quarta-feira, 21 de julho de 2021


21 DE JULHO DE 2021
MÁRIO CORSO

Suicídios evitáveis

Fazia tempo que não falava com um primo querido, crescemos juntos. A mudança de cidade nos afastou. Ele marcou um café. Eu estava empolgado para saber novidades, mas a conversa não foi amena. Ele estava num mau momento, precisando de ajuda. Pensamos um nome para ele se tratar e acordamos que eu ficaria com sua arma enquanto ele não estivesse bem.

Para fazer justiça, ele que insistiu em deixar sua pistola comigo. A intuição dele era melhor do que minha ciência de recém-formado na ocasião. Lembrei disso quando deparei com um estudo instigante sobre o tema.

Na Inglaterra do começo da década de 60 do século passado, quando os números de suicídios oscilaram para baixo, ninguém conseguia explicar. Os indicadores de qualidade de vida habituais, como criminalidade, desemprego e casamentos desfeitos, que acompanham os números dos eventos fatais, iam em outra direção. A queda prosseguiu na década seguinte. Excelente notícia, mas por quê?

A explicação é a mais insólita. O gás que servia às casas inglesas estava sendo substituído desde o final dos anos 1950. O antigo, feito de carvão, tinha concentração muito alta de monóxido de carbono. Foi trocado pelo gás natural, menos tóxico. A conversão era de ordem econômica, mas teve consequências inesperadas.

Na época, metade dos suicídios na Inglaterra envolvia gás. O método era popular por ser disponível em todas as casas, ser indolor e não desfigurar. Na Suíça houve a mesma troca, e os índices oscilaram igualmente. Essa história nos demonstra claramente como as facilidades dos métodos têm peso nesses eventos trágicos. Se não há um meio disponível imediato, até encontrar um, alguns dos potenciais suicidas têm tempo para pensar melhor e se dissuadirem.

Policiais não podem se dar ao luxo de ficar longe de suas armas. Será por isso que no Brasil temos mais perdas nessa classe por suicídio do que em confronto com bandidos? De fato, eles enfrentam uma situação difícil, estão sempre em contato com a parte podre da sociedade, isso cria uma insalubridade psíquica que mina qualquer um. Porém, creio que o porte de arma constante é o diferencial nessa triste estatística. Um momento agudo de desespero, somado a uma forma facilitada para cometê-lo, constituem boa parte dos suicídios.

Meu primo teve a sabedoria para pedir ajuda. Desejo a todos que tenham arma em casa que estejam atentos a esse perigo. Fiquem longe delas caso atravessem um período de turbulência emocional. Tenham elas muito bem chaveadas se alguém em casa não estiver bem. Lembre-se que você não é o único esperto que pensou em colocá-las naquele esconderijo genial. Adolescentes sempre acham o que os pais escondem. Aliás, melhor nem as ter se não for estritamente necessário.

A propósito, meu primo saiu muito bem da crise.

MÁRIO CORSO

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