sexta-feira, 23 de maio de 2008



23 de maio de 2008
N° 15610 - Liberato Vieira da Cunha


Um trio de historinhas

Tem gente que precisa de uma entrada para o Cirque du Soleil, de uma síntese do último capítulo da novela das oito, da letra de uma canção de Maria Rita. Um tanto mais prosaicamente, eu necessitava de uma peça para um aspirador de pó. Haviam me dado as coordenadas de uma rua onde eu poderia encontrar o trivial objeto. Só que eu não achava a loja.

Naquela rua tinha um sebo, uma lavanderia, uma casa de lâmpadas e abajures. Foi quando me ocorreu perguntar a um senhor, que trocava uma vidraça, pela casa dos aspiradores. Ele abandonou seu trabalho e me levou por meia quadra até o exato destino onde encontrei a encantada mercadoria.

Tem gente que se perde de paixão, de apostas no bingo, de sonhos impossíveis. Um tanto menos ousadamente, eu estava extraviado num corredor de supermercado, onde procurava a gôndola das águas minerais com gás.

Me haviam passado a vaga idéia de que ficava entre os vinhos e os refrigerantes, mas tudo o que encontrei foram iogurtes de variado sabor.

Foi quando arrisquei sondar meu destino junto a uma senhora que apalpava melões. A senhora estacionou seu carrinho e me guiou, por entre filas de prateleiras, até o objeto de meu desejo.

Tem gente que adivinha o futuro, interpreta a palma da mão, prediz o tempo a uma simples mirada a uma nuvem. Por não haver sido dotado de nenhum desses dons, eu perseguia um livro, sem a menor sombra de êxito.

Me tinham dado o nome do autor, que era obscuro, era quase indecifrável. Terminei naufragado entre uma estante de matemática e outra de física quântica no shopping.

Foi quando recorri a uma senhorita, uma dessas de raro esplendor, e lhe confiei meu problema. Ela prontamente apresentou-me a um computador possuidor de toda a ciência do mundo, aí incluída a obra de que eu precisava.

Falam que as cidades tornaram-se uma selva.

Falam que as pessoas não se entendem.

Amanhã é fim de semana, haverá colisões e assaltos e mortes. Contei um trio de historinhas para recordar que não somos atores inelutáveis de tantos dramas. Contei para lembrar que, como escreveu um sábio, o brasileiro é cordial.

Ótima sexta-feira, excelente fim de semana para todos nós.

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