ELIANE
CANTANHÊDE
A tragédia nossa de cada ano
BRASÍLIA - Entra prefeito, sai
prefeito; entra governador, sai governador; entra presidente, sai presidente e
todo ano começa com tragédias ditas naturais, mas que, de naturais, têm só uma
parte. O resto é descaso do setor público.
Quem liga a TV no Ano Novo e no
Carnaval sabe que vai encontrar shows de fogos e desfiles de escolas cada vez
mais espetaculares e sabe também que vai passar janeiro e fevereiro assistindo
imagens horripilantes de enxurradas, deslizamentos, casas e bens destruídos,
vidas que não serão mais vividas.
Faz parte desse ritual vasculhar
os orçamentos públicos para identificar responsáveis: o governo federal? O
estadual? Sem esquecer que há sempre quem culpe as próprias vítimas, essas
descuidadas que moram em barracos e/ou barrancos.
Já na largada do ano, com os
desabrigados contados aos milhares no Rio, a ONG Contas Abertas pesquisou três
programas do Ministério da Integração Regional para prevenção e reconstrução em
2012 e, como quem procura acha, descobriu: dos R$ 5,8 bi autorizados, R$ 3,7 bi
foram empenhados, ou reservados, e só R$ 1,9 bi acabou sendo efetivamente pago.
Dá 32,2%.
Enquanto os números saltavam das
telas e escandalizavam na internet, o ministro da pasta, Fernando Bezerra,
cumpria seu papel no ritual de todo início de ano: sobrevoava as áreas
atingidas, compungido, ao lado do governador Sérgio Cabral.
Com a frente fria se deslocando
ao norte, os estragos e as cenas vão se repetir no Espírito Santo, se é que já
não estão se repetindo. E podem se alastrar. Onde mais? Minas? Santa Catarina?
Só mudam os rostos: do governador, dos atingidos, talvez dos ministros, ora da
Integração, ora do Planejamento...
Mas a culpa nem é de um governo,
de um governante. É antiga, vem de décadas. O Brasil ignora que o seguro morreu
de velho e que prevenir é sempre melhor do que remediar.
elianec@uol.com.br
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