sexta-feira, 16 de julho de 2021


16 DE JULHO DE 2021
DAVID COIMBRA

Os bombeiros heróis de Porto Alegre

No prédio onde eu morava, nos Estados Unidos, volta e meia soava o alarme de incêndio. Às vezes era só uma panela esquecida sobre o fogo do fogão, e mesmo assim o alarme tocava de forma assustadora, estremecendo paredes, espantando sonos.

A propósito: os fogões do edifício não tinham fogo. Eram todos elétricos. No início, encarei com certo preconceito aquele fogão que queimava sem fogo, mas depois me acostumei e passei a gostar muito. Hoje, gosto mais do que do fogão tradicional.

Mas eu ia contar do alarme. Quando aquela sirene gritava, todo mundo descia para a frente do prédio. Podia ser de madrugada, podia estar nevando, descíamos todos. Aí, em dois minutos, chegavam os bombeiros. Vinham com grande alarde em pelo menos dois caminhões. Entravam no prédio debaixo daqueles chapelões, com as mangueiras enroladas nos ombros ou portando machados. Os moradores olhavam para eles com admiração e respeito. Só voltavam aos seus apartamentos quando o chefe dos bombeiros liberava, cheio de autoridade:

- Está tudo bem: foi só uma panela esquecida no fogão.

Essa admiração vi também em Nova York, no World Trade Center. Existe lá uma estação dos bombeiros que atuou na queda das Torres Gêmeas. As pessoas visitam a estação, cumprimentam os soldados com certa reverência e pedem para tirar fotos com eles. O meu filho tem uma dessas fotos, ele na frente de um caminhão vermelho, ao lado de um soldado sorridente.

Os americanos sentem tanto apreço pelos bombeiros porque reconhecem a natureza heroica de seu trabalho. Policiais, em geral, têm esse desprendimento, arriscam suas vidas para salvar as dos outros, mas os bombeiros se destacam pela urgência da atividade - um prédio está em chamas, há pessoas dentro, eles precisam tirá-las de lá. Poucas situações são tão prementes quanto essa.

Como velho repórter de polícia, fui testemunha de muitas ações dos bombeiros em condições diferentes. Já vi bombeiros controlando sinistros em grandes prédios de aço e vidro e em pequenas casas de madeira. Já vi bombeiros lidando com o famoso "fogo no mato". E, menos de 10 anos atrás, vi como eles salvaram o prédio histórico do Mercado Público de Porto Alegre.

Agora, no incêndio do prédio da Secretaria de Segurança, no centro de Porto Alegre, dois bombeiros desapareceram em ação. Um deles estava de folga e apresentou-se voluntariamente para ajudar. Esse tipo de gesto é bastante peculiar dos bombeiros, exatamente por essa disposição que os caracteriza, essa entrega, essa capacidade de doação à segurança alheia.

Essas qualidades movem os bombeiros e soldados de lá, dos Estados Unidos. E os de cá, como se vê pelo caso dos dois soldados que desapareceram em ação, nesta semana, em Porto Alegre. A diferença é que, lá, é possível perceber o respeito e a admiração no olhar dos americanos. Ou seja: o heroísmo é o mesmo. A gratidão nem tanto.

DAVID COIMBRA

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