06 DE JULHO DE 2021
DAVID COIMBRA
A CPI da Covid e o sistema
Quando eu estava na faculdade de Jornalismo, a Famecos, da PUC, todo mundo falava no "sistema". O sistema tinha de ser derrubado, ele era a razão de todo o mal que nos acometia. Quando ocorria algo de ruim, alguém sempre deduzia: "Isso é culpa do sistema". Mas o sistema era muito forte, ninguém jamais o vencera. Como combater o sistema?
O sistema, no caso, eram os mecanismos políticos e econômicos que dominavam o Brasil desde que Cabral gritou "terra à vista" ao divisar, ao longe, o Monte Pascoal.
O sistema garantia a exploração dos mais fracos e a impunidade dos mais fortes. O sistema era flexível e sólido ao mesmo tempo. Era impossível se opor ao sistema impunemente.
O sistema, o sistema, só falávamos no sistema.
Hoje, tenho pensado muito no sistema, devido à CPI da Covid, que grassa no Senado. Porque me pergunto o seguinte: o que vai acontecer, depois de todas as apurações e revelações da CPI?
Para quem conhece o sistema, a resposta é óbvia:
Nada. Se alguém for punido por algum ilícito, do que duvido muito, será um assessor do segundo escalão ou um político obscuro.
No Brasil é assim. Mas houve um momento em que não foi assim: no período da Lava-Jato. A Lava-Jato denunciava, condenava e prendia, e fazia tudo publicamente, para não deixar dúvidas.
Durante anos, o sistema ficou perplexo. Eles não sabiam como reagir. Mas, aos poucos, foram se reorganizando, se readaptando e se fortalecendo. O mais interessante, nessa resposta, é que ela foi dada por personagens que não se encontravam diretamente envolvidos nas denúncias. Era uma parcela da sociedade que, mesmo sem se locupletar com o sistema, estava incomodada com a mudança.
Individualmente, a figura mais ativa da reação foi Gilmar Mendes. Sua atuação no desmonte da Lava-Jato foi precisa e eficaz. Claro que ele recebeu uma ajuda inesperada do seu principal alvo, Sergio Moro, que deixou a magistratura e aderiu ao governo Bolsonaro. Ou seja: inseriu-se no sistema. Foi um presente que Moro deu a Gilmar.
Nesse contexto, a redenção pública de Lula é um símbolo. Não que pessoalmente Lula seja importante para o sistema. Não é. Mas sua prisão foi o auge da Lava-Jato. Processá-lo e prendê-lo era como dizer: "Ninguém, nem o mais poderoso, está acima da lei". A anulação dos seus processos diz o contrário, diz que nada mudou, nem mudará.
Eu, iludido que sou, acreditei que a corrupção seria punida no Brasil pós-Lava-Jato. Acreditei que tudo ia ser diferente, que o cometimento de ilícitos teria consequências. Crime e castigo.
Qual o quê! A Lava-Jato não apenas foi dissolvida pelo sistema. Pior: seus promotores e seu juiz caíram em desgraça. Mais um pouco e eles viram réus.
O sistema venceu. Como sempre.
Então, como é que vou acreditar numa CPI comandada por velhos políticos?
Não, não se iluda: a CPI tem seus objetivos, mas eles são meramente políticos. Ela até poderá trazer verdades, mas nada do que fizer abalará o sistema.
Nenhum comentário:
Postar um comentário