segunda-feira, 19 de maio de 2008



19 de maio de 2008
N° 15606 - Luiz Antonio de Assis Brasil


Palavras (32)

Locus amoenus - Há um lugar literário - árvores, frutos, riachos, aragens, pássaros, montes, campos, ravinas - a que o escritor recorre quando lhe furtam as horas do seu dia. O sol está sempre no zênite. Não há tempestades nem sismos.

Lá vivem as personagens do escritor, em eterna disponibilidade.Vive lá também seu desejo. Lá vivem seus livros ainda não-escritos, suas metáforas sem uso, seus viçosos períodos gramaticais, seu léxico mais raro.

Lá, sempre lá. Somente lá.

Após a morte do escritor, esse locus permanecerá secreto, para sempre lacrado à errante indiscrição humana.

Memórias - A primeira lembrança do infante, um fragmento de memória, é um lugar aberto: há um jardim; há uma escada; seus degraus levam a uma porta. Essa porta, que alguém abre em silêncio, dá passagem a um lento senhor de barbas brancas.

Ele usa bengala e chapéu. O som persistente e metálico é a cremalheira de uma roda de moinho. O senhor de barbas brancas pronuncia o nome do infante, pede-lhe que suba os degraus. Oferece-lhe, tentador, um caramelo embrulhado em papel-celofane vermelho.

Aí cessa a lembrança.

É tudo antiqüíssimo. Talvez não tenha acontecido dessa forma; talvez não tenha acontecido.

O adulto, quando conta essa história, tem a sensação de que mente; no entanto, isso tudo aconteceu, os velhos o testemunham em pormenor. Mas velhos, por vezes freqüentes, recordam-se do que não viram.

Parnaso - Apolo, naquele lugar, era soberano. Era a metonímia da beleza. Ele vivia com as musas.

Ninguém percebia seu enfado, ao percorrer, todos os dias, o luminoso céu, conduzindo seu carro atrelado a cavalos de fogo. Fulgurar sempre, sempre embasbacar, ser belo e cintilante para sempre, é obra indigna de um deus.

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