sábado, 24 de julho de 2021


24 DE JULHO DE 2021
ELÓI ZORZETTO

Como pode?

Há muito tempo as óperas, o cinema, o teatro perceberam que alguns ingredientes são fundamentais para conquistar o público. Além do cuidado na produção, de um enredo que desperte o interesse, de argumentos bem-fundamentados, a luta entre o bem e o mal se destaca. Por algum motivo esse embate entre forças opostas desperta uma grande curiosidade e é quase uma garantia de sucesso de público. É claro, todos gostam que, depois do sofrimento, da tragédia, do embate, da injustiça, o bem vença. Aliás, você lembra de algum filme que terminou com o mal triunfando? Existem, mas são poucos. As novelas, uma paixão nacional, jamais terminam com o mal se sobrepondo ao bem. Imagine a decepção daqueles que durante meses se sentaram diante da TV e sofreram junto com seus personagens favoritos ao ver o carrasco, o criminoso, o desleal, o mentiroso vencer? Não dá. Todos aplaudem o final feliz.

A maldade é um ingrediente humano. Eu até duvido de que o maldoso goste da maldade. Mas por algum motivo, em algum momento, ele a pratica. Tanto na ficção quanto na realidade, as pessoas do mal são uma absoluta minoria. A grande maioria é de gente boa, digna, trabalhadora, honesta. O problema é que os maus, mesmo em minoria, fazem um estrago muito grande na sociedade como um todo, principalmente quando se juntam. 

Às vezes, os prejuízos são irreparáveis, especialmente quando se passam por bonzinhos. Emocionalmente frias, as pessoas más compartilham traços narcisistas e sonham com poder ilimitado. Manipuladoras, pouco se importam com os sentimentos alheios. Possuem pouca ou nenhuma empatia. Com seu cinismo, usam artimanhas com a única finalidade de alcançar seus objetivos beneficiando os próprios interesses. Aceitam o comportamento degradante como algo corriqueiro, normal. Elas estão espalhadas em todas as classes sociais.

Do outro lado temos as pessoas que se destacam pelas características positivas. São íntegras, honestas, generosas, respeitosas, confiáveis, responsáveis, gentis, resilientes, disciplinadas. Elas possuem os melhores predicados. Poderíamos descrever infinitas características desses indivíduos que são responsáveis pelo desenvolvimento social positivo.

Ignorância, ingenuidade, oportunismo, vingança, influência ou perspectiva de algum tipo de vantagem são alguns dos motivos que formam os maus. Cruéis e arrogantes, não se importam de, lá adiante, fazer exatamente o contrário de tudo o que haviam pregado antes. É o senso de oportunidade valendo mais do que a palavra, do que a integridade ou do que qualquer valor digno que pudesse atrapalhar seu objetivo. E isso não tem distinção de classe social. 

Nós tentamos procurar respostas, mas nenhum argumento nos convence da adoção de tais práticas. E nos perguntamos: como pode alguém jogar uma pedra e matar uma pessoa que passa de carro sob um viaduto? Como pode um cirurgião plástico usar a medicina para assediar e violentar as pacientes? Como entender o comportamento de alguém como o jovem Iverson de Souza Araújo, o DJ Ives? Que, mesmo tendo milhões de seguidores nas redes sociais, praticou brutais agressões contra a ex-mulher diante da filha de nove meses. 

Como pode alguém se valer de um cargo público para se beneficiar e também locupletar seus asseclas com recursos arrecadados a duras penas através de contribuições e altos impostos pagos por pessoas severamente injustiçadas a quem havia prometido defender? Como pode alguém fazer falsas promessas enquanto candidato, propagar aos quatro cantos que é honesto e, depois de eleito, fazer o contrário ou permitir que outros dos seus o façam? Como pode alguém discordar do meio mais eficaz para combater uma doença que já provocou milhões de mortes no mundo? Como pode, durante uma pandemia, o Congresso aprovar um gasto de R$ 5,7 bilhões para financiar uma campanha política?

Se esses fatos fossem parte de uma série, filme ou novela, este seria o momento em que entram em cena os psiquiatras e a Justiça. A sociedade, que tem a grande maioria composta por pessoas do bem, precisa convencer os autores da realidade a reescreverem alguns roteiros e também alguns finais.

*David Coimbra está em férias - ELÓI ZORZETTO - INTERINO

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