinta-feira, 30 de abril de 2009



CEM DIAS DE OBAMA

Já se passaram cem dias com Barack Obama na Casa Branca. Muita gente não queria ver um negro no topo do poder global. Outros juravam que depois de três meses o estrago seria enorme.

Obviamente que as previsões negativas não se confirmaram. Obama não fez grande coisa. Os tempos são duros. Mas já é muito mais e melhor do que todo o período Bush. O reacionarismo medieval ficou para trás. Obama vale, antes de tudo, pelo símbolo.

E é nos símbolos que ele tem arrasado. De cara, ordenou o fechamento da prisão de Guantánamo. A execução será lenta. O primeiro passo, contudo, foi dado. Com esse gesto limitado, devolveu os Estados Unidos à democracia plena, acabando com a era dos tribunais de exceção.

A medida mais importante, porém, foi outra, pelos seus aspectos práticos e simbólicos: o Ato Lilly Ledbetter. É a lei que iguala os salários de homens e mulheres em mesmas funções. Os conservadores não queriam. Achavam normal que mulher ganhasse menos pelo mesmo trabalho. Afinal, pelo que se podia entender dos seus argumentos pífios e machistas, as mulheres existem para secundar os grandes e até os pequenos homens.

Lilly Ledbetter trabalhou na fábrica de pneus da Goodyear Tire & Rubber, em Gadsden, Alabama. Depois de 19 anos de serviço remunerado indevidamente, ela processou a empresa por discriminação. A Suprema Corte americana rejeitou o pedido de indenização, alegando prescrição. A Justiça costuma encontrar boas razões para perpetrar o mal.

O republicano John McCain era contra a equiparação por uma razão tida pelos conservadores como de extremo bom senso: o aumento no número de processos de mulheres contra seus empregadores. Na mesma linha, os senadores republicanos chegaram a vetar o projeto de lei. A farra acabou. Ufa!

Obama de bobo não tem nada. Sabe que, para avançar, precisa, em primeiro lugar, não recuar. Parece muito pouco. Pode ser muito. Certamente por isso liberou o financiamento público para entidades que defendem o aborto. Na política internacional, está disposto a tirar os Estados Unidos do atoleiro do Iraque.

O forte de Obama é a sua capacidade de fazer o óbvio: governar para o mundo atual. Nem a violência da crise econômica conseguiu derrubá-lo até agora. Está salvando o capitalismo americano das mãos sujas de alguns capitalistas americanos. Em praticamente tudo, com elegância e prudência, Obama tem sido o contrário de Bush. O caubói texano passava uma imagem de bronco e de radical.

Era a sua melhor expressão de coerência: a imagem correspondia plenamente ao homem. Obama representa o equilíbrio e a sofisticação. Mesmo assim, visto que há louco para tudo, não faltam viúvas para Bush. No Brasil, a revista Veja chora de saudades dos bons tempos do neoliberalismo sem constrangimentos em que podia insultar qualquer oponente.

A farra acabou. A principal contribuição de Obama para a humanidade é ser ele mesmo. A sua presença no cenário político internacional sinaliza a cada instante uma vitória contra o preconceito. Obama é como um totem. Em torno dele, a democracia atualiza a igualdade entre os homens.

Um país rico absorve os símbolos mais facilmente. A tragédia dos pobres, como a Bolívia, é que seus símbolos não possuem margem de manobra. Brasil, Bolívia e Estados Unidos provaram com presidentes atípicos que a era dos doutores, dos coronéis, dos caubóis e dos caciques pode estar com os dias contados.

juremir@correiodopovo.com.br

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