quinta-feira, 22 de maio de 2008



22 de maio de 2008
N° 15609 - Luiz Pilla Vares


Duelo dos egos

Na semana passada, dentro do Fronteiras do Pensamento, a intelectualidade porto-alegrense ficou perplexa ante o "debate" que não houve entre Fernando Arrabal e Gerald Thomas.

Perplexidade sem nenhuma razão, pois o que aconteceu era inteiramente previsível. Eu não fui pego de surpresa. Sabia que tanto Arrabal como Thomas não se enquadram no formato tradicional e acadêmico do elogiável projeto que acontece anualmente em Porto Alegre.

Aliás, toda a trajetória de ambos é precisamente o contrário dos palestrantes convencionais, ambos navegam em mares que nada têm a ver com o racionalismo que pauta a performance de um conferencista clássico.

Além disso, o ego de cada um dos dois era muito maior do que o Salão de Atos da UFRGS.

Então, poderia haver de tudo, menos um debate com posições definidas, respeitoso e esclarecedor. Creio que nem mesmo se cada um tivesse um espaço separado, a platéia sairia mais satisfeita e enriquecida.

Gerald Thomas e Fernando Arrabal são essencialmente homens de teatro, de um teatro especificamente da era pós-moderna. Isso não quer dizer que um diretor de teatro não seja capaz de oferecer uma conferência com início, meio e fim, juntando as palavras e as idéias.

Bertolt Brecht era capaz disso. Peter Brook também, assim como os nossos brasileiros Augusto Boal e o enlouquecido José Celso.

Mas Arrabal e Thomas não podem ver uma platéia; diante das centenas de pessoas que estavam na UFRGS não resistiram; era uma fantástica oportunidade de encenar, de disputar, cada um com seu jeito, de mostrar a sua genialidade, a dimensão enorme de seus egos.

Mesmo revelando a sua desilusão com o teatro contemporâneo - e ele não deixa de ter certa razão nisso - Thomas continua como um homem do teatro.

Arrabal, mais sutil, mas não menos vaidoso, também não deixou saída nenhuma para quem quisesse pensar a arte dramática no Século 21 e se enredou na própria verborragia.

Tudo isso era inteiramente previsível. Mas o ridículo ficou na disputa pela herança de Beckett, de quem o notável dramaturgo gostava mais, de Arrabal ou de Thomas? Francamente, eu - e acho que ninguém - não tenho o menor interesse nisso.

O aspecto frustrante do "debate" que não houve é que dois dos melhores encenadores atuais não têm nada a dizer sobre o teatro nos dias que correm.

O que fica é uma frustrante conclusão: há uma profunda crise no drama atual, aliás não apenas no teatro mas em toda a cultura contemporânea.

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