
PT Saudade
Ainda existe o telegrama no Brasil, adotado para aviso oficial, para notificação extrajudicial, como uma formalidade para reforçar o recebimento.
Mas é um fantasma. Já morreu no Reino Unido (1982) e nos Estados Unidos (2006), e aqui caiu em desuso completo. No ano passado, houve a remessa de 8 mil deles, um volume simbólico perto de 15 milhões em 1980.
O telegrama foi um meio de comunicação fundamental, imprescindível, consagrado por dois séculos.
Você recorria a ele em casos de urgência - o recado deveria chegar no mesmo dia. Uma maneira de superar distâncias num período em que telefone fixo era raridade, exclusivo das famílias mais abastadas.
O jornalista Alberto Villas diz que se tratava de uma exceção inadiável: quando aquela mensagem que andava de ônibus precisava pagar um táxi. Custava mais caro: um Sedex de palavras. Calculava-se o valor do serviço pelo número de caracteres.
Costumava ser enviado em datas especiais, a partir de mensagens ditadas na agência dos Correios e impressas como frases pequenas, mínimas, muitas sem sujeito, sem preposições, sem conjunções, buscando economia e concisão - o equivalente hoje a um adolescente escrevendo de modo cifrado no WhatsApp.
A pontuação vinha expressa em letras abreviadas. O telegrama terminava, na maioria das vezes, com "PT Saudações". "PT" significava "ponto". O carteiro surgia fora de seu horário tradicional de entrega da correspondência.
Sem nenhuma comemoração acontecendo no lar, sua batida na porta acabava sendo vista como agouro. Imaginava-se o pior: anúncio de falecimento ou internação de parente.
Também podia trazer boas notícias: convocação em concurso público, congratulação por casamento ou nascimento de filho. O governador mineiro Tancredo Neves, nosso quase presidente, destacou-se como um adorador dessa missiva. Utilizava-a inclusive para agradecer aos eleitores.
Meu avô Leonida Carpi, imigrante italiano, para evitar confusões babélicas entre a sua língua natal e a de adoção, tirava proveito dos comunicados curtos e solenes. Às vezes, cutucava seus desafetos políticos.
Quando um correligionário do PTB traiu Getúlio Vargas, o vô passou este telegrama mordaz: "Até tu Brutus Interrogação".
Eu juntei o maior número de telegramas após a minha formatura na Fabico, proveniente da parentada do interior. Ou depois das minhas primeiras sessões de autógrafos, de quem não conseguiu ir. Ou quando ganhei um prêmio literário nacional. Ou quando a minha filha, Mariana, veio ao mundo.
Popularizou-se como um documento das vitórias e celebrações, com direito a ser exposto na geladeira. Por mais que eu tente guardar a minha coleção para a posteridade, seu alfabeto segue desaparecendo com o tempo, como antigos recibos fiscais.
Na época da emissão, a tipologia já era um pouco apagada, cinzenta, irregular, como se estivesse sempre no fim da fita, própria dos martelinhos tac-tac-tac-tac do Telex. Só a saudade para reconstituir sua emoção.
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