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quinta-feira, 1 de maio de 2008
A MATURIDADE DE CHARLES AZNAVOUR
Eu estava ansioso para ver o show de Charles Aznavour. Quando eu morava na França, não estava maduro para compreendê-lo. O mesmo aconteceu na minha vida em relação ao extraordinário escritor Georges Simenon, certamente o mais complexo autor de histórias policiais.
Décio Freitas o amava e tentava partilhar comigo o seu gosto. Eu me recusava em nome de James Joyce. Um dia aconteceu.
Hoje, leio Simenon ao som de Aznavour, de Charles Trenet ou mesmo de Serge Gainsbourg. A voz de Aznavour continua poderosa. Acho até que o sistema de som do Teatro do Sesi padeceu um pouco quando o homem soltou toda a sua potência. O cantor chegou a reclamar da falta de retorno.
Mas tudo isso é detalhe quase mesquinho. A verdade é que Aznavour encantou a platéia. Ao contrário do que eu imaginava, havia pessoas de todas as idades. Sem dúvida, a chamada platéia seleta. Um acontecimento.
Depois de dobrar o cabo dos 80 anos (nasceu em 1924, em Paris), Aznavour permanece um fenômeno de voz e de domínio de palco. Tem muita energia e faz algumas piruetas de provocar torcicolo em muito guri.
Dá uma lição em qualquer publicitário desses que só sabem endeusar a juventude. Mostra que arte não tem idade nem gênero exclusivo. No auge da minha arrogância, eu achava Aznavour brega. Eu pensava o mesmo de Roberto Carlos.
Certamente há algo de brega nos dois. Mas há também em todo mundo. Mesmo em Chico Buarque, Caetano Veloso, Tom Jobim e nos Rolling Stones. A breguice faz parte da vida. Eu sou brega. Tenho paixão por muitas coisas bregas. O futebol, por exemplo, é considerado brega pelos que só amam a chamada 'alta-cultura'.
O romantismo é tido por brega. Ninguém escapa, contudo, de grandes surtos de romantismo. Nada mais brega do que um casal apaixonado de jovens hipermodernos e altamente descolados ouvindo música eletrônica e fazendo declarações doces por MSN.
Chega de provocações. Aznavour repassou os seus maiores sucessos.
Para meu gosto, embora isso varie com as estações do ano, 'Emmenez-moi' continua a ser especial. A platéia vibrou quando ouviu 'She'. Eu sou radical e purista. Não cedo diante desse piscar de olhos ao inglês. A cena mais engraçada foi a nova tentativa de Aznavour de doar, como sempre fez, o lenço, com o qual secou o suor das mãos, ao público.
Ninguém se candidatou. Esse tipo de show sempre me faz pensar sobre gostos. A cada vez, vejo chegar algumas pessoas muito conhecidas, entre as quais Paulo Brossard, o professor Leite, Juarez Fonseca, Lauro Schirmer. Não vejo o pessoal da minha geração.
Acho que venho me precipitando. Devem ser as tais afinidades eletivas. Deve ser por isso que, volta e meia, algum leitor me diz: 'Eu pensava que tu eras bem mais velho!'. A minha resposta é esta: 'Mas eu sou! Faz tempo que cheguei aos 80. É por isso que tenho esse espírito jovem e toda essa curiosidade relativista'.
Depois de comprovar a maturidade de Charles Aznavour, em plena forma clássica, irei, em junho, ao Pepsi On Stage ver e ouvir outra das minhas paixões musicais, Joss Stone, de 21 anos.
Tenho a impressão de que encontrarei outros conhecidos por lá. Salvo se for apenas o retorno de uma atitude preconceituosa ao meu imaginário. Aznavour, em todo caso, foi o máximo. Em 15 dias, dois octogenários franceses, Edgar Morin e Charles Aznavour, deram show em Porto Alegre.
juremir@correiodopovo.com.br
Aproveite o feriado e tenha um ótimo fim de semana
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