27 DE JULHO DE 2021
CAPA
A magia de crescer escrevendo
Por meio da ficção ou de relatos autobiográficos, crianças e adolescentes exploram o mundo dos livros em meio à era digital
Autores mirins comprovam: o céu é o limite. Na cena literária da Capital, adolescentes e até crianças arriscam tornar seus escritos públicos, desbravando um cenário ainda pouco explorado, mas cheio de possibilidades.
Contando com muita imaginação, Melissa Mellvee, 13 anos, estreou nesse mundo recentemente com a publicação da ficção Meu Padrasto é a Maior Viagem.
A inspiração veio ao estilo H. P. Lovecraft: por meio de sonho (sem as cenas de terror, porém). Não partiu da mente da menina, mas de sua mãe, Fernanda, ao atender um dos pedidos da filha para contar sobre suas viagens oníricas. Depois de ouvir a narrativa de uma noite regada a imagens de um passeio de conversível com um famoso em Estocolmo, Melissa estava pronta para trazer à luz Ingrid, adolescente brasileira que vê sua vida virar de ponta-cabeça ao mudar-se para a Suécia. Em tom divertido, as 260 páginas do livro discorrem sobre as aventuras da protagonista, que logo se vê diante de uma série de situações embaraçosas pelo choque cultural e uma coincidência inusitada: o até então desconhecido namorado de sua mãe é, na verdade, o ídolo sueco da adolescente.
Apesar de dividir seu tempo entre as aulas do nono ano do Ensino Fundamental, colunas para o site Artrianon e a administração do perfil Domínio do Dragão - para fãs de literatura fantástica e de Como Treinar o Seu Dragão - há espaço para mais projetos. Um deles é o romance Nós e os Dragões, sobre uma princesa que contraria as ordens de seu clã para tornar-se uma guerreira, com previsão de publicação para este ano.
- E também estou planejando o Meu Padrasto É A Maior Viagem 2. A Ingrid ainda vai ser muito zoada, acho que essa aventura não pode parar por aí - adianta Melissa.
Os jovens não estão limitados à ficção. Roberta Menda, conhecida também como Beta, enveredou para o lado da autobiografia e, em um processo para transformar comentários maldosos em algo bom, publicou O Diário das Minhas Mãozinhas quando tinha sete anos de idade. Nele, a autora compartilha a história de sua vida para conscientizar sobre a brida amniótica e ensinar empatia. A síndrome, que acometeu suas mãos, desenvolve-se ainda no útero.
Na época, pessoas a sua volta não a levaram muito a sério - afinal, Beta ainda estava aprendendo a escrever. Sem desanimar, a garota pediu ajuda aos parentes. Hoje, aos 10 anos, atua como palestrante e está com o segundo volume do livro pronto. Por enquanto, ela aguarda a situação da pandemia no Brasil melhorar para lançar uma edição única com ambos os títulos.
- A gente estava com medo de que as pessoas comprassem só o segundo livro. O primeiro é muito importante também, são os meus dois lados. Eu não sou apenas minha mão - afirma Beta.
Família
Independentemente do gênero literário, as autoras frisam o papel central do incentivo da família em sua formação. Engrossando a constatação, o autor e ilustrador Carlos Augusto de Brum, o Cadu dos Livros, relembra como seu gosto pela leitura e desenho existe desde criança, mas também como seus pais eram leitores e se dispunham a ler para ele. O ano de 2021 marca o meio-a-meio de sua vida: 17 anos é a idade que tinha quando escreveu seu primeiro livro, Tentações, Dardos & Fardos, e também é quanto tempo se passou de lá para cá. Dirigido ao público adulto, seu título de estreia está esgotado. Mas sua marca registrada é a literatura infantil, interesse cultivado ao perceber a identificação dos pequenos com suas ilustrações. Aos 34 anos, Cadu acumula um total de 62 obras.
- Hoje em dia, visitando escolas, vejo o trabalho excelente desenvolvido pelos bibliotecários e professores das escolas privadas e das redes públicas, mas é importante lembrar que não basta a escola. Na formação de um leitor, é essencial a participação da família, e a leitura é algo igualmente essencial na formação de um ser humano - aponta Cadu.
Nem Melissa nem Beta têm contato com um autor da mesma idade. Cadu, por sua vez, admite que parte desse isolamento se dá muito pela natureza do ofício, bastante solitário e normalmente envolvendo uma sala fechada e concentração. O encontro entre escritores se dá mais em eventos literários presenciais, conta ele. Apesar disso, reflete que a internet abriu portas, e deixa como conselho para a nova geração ter perfis ativos em redes sociais. Afinal, como gosta de dizer, "todo bom trabalho eventualmente encontra seu público".
PAULA CHIDIAC
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