sexta-feira, 30 de maio de 2008



30 de maio de 2008
N° 15617 - Liberato Vieira da Cunha


A calçada do Cine Imperial

Por alguma convenção não-escrita, os domingos, nos Anos Dourados, eram os dias de você vestir suas melhores roupas. Eram também, por geral acordo, o dia de você assistir à missa das 9, ato celebrado aqui nas minhas vizinhanças em plena Catedral Metropolitana, à época desprovida de cúpula.

E eram também os dias em que o almoço surgia abençoado por uma salada de maionese, uma galinha assada, um espaguete ao molho de tomate, de sobremesa sagu com creme de leite.

De tarde, você tinha dois rumos iniciais. Ou ficava na calçada do Cine Imperial, observando a entrada das mais lindas garotas de Porto Alegre - com sorte, flertando com alguma - , ou ia pegar os programas duplos do Marabá, se não quisesse tentar o Avenida ou o Colombo, hipóteses nas quais teria de se servir de um bonde da Carris.

E não estou nem recordando outras grandes atrações da Capital, embora inteiramente desamparadas de belas senhoritas: os jogos do campeonato. A cidade tinha sete times, cada um com seu competente estádio: Internacional, Grêmio, Renner, Cruzeiro, Nacional, Força e Luz e São José.

E aí chegava a hora da dança. A Farroupilha apresentava o seu rádio-baile - e no Centro e nos bairros floresciam centenas de reuniões dançantes, ritmadas pelos pedidos de músicas dos próprios ouvintes, que eram legiões.

Depois vinha uma ligeira dor de consciência: as lições da escola que você não tinha feito. Mas isso não chegava a ser uma tragédia. Você separava os temas mais urgentes e liquidava-os enquanto ouvia os resultados dos torneios nacionais e os incertos rumos deste mal-educado planeta. E aí ia dormir o sono dos justos e dos inocentes.

Por que evoco tudo isso?

Porque achei ontem uma foto em que apareço trajando calça e casaco alto-esporte, camisa de colarinho e gravata, mais um relógio de pulso Lavina, sentado num banco da Praça da Matriz, na solitária companhia de um livro.

É um domingo dos Anos Dourados. Não sei se já fui à missa da Catedral, se espero o almoço, se vou aos Eucaliptos. Ali estou eu acompanhado de um certo sorriso. Não adivinho, mas quero apostar que provindo do pensamento da menina com que vou encontrar na calçada do Cine Imperial.

Ótima sexta-feira e um excelente fim de semana, ainda que, com temperaturas próximas a ZERO graus por aqui.

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