15 DE JULHO DE 2021
DAVID COIMBRA
O valor de um símbolo
Gosto de assistir a filmes e séries sem saber nada sobre eles. Gosto de me surpreender e extrair a minha opinião do que vi sem nenhuma influência. Isso me lembra de um grande livro de Mario Vargas Llosa, talvez o melhor dele, Tia Julia e o Escrevinhador. O escrevinhador, no caso, nunca lia nada de outro autor, para não permitir que seu estilo sofresse qualquer interferência externa.
Pois bem. Tempos atrás, comecei a ver uma série da qual nada sabia, Outlander. É uma trama baseada em livros que eu não leria, da americana Diana Gabaldon. Digo que não leria porque, realmente, não é o tipo de literatura que aprecio - uma história em que o épico disfarça o romance açucarado.
Mas filme é diferente de livro. Não leria, porém veria. E vi. Estou vendo, na verdade, porque a série é longa. O livro é longo. Nem é um livro só, são oito, e parece que a autora planeja terminar a saga no décimo.
Então, estou assistindo a Outlander, e gostando. Na parte histórica da série, ela conta sobre uma conhecida batalha travada entre ingleses e escoceses no século 18, a Batalha de Culloden, em que o exército rebelde escocês, baseado nos guerreiros highlanders, é estraçalhado pelo mais disciplinado, mais bem-treinado e mais bem-armado exército britânico. Depois dessa derrota, o estilo de vida das Terras Altas escocesas é, na prática, extinto pelos ingleses.
Esse pedaço da história do mundo é interessante, mas pouco abordado. Porque os ingleses, para vencer os escoceses, não se limitaram a batê-los militarmente; tiveram de submetê-los culturalmente. Para isso, os ingleses proibiram aos escoceses o uso do tartan e do kilt. O kilt é a famosa saia que vestem os homens escoceses e o tartan é um padrão quadriculado de tecido de lã. Depois de Culloden, se um escocês fosse pego ostentando o kilt ou o tartan, podia ser preso por seis meses.
Foi assim que os ingleses quebraram o ânimo patriótico dos escoceses. Porque esses símbolos têm importância. São valores intangíveis, mas, ainda assim, preciosos, porque representam algo além da sua utilidade material. Representam uma vontade.
Como o volante para o futebol gaúcho. Volante, não: centromédio. O futebol gaúcho não pode ser só toque de bola, não pode ser só meias habilidosos e pontas velozes. Não. O futebol gaúcho é a pátria do centromédio, do número 5, do cabeça de área. Não por acaso, o maior centromédio do futebol mundial em todos os tempos saiu daqui: Paulo Roberto Falcão, que podia jogar futebol de toque, claro que podia, mas que, na essência, era centromédio. Era 5. Tanto que o carro no qual ele rodava quando jogava no Inter era um Chevette preto, placas 5555. Andei nesse carro, mas essa é outra história. Fica para outro dia. Por ora, quero saudar a ascensão de um centromédio no Grêmio: Fernando Henrique. Nome de presidente, jeito de jogar dos velhos centromédios. Se confirmar que joga tanto quanto parece, é mais do que um reforço para o time. É um símbolo.
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