sexta-feira, 28 de novembro de 2025



28 DE NOVEMBRO DE 2025
CARPINEJAR

A polarização incurável

Sempre escutei a expressão terceira via, inclusive antes dos livros do italiano Norberto Bobbio. Mas nunca foi uma realidade no país. Em qualquer eleição que se aproxima, ela é mencionada por diferentes candidatos, que terminam atropelados pelos favoritos reincidentes.

Ciro Gomes, por exemplo, naufragou em quatro eleições presidenciais defendendo esse discurso. Nem seu plano de governo de renda mínima ou de anistia do SPC conseguiu mitigar a sua rejeição, que aumentou de pleito a pleito. Seu desespero para emplacar como alternativa pode ser verificado pela troca de siglas: já foram oito partidos até o momento, procurando um lugar em que fosse declarado candidato oficial - PDS (1982-1983), PMDB (1983-1990), PSDB (1990-1997), PPS (1997-2005), PSB (2005-2013), PROS (2013-2015), PDT (2015-2025) e novamente PSDB (2025). Há 27 anos busca a rampa do Planalto, mas parece subir uma escada rolante no sentido contrário. De 2011 em diante, não se habilitou a nenhum segundo cargo eletivo. Seu intento eterno vem apresentando uma nova carreira: presidenciável.

É a encarnação do fracasso da terceira via, uma rodovia de projetos em que se joga piche no chão e jamais se conclui a duplicação.

Sob esse viés, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva talvez seja o único governante brasileiro a permanecer no mesmo partido, a contar o início de sua trajetória como metalúrgico. Nunca virou a casaca. Ele é o PT, o PT é ele. Tanto que sofre com a dificuldade de indicar sucessores, numa antropofagia identitária.

Não sei de quanto tempo precisaremos para nos curar da polarização. Minha convicção é que não será agora, não será cedo.

É efeito colateral do nosso saber acadêmico recente. As primeiras universidades brasileiras foram criadas apenas no século 20: em 1912, surgiu a Fundação da Universidade Federal do Paraná (UFPR); em 1920, a Universidade do Rio de Janeiro; em 1934, a Universidade de São Paulo (USP). Ou seja, o conhecimento sistêmico acabou formalizado quatro séculos depois da chegada dos portugueses. Pagamos os juros da formação retardatária. Não saímos da creche da depuração teórica se nos compararmos ao México e sua Real y Pontificia Universidad de México, de 1551, ou ao Peru e sua Universidad Nacional Mayor de San Marcos (UNMSM), também de 1551, em Lima.

Como esperar que nos aprofundemos em um debate se nossas pioneiras academias estão recém completando cem anos?

A radicalização está presente desde a Primeira República. Não é um movimento acirrado da atualidade entre petistas e bolsonaristas. Vive-se mais um capítulo da obsessão entre mocinhos e bandidos, do messianismo populista, do nosso atávico extremismo, que não permite enxergar o que vai além dos duelos caricaturais.

O Brasil jamais desfrutou de uma fuga de rota, de uma colisão entre duas frentes. A tensão se mostra intermitente, mudando os nomes das causas, dos culpados, dos salvadores da pátria:

Café com Leite (SP/MG) versus Dissidências regionais

Civilistas versus Hermistas

Tenentismo versus Oligarquias

Getulistas versus Antigetulistas

PTB versus PSD

UDN versus PTB/PSD

Arena versus MDB

Colloristas versus Caras-Pintadas

Reformistas neoliberais versus Desenvolvimentistas

PT versus PSDB

Petistas versus Bolsonaristas

O fogo cruzado somente faz vítimas. É um querendo derrotar o outro mais do que governar para todos.

Reduzimo-nos ao antagonismo de Sísifo, a uma guerra simbólica entre esquerda e direita. Somos passionais na política. Levamos tudo para o lado pessoal, inviabilizando a discussão de ideias de forma abstrata e evoluída. Somos igualmente personalistas, desmerecendo partidos e favorecendo nomes. Vota-se ainda "em alguém", não no que ele representa.

Necessitamos de mais princípios e menos torcidas. Enquanto isso prosperar, políticas públicas essenciais - economia, saúde, segurança, educação - continuarão secundárias. _

CARPINEJAR

28 de Novembro de 2025
GPS DA ECONOMIA - Marta Sfredo

Sonegação de R$ 26 bi une Lula e Tarcísio

Uma das duas únicas refinarias criadas antes da Petrobras é um dos principais ativos do grupo Refit, alvo da megaoperação que une vários órgãos do governo de São Paulo, comandado por Tarcísio de Freitas, e outros do governo Lula. O que liga dois possíveis adversários na eleição de 2026 é um poderoso aglutinador: prejuízo estimado em R$ 26 bilhões aos cofres públicos - cerca de um terço da arrecadação anual do RS.

O grupo comandado por Ricardo Magro é o maior devedor de ICMS de São Paulo e do Rio e um dos maiores da União. Para não quitar esses pagamentos, costumava usar liminares judiciais e programas de prorrogação de dívida. Entre as acusações, sustentada pela Receita Federal e pela Agência Nacional do Petróleo (ANP), está a de que a Refit importaria combustíveis em vez de refinar petróleo. Quatro navios foram apreendidos em setembro, com 200 milhões de litros trazidos de forma irregular da Rússia.

Atuação em finanças semelhante à do PCC

A partir disso, a forma de atuação do grupo seria semelhante à do PCC no mercado de combustíveis exposta pela operação Carbono Oculto, com uso de fintechs e fundos de investimento para lavar dinheiro. O aspecto antipolarização é representado pela abrangência dos órgãos que atuam: seis órgãos do governo Tarcísio em SP e dois do governo Lula. Mas se houve convergência entre o governo de SP e o federal, até há poucas semanas existia um embate com o governo do Estado do Rio. A refinaria havia sido interditada, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro liberou, e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) voltou a suspender. Ainda há ligações políticas: Magro foi advogado do ex-presidente da Câmara dos Deputados Eduardo Cunha e teria conexões com outros parlamentares.

Foram bloqueados R$ 8,9 bilhões pela Justiça de SP e R$ 1,2 bilhão pela federal. A expectativa é de que a ação ajude a destravar o projeto contra devedores contumazes que está parado na Câmara dos Deputados. Para ser colocado em apreciação, precisa de uma decisão do presidente da Casa, Hugo Motta Hugo Motta (Republicanos-PB). _

Como o Dia de Ação de Graças fechou os mercados dos EUA, o dólar operou sem direcionadores claros e avançou 0,32%, para R$ 5,352, ontem. A bolsa oscilou 0,12% para baixo e estacionou em 158,3 mil pontos, perto do recorde.

Vagas em Rio Grande podem subir a 2,9 mil

A vitória na licitação de navios gaseiros já era uma possibilidade em outubro, quando o CEO da Ecovix, Robson Passos, deu entrevista à coluna. Na época, sua projeção para a ampliação na geração de postos de trabalho era de 1,6 mil para 2,9 mil no pico das obras. Sobre o que significaria para a movimentação na construção naval em Rio Grande, ele havia afirmado:

- Significa o processamento de cerca de mais 30 mil toneladas de aço para processar em 57 meses, além dos 20 mil do primeiro. A ocupação subiria de 10% para cerca de 20% no pico e a mobilização de 2,9 mil trabalhadores no total.

Há pouco mais de um mês, Passos também avaliou que existe mão de obras disponível e treinada para dar conta dessa demanda:

- No passado, a Ecovix e outros estaleiros capacitaram pessoas. Parte era de fora e migrou de setor por conta da crise. Mas posso afirmar que hoje em Rio Grande temos 5 mil metalúrgicos desempregados que precisam ser ocupados.

Como é a retomada

A Transpetro, empresa de logística da Petrobras, está fazendo licitações para a construção de 25 navios para a estatal. Conforme seu presidente, Enio Bacci, a retomada da construção naval está sendo feita de forma cautelosa, para evitar a repetição de erros do passado.

A Ecovix havia vencido a primeira disputa, para fazer quatro navios do tipo handy, com contrato ao redor de R$ 1,5 bilhão. Agora, também ganhou parte da segunda, com valor aproximado semelhante. _

Estamos falando de R$ 320 milhões. É como se subtraísse da população um hospital de médio porte por mês.

Tarcísio de Freitas

Governador de São Paulo, dando não só escala a valores que podem parecer abstratos como traduzindo o tamanho do estrago feito por megaoperações de sonegação como o da Refit, que chegava a R$ 320 mihões por mês só no seu Estado.

Indústria fecha 5,7 mil empregos

O RS perdeu 5,7 mil empregos em outubro, terceiro mês do tarifaço dos EUA sobre produtos brasileiros, conforme dados do Novo Caged, atualizados ontem.

Ao todo, foram 27 mil contratações e 32,7 mil demissões no período. O saldo representa o pior resultado para o mês desde 2020, ano de criação do Novo Caged, afetado pela pandemia. Os setores de tabaco e couro e calçados puxaram a queda.

No acumulado dos três meses de tarifaço, o RS fechou 11,8 mil postos de trabalho. O recuo de Donald Trump na taxa sobre alimentos só vai impactar os números de novembro. E ainda assim de forma discreta, já que alguns dos produtos gaúchos que mais pesam na exportação para os EUA seguem com tarifa de 50%. A queda no emprego é resultado não só do tarifaço, mas também da desaceleração da atividade econômica por efeito do juro alto. Considerando dados nacionais, a indústria brasileira perdeu 10,1 mil empregos em outubro. _

setores saldo

Tabaco -2.612

Couro e calçados -1.063

Máquinas e equip. -735

Veículos e carrocerias -412

Produtos de metal -297

Haddad dá spoiler sobre "mistérios" do Master

As fraudes do banco Master já provocaram prejuízos a clientes que aceitaram o risco e mesmo a precavidos usuários do Sistema Financeiro Nacional pelo custo imposto ao Fundo Garantidor de Crédito (FGC). Ainda antes da liquidação do banco, já havia provocado efeitos que ainda estão por ser revelados.

Em rara quebra de sua habitual discrição, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, deu detalhes sobre o caso.

- O presidente do Banco Central recebeu uma herança difícil do ponto de vista regulatório, que envolvia tanto fintechs quanto o Master - disse Haddad em entrevista à Globonews.

Segundo o ministro, havia risco ao Tesouro, já que um terço do Fundo Garantidor de Crédito (FGC) é de bancos públicos. Logo depois do anúncio de venda do Master ao Banco de Brasília (BRB), o Conselho Monetário Nacional (CMN) apertou as regras do FGC para desencorajar práticas agressivas de captação.

Haddad ainda mencionou o inesperado pedido de demissão do presidente da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), João Pedro Nascimento. Antes da liquidação do Master, a "xerife do mercado financeiro" investigava as práticas do banco.

- O pedido de demissão do presidente da CVM ocorreu em ambiente muito tóxico, que gerou muita especulação e foi objeto até de uma conversa minha com o procurador-geral da República - relatou Haddad.

Na época, a especulação era de que Nascimento teria enfrentado pressões de integrantes do Congresso Nacional e de agentes econômicos no caso do Master. _

GPS DA ECONOMIA


28 DE NOVEMBRO DE 2025
POLÍTICA E PODER - Rosane de Oliveira

Assembleia compra energia renovável

Para não deixar a sustentabilidade, bandeira do seu mandato, apenas no discurso, o presidente da Assembleia, Pepe Vargas (PT), adotou mais uma medida prática ontem. Pepe formalizou um novo contrato de fornecimento de energia elétrica no ambiente de contratação livre, reafirmando o compromisso do Pacto RS 25. A contratação foi aprovada pelo deputado e pela superintendente administrativa financeira, Cláudia Bonalume, após processo licitatório, via pregão eletrônico.

A contratação foi firmada com a empresa de São Paulo Matrix Comercializadora de Energia Elétrica S/A, pelo prazo inicial de 60 meses, podendo ser prorrogado por até 10 anos. O novo sistema entrará em funcionamento em dezembro e irá atender à demanda energética dos prédios do Palácio Farroupilha e do anexo. A iniciativa é considerada pioneira entre os legislativos estaduais do Brasil.

A economia direta estimada é de aproximadamente R$ 1,5 milhão (27,03%) em relação ao referencial anterior. Segundo Pepe, com o reajuste de 21%, anunciado pela concessionária, as projeções ficam ainda mais vantajosas: a economia pode alcançar até R$ 2,5 milhões no período - cerca de 37% de redução em cinco anos.

- Além da redução de custos, o contrato assegura que 100% da energia consumida pela Assembleia seja proveniente de fontes renováveis - comemora o deputado.

Comprovação de origem limpa

A empresa contratada deverá apresentar anualmente o certificado I-REC (International REC Standard), instrumento internacional de rastreabilidade, que comprova a origem limpa da energia.

A superintendente destaca que os preços permanecerão fixos no primeiro ano e, após, serão reajustados anualmente pelo IPCA-DI, garantindo previsibilidade e estabilidade financeira nas contas da instituição. Modelos semelhantes já são utilizados por instituições como Ministério Público, Banrisul, Grupo Hospitalar Conceição (GHC) e Câmara de Bento Gonçalves. _

O desembargador Túlio Martins reassumirá a presidência do Conselho de Comunicação do Tribunal de Justiça do

Rio Grande do Sul, cargo que ocupou de 2010 a 2020. O convite foi feito pelo presidente eleito do TJRS, Eduardo Uhlein.

Como sempre ocorre às vésperas de eleições, aumentou a pressão para que o ex-governador José Ivo Sartori concorra. Para 2026, a expectativa do MDB é de que seja candidato a deputado federal. Questionado se aceitará, Sartori promete responder "depois da Festa da Uva". Em 2024, a resposta foi "não". 

aliás

Passados sete anos desde que o marido deixou o Piratini, a ex-primeira- dama Maria Helena Sartori comemora o sucesso dos Centros da Juventude, lançados quando foi secretária, por meio do Programa de Oportunidades e Direito, financiado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). São milhares de jovens atendidos.

Aécio Neves assume a presidência nacional do PSDB

Depois de alguns anos de ostracismo, no turbilhão das denúncias que o retiraram da lista de possíveis candidatos à Presidência e em que precisou recomeçar como deputado federal, Aécio Neves está de volta à ribalta. O neto de Tancredo Neves assumiu a presidência nacional do PSDB, disposto a tornar o partido novamente protagonista no país.

Na posse, acenou com a possibilidade de apoiar Tarcísio de Freitas para presidente, se ele não se apresentar "apenas como candidato de Bolsonaro" e anunciou que sua meta é eleger 30 deputados federais.

Uma das prioridades é definir o rumo da sigla no Rio Grande do Sul. _

Rodrigo Mohr será presidente do Tribunal de Justiça Militar

O Tribunal de Justiça Militar elegeu ontem os integrantes da administração para o biênio 2026/2027. O desembargador militar Rodrigo Mohr será o presidente. O decano da Corte, Sergio Brum, será o vice-presidente. A desembargadora Gabriela John foi eleita corregedora-geral.

Também integrarão a nova administração os desembargadores militares Fabio Fernandes (ouvidor), Amilcar Macedo (ouvidor substituto) e Maria Moura (ouvidora da mulher).

A posse da nova administração ocorrerá no mês de fevereiro de 2026, em data e horário a serem definidos. 

POLÍTICA E PODER


28 de Novembro de 2025
INFORME ESPECIAL - Vitor Netto

Presidentes militares na América do Sul

A terça-feira tornou-se um dia marcante para o Brasil, sendo a primeira vez que um ex-presidente da República e militar, Jair Bolsonaro, foi preso. Além do caso brasileiro, ao menos outros três países da América do Sul já tiveram mandatários detidos.

O Julgamento das Juntas Militares se tornou um marco histórico na Argentina, um dos casos mais conhecidos no mundo em que um tribunal civil julgou e condenou os comandantes de uma ditadura militar (1976-1983) por crimes cometidos durante seu governo. Das nove pessoas julgadas, cinco foram condenadas, incluindo os ex-presidentes Jorge Rafael Videla e Roberto Eduardo Viola.

Augusto Pinochet, que governou o Chile como ditador entre 1973 e 1990, também enfrentou processos judiciais. Seu regime foi marcado por forte repressão e violações dos direitos humanos. Embora tenha sido detido em Londres em 1998 e processado no Chile, Pinochet nunca cumpriu pena efetiva de prisão.

Gregorio Álvarez foi uma das figuras-chave do autogolpe que instaurou a ditadura militar no Uruguai (1973-1985). Com a mudança na interpretação jurídica anos depois, a Justiça passou a considerar os crimes da ditadura como crimes contra a humanidade. Álvarez foi condenado a 25 anos de prisão em 2009 por 37 homicídios no âmbito da Operação Condor.

Semelhanças e diferenças

Professor de Relações Internacionais da PUCRS, João Jung observa que os países da América do Sul compartilham uma característica comum: entre as décadas de 1960 e 1980, viveram ditaduras e processos de redemocratização de forma simultânea. No entanto, um aspecto distingue o Brasil:

- A Constituição Federal de 1988 mantém prerrogativas aos militares. Isso resulta, em parte, de um lobby militar durante o processo de transição política. Alguns afirmam que nossa redemocratização foi uma transação política, e não uma ruptura com o governo ditatorial, mas sim uma negociação.

Jung ressalta uma diferença no caso de Bolsonaro: sua prisão não está relacionada ao papel dele como militar ou a qualquer participação no período ditatorial, mas sim à tentativa de golpe:

- Ele tentou ativar as Forças Armadas para apoiá-lo no golpe. Assim, temos um militar que foi presidente e foi preso, entre outros motivos, por não ter obtido apoio para o tentado golpe de Estado. _

Prefeitura retoma obra de escola paralisada há 13 anos

A prefeitura de Porto Alegre assinou a ordem de serviço para retomar as obras da escola infantil Moradas da Hípica, paralisadas há 13 anos.

A unidade poderá atender até 224 crianças. O investimento será de mais de R$ 6 milhões, sendo cerca de 80% com recursos próprios e o restante do Fundo Nacional de Educação.

Segundo a Secretaria Municipal de Educação, esta é a primeira de sete escolas com obras interrompidas que serão reiniciadas até 2026. A retomada foi possível após a repactuação dos contratos com o governo federal. _

Entrevista - Ailton Krenak

Líder indígena, escritor e membro da Academia Brasileira de Letras (ABL)

"É um absurdo que estejamos fazendo viagens espaciais e não somos capazes de fazer um diagnóstico dos ecossistemas"

Um dos mais importantes líderes indígenas, ambientalista, escritor e imortal da Academia Brasileira de Letras, Ailton Krenak é voz ativa na defesa do meio ambiente e dos povos originários. No ano passado, ele já havia criticado a realização de eventos como as conferências do clima. Ele falou com a coluna:

? O senhor não foi à COP30?

Não, eu não teria lugar na COP. Desde o ano passado, em novembro, eu fiz a primeira observação sobre a COP, dizendo que eu achava que essa ideia de fazer na Amazônia tinha uma vantagem circunstancial, que era a de pôr as pessoas diante de um dos mais visíveis desastres do modo de ocupação territorial: o desmatamento da floresta amazônica e o aquecimento global, como ocorrências imediatas que qualquer um pode observar andando lá. Mas eu achava que também era uma maneira de explorar o imaginário das pessoas sobre uma região do planeta que não confere com o que as pessoas imaginam. Então, estávamos trabalhando muito mais com uma ideia da floresta do que com a realidade do clima no planeta inteiro. Com uma crítica, não tinha sentido eu ficar me inscrevendo em painéis do clima em Belém, um lugar onde a agenda já estava muito atravessada por outras prioridades.

? Quais os principais assuntos que você acha que deveriam ser abordados em uma COP?

Alguns temas da maior relevância não conseguem a atenção necessária quando se estabelecem as prioridades em eventos tão grandes como a COP30. Os oceanos, por exemplo, são sublimados, como se eles não fizessem parte do complexo do sistema terrestre. E é um absurdo que estejamos fazendo viagens espaciais e não somos capazes ainda de fazer um diagnóstico dos ecossistemas terrestres, inclusive daquilo que nós chamamos de superestrutura do planeta. Os oceanos, assim como as geleiras, foram entendidos só como uma espécie de indicadores. Os oceanos deveriam estar com a mesma paridade que as florestas tropicais no mundo, porque o oceano está em todos os continentes. Se nós temos pontos de não retorno para a floresta e para as geleiras, devemos ter um ponto de não retorno também para a questão dos oceanos. Eu acho que se tivéssemos nos debruçado (na COP30) sobre esses temas, teríamos, sim, conseguido tratar de assuntos muito importantes, além da tal da transição energética.

? Recentemnete o senhor disse que as conferências são "balcões de negócios" e que servem "xícara de café com petróleo". Qual é o melhor formato de eventos como esse?

Em alguns países, antes mesmo da Conferência do Clima, já foram tomadas medidas que são de mitigação de danos, que é de resolver a questão das áreas litorâneas. Na Colômbia, por exemplo, o governo decidiu que não vão mais perfurar petróleo na floresta amazônica. E quando pensamos no que pode ser feito, podemos considerar que pode ser feito tudo. Não tem que esperar a próxima conferência. Por que aqui em governos regionais, por exemplo, as questões que já foram discutidas não se transformam em políticas públicas? Alguém vai falar: "Mas falta vontade dos governos para fazer isso". 

Alguns deles dizem que falta dinheiro. Se eu disse que essas conferências se caracterizam por balcão de negócio, o que mais aconteceu lá foram negócios. E sobre a xícara de petróleo no café da manhã, por um tempo ainda vai ser isso mesmo. Vai ter petróleo. Inclusive, porque não dá para saltar daqui para um outro lugar sem um mapa do caminho. _

INFORME ESPECIAL

quinta-feira, 27 de novembro de 2025

27 de Novembro de 2025
CARPINEJAR

"Ne nuntium necare", governador!

O diretor-presidente da Fundação Theatro São Pedro, Antonio Hohlfeldt, desafiou o governo: decidiu suspender a assinatura dos contratos do Multipalco para espetáculos da temporada de 2026 por limitação do quadro funcional, cuja demanda triplicou com a implementação dos novos espaços, sem aumento proporcional do número de servidores (que remonta a 2014).

O estopim da crise cultural teria sido o fato de o governo ter encaminhado uma série de projetos para análise da Assembleia e deixado de fora a ampliação estrutural da fundação. Dois anos de reivindicações entraram no vácuo.

O governador Eduardo Leite, em vez de resolver o problema, que afeta o funcionamento do santuário teatral do Rio Grande do Sul, penalizou o mensageiro e demitiu Hohlfeldt.

Hohlfeldt não era um CC qualquer: escreveu a biografia da lendária Eva Sopher, tornou-se seu sucessor natural, e estava no comando da instituição havia sete anos. Foi vice-governador, professor da PUCRS, patrono da Feira do Livro e um dos teóricos mais longevos da nossa ribalta. Não tem como questionar a sua trajetória nem os méritos da sua batuta firme e indefectível.

Pior seria se fosse conivente, e abandonasse a deus-dará os dois teatros recém-estreados, o Olga Reverbel e o Simões Lopes Neto, sacrificando aqueles que pagam ingresso. Logo o esforço de décadas para levantar fundos seria pulverizado em reclamações no Procon.

O que me causa espanto é que a dispensa sumária, essa punição pela liberdade de opinião e autonomia do órgão, não condiz com a postura pública adotada por Leite, priorizando o diálogo contra a polarização e o extremismo, apresentando-se como uma terceira via presidencial mais ponderada. Lembro-me de sua entrevista para a CNN: "Algumas pessoas identificam em mim, por exemplo, alguém muito conciliador, que busca não se contrapor aqui ou ali".

Não há sentido no que parece uma retaliação justamente de quem promove a coexistência de diferentes pontos de vista e a racionalização dos processos democráticos. Não era o caso de se sentar à mesa e procurar uma solução conjunta? Precisava chegar a esse desfecho?

Mexeu num vespeiro, porque o São Pedro é uma embaixada da arte. Os principais atores e atrizes nacionais disputam a locação do palco. Uma temporada lá é sinônimo de credibilidade e de êxito. Dificilmente a casa fica vazia; conta com espectadores fiéis e constantes. A atitude soará como truculência intempestiva para a classe artística.

Hohlfeldt estava tão somente defendendo a cultura e o padrão de excelência de nosso glorioso cartão de visita ao turismo. Não se mostrava preocupado com seu cargo. Seu protesto sequer significava greve - todos continuariam trabalhando -, mas responsabilidade, reconhecendo a insuficiência de recursos humanos para seguir com os espetáculos em cartaz. Não dava para estabelecer contratos sem a garantia de que a equipe estaria apta a cumprir as exigências das produções teatrais. Multas ocasionadas por possíveis atrasos e cancelamentos endividariam o Complexo Multipalco. Só quem é da área entende essas minúcias que podem levar à falência até um lugar tradicional.

O desabafo de que não existiam condições de manter a normalidade - ou fingi-la com um plantel defasado de profissionais, sem iluminador ou mesmo um encarregado de abrir as cortinas - representava mais uma virtude de transparência do que um defeito de insubordinação. Não se tratava, em nenhum momento, de vaidade, mas de verdade.

Demoro a crer que Eduardo Leite, que costuma cantar músicas em solenidades, que sustenta um perfil culto e refinado, seja capaz de silenciar uma voz de crítica construtiva. Consiste em perder a valiosa chance de crescer com o contraponto e justificar as suas palavras tão bonitas sobre pluralidade. Afinal, o complexo foi inaugurado na sua gestão. É também obra do seu apoio. Alardear a grandeza do Theatro São Pedro é do seu mais profundo interesse. _

CARPINEJAR


27 de Novembro de 2025
NOTÍCIAS - Fábio Schaffner

Bolsonaro precisará de seis anos e sete meses para progredir ao semiaberto

Trama golpista

Condenado por cinco crimes, ex-presidente só poderá deixar o regime fechado em 2032. Defesa ainda tem expectativa de obter a prisão domiciliar devido à sua condição de saúde. Outras alternativas, como aprovação de anistia pelo Congresso e indulto presidencial, são consideradas improváveis.

Preso desde sábado, o ex-presidente Jair Bolsonaro só terá direito a ir para casa em 26 de junho de 2032. Esse é o prazo determinado pela legislação penal para Bolsonaro progredir para o regime semiaberto, no qual passaria o dia em liberdade, sendo obrigado a pernoitar no cárcere.

O cálculo leva em consideração a pena de 27 anos e três meses imposta ao ex-presidente no julgamento da trama golpista. No total, o tempo mínimo de prisão seria de seis anos, sete meses e um dia.

Bolsonaro foi condenado por golpe de Estado, tentativa de abolição do Estado democrático, organização criminosa, dano qualificado e deterioração de patrimônio tombado.

Por ironia, não só os dois primeiros crimes foram tipificados durante seu governo, como foi também em sua gestão que o tempo mínimo de cadeia para progressão de regime foi aumentado. Em dezembro de 2019, entrou em vigor o pacote anticrime, exigindo 25% de cumprimento da pena para obtenção do benefício no caso de crimes violentos. Até então, a regra geral era de um sexto da pena (16%). Bolsonaro ainda poderá atenuar o tempo de prisão trabalhando, estudando ou lendo.

Motivação humanitária

Na sexta-feira, véspera da ordem de prisão preventiva, a defesa de Bolsonaro havia pedido ao Supremo Tribunal Federal (STF) o cumprimento da pena em regime domiciliar. Com 70 anos e ainda padecendo de sequelas do atentado a faca em 2018, Bolsonaro sofre crises de soluço e refluxo, com sucessivas internações hospitalares.

- No momento, Bolsonaro está preso por duas decisões: o cumprimento da pena no processo do golpe e a preventiva decretada por violação da tornozeleira. Moraes foi estratégico. Ordenou que ele ficasse na Superintendência da Polícia Federal, com atendimento médico 24 horas, coisa que nenhum outro preso no Brasil tem. Essa situação torna improvável uma prisão domiciliar tão cedo, a não ser em caso de uma hospitalização grave - comenta Cezar Lima, professor de Direito Penal na Ulbra.

Em tese, uma eventual saída da cadeia só poderia se dar em outros dois cenários: aprovação de anistia pelo Congresso ou indulto presidencial. As duas alternativas enfrentam obstáculos políticos e jurídicos.

A anistia perdeu tração progressivamente no Congresso, sobretudo após a violação da tornozeleira. Ainda assim, a Primeira Turma do STF, que condenou Bolsonaro, deixou claro durante o julgamento que uma aprovação da medida seria inconstitucional e anulada pela Corte. Atualmente, dos 11 ministros do tribunal, apenas três seriam simpáticos à ideia: Luiz Fux, André Mendonça e Nunes Marques.

Outra possibilidade seria a concessão de um indulto. Por fortes divergências ideológicas e em razão da gravidade dos crimes pelos quais Bolsonaro foi condenado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva sinaliza que jamais lhe concederia um indulto.

Alguns aliados de Bolsonaro, porém, já manifestaram essa intenção caso vençam a eleição presidencial de 2026. O futuro presidente, aliás, indicará três ministros para o STF, podendo alterar a correlação de forças na Corte. _

A dosimetria das penas

Entenda por que Bolsonaro só terá direito a ir para casa em 26 de junho de 2032.

Organização criminosa armada

Pena: 7 anos e 7 meses

Tempo para progressão: 25% (1 ano, 10 meses e 22 dias em regime fechado)

Tentativa de abolição violenta do Estado Democrático de direito

Pena: 6 anos e 6 meses

Tempo para progressão: 25% (1 ano, 7 meses e 15 dias)

Deterioração de patrimônio tombado

Pena: 2 anos e 6 meses

Tempo para progressão: 16% (4 meses e 24 dias)

Golpe de Estado

Pena: 8 anos e 2 meses

Tempo para progressão: 25% (2 anos e 15 dias)

Dano qualificado pela violência e grave ameaça

Pena: 2 anos e 6 meses

Tempo para progressão: 25% (7 meses e 15 dias)

Total de tempo para progressão de regime:

6 anos, 7 meses e 1 dia

Augusto Heleno alega ter Alzheimer desde 2018

Tarcísio: direita vai se organizar

Na primeira manifestação após a prisão de Bolsonaro, o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, disse que a direita "vai se organizar" para a eleição de 2026.

- Esse projeto vai ser vencedor ano que vem. Não tenha dúvida, nós vamos livrar o Brasil do PT - disse, durante um fórum promovido pelo Union Bank of Switzerland.

Sem descartar a possibilidade de concorrer, Tarcísio afirmou que a candidatura deve ser definida até março:

- Não tenham ansiedade, porque vai ter a hora certa.

"Lição de democracia ao mundo", afirma Lula

O presidente Luiz Inácio Lula da Silva disse ontem que a conclusão do processo da trama golpista e o início do cumprimento da pena dos condenados é "uma lição de democracia ao mundo".

- Sem nenhum alarde, a Justiça brasileira mostrou a sua força. Não se amedrontou com as ameaças de fora e fez um julgamento primoroso - declarou Lula, durante a cerimônia na qual sancionou a lei que isenta de Imposto de Renda quem recebe até R$ 5 mil (leia mais na página 4).

Lula afirmou ainda que, ao condenar os envolvidos com uma tentativa de golpe de Estado, o país demonstrou "que está maduro para exercer a democracia na sua mais alta plenitude":

- Pela primeira vez na história do país você tem alguém preso por tentativa de golpe. Você tem um ex-presidente da República e você tem quatro generais de quatro estrelas presos, em uma demonstração de que a democracia vale para todos. Democracia não é privilégio de ninguém. _


27 de Novembro de 2025
GPS DA ECONOMIA - Marta Sfredo

Uma "era de ouro" entre Brasil e EUA?

Não é novidade que o clima mudou entre Brasil e Estados Unidos. Mesmo que tenha ocorrido uma redução de tarifa de alimentos sem exigência de contrapartida, houve surpresa com uma declaração otimista do cônsul-geral dos EUA no país, Kevin Murakami, feita na noite de terça-feira em evento que reuniu governo e empresários brasileiros e americanos na capital paulista:

- Estou em São Paulo com uma tarefa primordial: apoiar o objetivo da administração Trump de inaugurar uma era de ouro entre os Estados Unidos e o Brasil.

Alguns presentes se entreolharam. Mas Murakami deixou claro que não estava fora da realidade, ao constatar:

- Ainda temos muitas diferenças bilaterais a resolver.

Com a maior parte dos produtos que mais exporta aos americanos ainda submetida a alíquotas entre 25% (setoriais) e 50%, o setor exportador gaúcho parece poder contar com esperança baseada, ao menos, em declarações.

De "ponto crítico" a "alívio tarifário"

Murakami reconheceu que sua chegada ao Brasil, há dois meses, ocorreu em "ponto crítico" das relações bilaterais, mas ofereceu um incentivo:

- Todos devem se sentir encorajados pelo fato de que nossos presidentes já se reuniram, as negociações já estão começando, e os EUA já ofereceram algum alívio tarifário.

É claro que isso significa que o Brasil tem algo que interessa à atual gestão da Casa Branca. Nas palavras do cônsul-geral, seriam investimentos brasileiros. Aportes na economia americana - como os US$ 1,3 trilhão da União Europeia - têm sido moeda de troca nas negociações tarifárias.

- Gostaria, em nome de todo o governo americano, de fazer uma chamada à ação: que as empresas brasileiras aumentem seus investimentos nos Estados Unidos.

O pedido dá ainda mais consistência ao aceno inesperado de um representante dos EUA no Brasil. O país continua sem embaixador. Mas esse discurso, de fato, dá um sinal de que o lado americano está interessado na reaproximação. _

Depois de uma série de quedas, a bolsa voltou a registrar recorde nominal ontem. A alta de 1,7% levou o Ibovespa a 158,5 mil pontos. O dólar caiu 0,77%, para R$ 5,335. O ânimo vem de perspectiva de baixa no juro, aqui e nos EUA.

Brasil perde dólares no balanço cambial

O déficit em transações correntes, uma espécie de balanço da entrada e saída de dólares no Brasil, vem se aprofundando. É normal que o resultado líquido seja negativo, mais acentuado em períodos de apreciação do real, como o atual.

Mas nos 12 meses acumulados até outubro, o gasto superou a receita em US$ 76,6 bilhões, com dois déficits mensais superiores a US$ 10 bilhões no período e outros dois perto desse nível.

Déficits tão profundos são incomuns na série histórica. Surgiram em fevereiro deste ano e dezembro de 2024 - marcado pela combinação da reação negativa ao pacote de corte de gastos e remessa de lucros por multinacionais. Antes, volume similar só aparece em janeiro de 2020, nos primeiros sinais da pandemia de covid-19.

Parte desse déficit é atribuída ao desempenho mais forte da economia e ao real valorizado, o que significa que ter resultado negativo nessa conta não é ruim. Outra é mais estrutural, advertiu o economista-chefe do banco Itaú, Mário Mesquita:

- Os brasileiros estão gastando mais em serviços como streaming (caso de Netflix e HBO) e cloud ("nuvens" de dados como o Cloudfare, que teve problema recente). _

Às vezes, dá um estremecimento momentâneo por disputa, expectativa frustrada, o que é natural. Mas tenho confiança de que isso passa.

Fernando Haddad - Ministro da Fazenda e o orçamento?

Uma das missões do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, é recuperar alguma interlocução com o Congresso. O governo Lula precisa aprovar o orçamento de 2026 até o final deste ano. E, antes, ainda necessita de apoio para recompor parte da receita prevista nas contas do próximo ano. Em tese, a peça orçamentária de 2026 precisa prever superávit primário, ou seja, receitas maiores do que despesas. Até agora, isso não está garantido.

Startup gaúcha de saúde ganha aceleração

O programa Mulheres Inovadoras, da Financiadora de Estudos e Projetos (Finep) em parceria com o Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, tem representante gaúcha. A startup Núcleo Vitro, de Porto Alegre, participa de mentorias e treinamentos e pode receber prêmio de até R$ 100 mil como parte do projeto de aceleração nacional, que termina amanhã.

A empresa é focada em testes laboratoriais de segurança e eficácia de produtos de saúde em pele artificial, sem recorrer a animais, em método conhecido como in vitro. Em seis anos de operação, a Núcleo Vitro fez avaliação de cerca de 2,4 mil produtos, atendendo cerca de 240 empresas no Brasil e outros 11 países. 

Um fórum otimista

Conhecido por debater em tom crítico e provocador, o Fórum da Liberdade terá uma dose de otimismo na sua próxima edição: "O Brasil tem jeito". Organizado pelo Instituto de Estudos Empresariais (IEE), é realizado desde 1988 em Porto Alegre e, em 2026, será em 9 e 10 de abril, na PUCRS. _

GPS DA ECONOMIA


27 DE NOVEMBRO DE 2025
INFORME ESPECIAL - Vitor Netto

STM deve julgar as perdas de patentes só em 2026

Os julgamentos sobre as perdas de patentes dos militares condenados na terça-feira devem ocorrer apenas em 2026. A informação é do Superior Tribunal Militar (STM), órgão responsável pelos casos, que afirma que os processos ocorrerão "muito provavelmente" no próximo ano, devido ao recesso do Judiciário, que começa em 19 de dezembro.

O rito não é simples: o processo que pode resultar na perda de patente é chamado de Representação por Indignidade ou Incompatibilidade para o Oficialato, e a competência para o julgamento é exclusiva da Justiça Militar. No entanto, para que esse trâmite seja iniciado, é necessária uma representação do Ministério Público Militar (MPM).

Em trecho de nota divulgada na terça-feira pelo STM, consta: "Desta forma, o oficial condenado poderá ser submetido a esse procedimento no STM, desde que haja representação do MPM. Cabe à Corte Militar decidir apenas sobre a idoneidade e dignidade do oficial, sem reavaliar o mérito da condenação já proferida, o que pode resultar na perda do posto e da patente de oficiais militares, da ativa ou não".

Entre os militares que serão julgados, de acordo com determinação do ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes, estão o ex-presidente Jair Bolsonaro, capitão reformado do Exército; Walter Braga Netto, Augusto Heleno e Paulo Sérgio Nogueira, generais; e Almir Garnier, almirante da reserva.

O processo

O STM é composto por 15 ministros - sendo 10 militares (quatro do Exército, três da Marinha e três da Aeronáutica) e cinco civis -, que decidirão em plenário sobre a manutenção ou perda do oficialato. Desses, 14 votam; a presidente, Maria Elizabeth Rocha, vota apenas em empate.

Vale ressaltar que cada condenado será julgado em ação separada, com relatores diferentes, ou seja, não se trata de um ato conjunto. O STM ainda ressalta que não é possível estabelecer um prazo específico para o julgamento.

"Trata-se de medida de relevância para a carreira militar, destinada a proteger a honra, a disciplina e a hierarquia das Forças Armadas, assegurando, em equilíbrio, a dignidade da farda e os direitos fundamentais dos militares", diz um trecho da nota.

Após o processo, se a decisão for pela perda da patente, caberá ao Exército, Aeronáutica ou Marinha cumprir o ato. _

Poucos apoiadores de Bolsonaro na PF

A chuva que atinge a capital federal nos últimos dias tem esvaziado as manifestações em frente à sede da Polícia Federal, em Brasília, onde o ex-presidente Jair Bolsonaro está preso.

No domingo, sob forte chuva, uma dezena de apoiadores utilizava bandeiras do Brasil e faixas com os dizeres "Anistia Já! Buzine". Na terça-feira, o grupo já havia sido reduzido para oito.

Ontem, durante a manhã, não houve manifestantes. À tarde, quando a chuva parou, seis apareceram no local. 

Colaborou Kelly Matos

Nicolás Maduro ergue espada em discurso contra os EUA

Com uma espada em punho, o presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, fez críticas às investidas dos Estados Unidos contra seu país. O ato ocorreu na terça-feira em evento do bicentenário da entrega da espada do Peru, que teria sido usada por Simón Bolívar nas lutas contra a coroa espanhola pela independência das Américas.

Segundo o presidente, o país enfrenta há 17 semanas um período de "agressão imperialista, guerra psicológica".

Desde setembro, as forças militares dos EUA vêm realizando manobras e ataques a embarcações suspeitas de tráfico de drogas no Caribe.

Na segunda-feira, o governo americano incluiu o Cartel de Solis - que supostamente seria chefiado por Maduro - na lista de Organizações Terroristas Estrangeiras (FTO). _

Primeira viagem internacional

O papa Leão XIV inicia hoje uma viagem internacional de seis dias, a primeira ao exterior desde o início de seu pontificado. O Pontífice visitará a Turquia e o Líbano, retornando ao Vaticano após 2 de dezembro.

A viagem cumpre promessas feitas pelo papa Francisco, que havia planejado visitar o Líbano em 2022 e a Turquia em 2025 - ambas adiadas por motivos de saúde.

Na Turquia, Leão XIV participará das comemorações dos 1,7 mil anos do Concílio de Niceia, na cidade de Iznik. No Líbano, deve ter encontros com comunidades afetadas pela crise econômica e social, além de rezar no local onde ocorreu a explosão do porto de Beirute, em 2020. _

Livro retrata os 80 anos de história

Em celebração às oito décadas de história, completadas em agosto deste ano, a Federação do Comércio de Bens e Serviços do Estado do RS (Fecomércio-RS) lança hoje, durante confraternização de fim de ano, um livro que resgata os principais marcos da trajetória da entidade. Intitulada Fecomércio-RS - 80 Anos: A Força do Setor Terciário, a obra foi escrita pela jornalista Suzana Naiditch.

A proposta é de que o livro seja distribuído para autoridades, sindicatos, parceiros e lideranças do setor, que envolve comércio de bens, serviços e turismo. 

INFORME ESPECIAL

quarta-feira, 26 de novembro de 2025

Transidade

Um japonês, Jackie, adotou a transidade. Ou seja, ele tem 39 anos e se sente com 28. Não se identifica com sua geração. Acredita que seu corpo possui a força, o ânimo e o fôlego de uma década atrás.

Não prevejo qual idade ele comemorará de verdade em 2026: 40 anos ou a repetição do quase 30. Vai sonegando velinhas no bolo. É um caso estranho, meio retrô, porque surge num período em que finalmente prevalece a sinceridade etária.

Era comum mentir a idade. Avançamos contra o etarismo. Desponta o orgulho de ostentar a data de nascimento com festas para faixas acima dos 60. Enfraqueceu a loucura de ansiar pela poção da juventude eterna, como quem procura desenterrar o Santo Graal. A saúde é o principal objetivo na longevidade.

De modo geral, as pessoas passaram a enaltecer suas experiências. O fato de ter vivido muito. De ter viajado. De ter casamentos e relacionamentos anteriores. Acabou aquela história de carro zero, de fingir ineditismo, de enganar e dissimular estreias. As dores são nossas conselheiras. Os erros são nossos fiadores de sabedoria.

Jackie teve o insight no momento em que seu chefe o repreendeu por demonstrar desconhecimento de uma tarefa elementar do serviço. Não condizia com sua bagagem quarentona.

A ausência de referenciais de maturidade embaralha os movimentos geracionais e embota o discernimento da cadeia evolutiva. Não existem mais os marcos de adultização como antes: aprender a dirigir, a cozinhar, a morar sozinho, a controlar o dinheiro, a lavar as roupas.

Pode-se apresentar uma aptidão ou outra; nada mais se mostra imprescindível. As crianças são capazes de se desenvolver sem amarrar cadarços, sem mexer no fogão (só utilizando o micro-ondas), sem nadar, sem andar de bicicleta. Os passos de emancipação não são claros e não cumprem expectativas sociais.

Há gente com 30 anos que permanece residindo com os pais, sustentada à base de mesada, num isolamento propiciado pelas redes sociais. Jamais experimentou a independência. Jamais pensou em declarar Imposto de Renda.

Venho de costumes diferentes. Fui analógico. Comecei a trabalhar cedo, ainda adolescente. Celebrei os primeiros fios de meu bigode ao deixar de ser imberbe. Meu sonho consistia em sair de casa, datilografar com todos os dedos, formar família e alcançar a casa própria. Crescer significava ser responsável a partir da disciplina e das obrigações diárias.

Talvez por isso eu não mascare a minha antiguidade. Pretendo durar longamente, saboreando fases e estações, mas nunca me perdendo em obsessão saudosista, nem querendo estacionar em alguma época dourada, achando que o melhor já aconteceu.

Eu tenho exatamente 53 anos. Não trocaria um dia de minha existência atribulada. Cada ruga, cada vinco, cada pé de galinha em meu rosto me pertence e me explica. São cicatrizes das alegrias.

Tanto que, quando alguém tenta adivinhar minha idade, sempre acerta: - Você parece que tem 50 anos.

Não me desagrada. Estou conservado dentro do meu tempo.

CARPINEJAR 

 

26 de Novembro de 2025
MÁRIO CORSO

Temporalidade anacrônica

É preciso viver com consciência o tempo presente. Se você não vive a pleno um dado momento, ele poderá ficar pendente e, posteriormente, surgir em qualquer hora do futuro.

Imagine estar em uma manhã de terça-feira, precisando concentrar-se, e pinta um sextou. Como dizer para o chefe que não é sua culpa. Que estava na melhor boa vontade quando, do nada, caiu uma tardinha de sexta-feira no teu colo. Desconcerta ficar colorido num dia cinzento.

Não há produtividade que resista a pendências fortuitas. Semana passada, quarta-feira de tarde, estava trabalhando e tropecei num sábado. Baixou uma preguiça imensa, daquelas de deitar em rede. Trabalhei o resto do dia feito um caminhão movido a pedal.

Vocês podem pensar que é conversa de preguiçoso, que nada, os desajustes de temporalidade anacrônica acontecem em qualquer direção. Exemplo: está um domingo de sol lá fora, mas a cabeça não para de fazer a lista de tarefas da semana. O vivente quer relaxar, mas o espírito da segunda-feira já o amarrou com uma gravata no pescoço.

Sabe aquela ânsia que se sente, de que algo teria que ser feito, mas não sabe o quê? Trata-se de um Eco de Prazo. A tarefa já foi entregue, mas era tão premente, tão urgente, que uns grãos de prazo derramaram e colaram na sola do sapato.

Vocês já notaram como as férias grudam? Elas terminam e a impregnação segue por dias, é um jet lag existencial. O saldo de férias sai no tapa com a rotina e nós, no meio, apanhamos dos dois.

Ano passado, minha amiga Maiara achou um Natal em pleno abril. Foi estranho, deu presentes para todos e não ganhou nenhum. Por sua alegria aparentemente inexplicável, ganhou fama de bipolar.

O que mais as pessoas se queixam é da refeição fantasma. Aquele momento que não era para estar com fome, mas uma gula ancestral arrasta o sujeito para a geladeira. É o que dá declinar sobremesa para parecer educado.

Temos que aprender a conviver com esses soluços temporais. A vida é uma trama descosturada, um aglomerado de tempos embaralhados que se infiltram onde bem entendem. Como nossa alma está convencida de que o calendário é só uma sugestão, não se cobre tanto quando cacos de domingo iluminarem tua semana. _

MÁRIO CORSO

Em busca de lealdade, Lula colhe pauta-bomba

A indicação do advogado-geral da União, Jorge Messias, para uma vaga no Supremo Tribunal Federal (STF), voltou a acionar o modo crise institucional no Brasil. Contrariado com o fato de seu favorito, o antecessor Rodrigo Pacheco, ter sido preterido, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP) pautou uma "pauta- bomba": aposentadoria diferenciada para agentes comunitários de saúde e de combate a endemias.

Segundo estimativa do Ministério da Previdência, o impacto fica perto de R$ 40 bilhões em 10 anos. Para entrar em vigor, precisa passar pela Câmara, onde não terá a boa vontade de seu presidente, Hugo Motta (Republicanos-PB), que rompeu relações com o deputado Lindbergh Farias, líder do PT na Casa, replicando a ruptura "pessoal e institucional" de Alcolumbre com o líder do governo no Senado, Jaques Wagner.

Perseguida ao custo de muita exceção e muita calibragem, a meta fiscal já está por um fio. Novos gastos extras significam implosão das contas públicas. O secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Dario Durigan, apelou, literalmente, afirmando que o projeto tem "impacto muito grande aos cofres públicos".

STF não pode ter só salvo-condutos

Faltam só 35 dias para 2025 acabar, o orçamento da União de 2026 ainda não foi aprovado pelo Congresso. Até agora, a proposta segue esburacada, já que a reconstituição das receitas previstas não foi concluída.

Para não deixar dúvidas, a decisão de Alcolumbre foi tomada no mesmo dia em que Luiz Inácio Lula da Silva, oficializou seu candidato ao STF. Em busca de lealdade, o presidente assumiu o risco de colher reações, mesmo as pouco institucionais, como pautas-bomba. Até agora, não se sabe se seu indicado terá o número de votos suficientes no Senado para ser aprovado ao cargo.

Lula já tem, na Corte Suprema, um ex-advogado e um ex-ministro. Agora, quer levar o personagem que, no governo Dilma, seria o portador de um salvo-conduto a Lula, então ameaçado de prisão. Não é diferente do que fez seu antecessor, ao escolher dois fiéis seguidores. Mas a essa altura, o Brasil precisa mais do que salvo-condutos no STF. _

Nem pauta-bomba contra Lula, nem prisão de Bolsonaro. O que fez preço ontem no mercado foi a percepção de que há mais chances para corte de juro - nos EUA - na reunião de dezembro. O dólar recuou mais 0,35%, para R$ 5,376.

Seis dos 10 produtos mais exportados do RS para EUA mantêm tarifa de 50%

Seis dos 10 principais bens exportados para o mercado americano ainda têm tarifaço de 50% (veja lista acima), entre os quais um é do segmento de alumínio, que teve taxa setorial de 50% aplicada em junho, e cinco pagam imposto de importação que resulta da soma de tarifa "recíproca" (10%) mais "punitiva" (40%, no caso do Brasil).

Outros três dos 10 também estão sujeitos a alíquotas setoriais, mas entre 10% e 25%. O único isento é a pasta química de madeira usada como matéria- prima para celulose, que já estava zerada desde setembro.

O levantamento é da Unidade de Estudos Econômicos da Fiergs. Os 10 principais produtos exportados do RS para os EUA somaram US$ 907,1 milhões em vendas ao mercado americano em 2024, praticamente metade do total enviado pelo Estado para lá no ano passado. _

alíquotas %

Tabaco tipo virginia 50

Pasta de celulose 0

Espingardas e carabinas 50

Transformadores 50

Madeira de pinheiro 10*

Tabaco tipo burley 50

Calçados 50

Produtos de alumínio 50*

Peças para veículos 25*

Cilindros e cabeçotes 25*

(*) tarifa setorial

Bolsonaro vai cumprir pena pelo que fez

Em texto publicado na segunda- feira, a coluna apontava que um dos mistérios sobre a violação da tornozeleira pelo ex-presidente Jair Bolsonaro era o momento: poucos dias antes da condenação a 27 anos e três meses de prisão chegar ao trânsito em julgado, ou seja, com cumprimento da sentença, sobre a qual predominava a expectativa de uma prisão domiciliar. Ainda assim, a rapidez surpreendeu. O ritmo, não o desfecho. Bolsonaro não vai cumprir pena por perseguição, "ditadura do Judiciário" ou qualquer outra desculpa que seus agora já mais escassos seguidores inventem. Foi condenado pelo mesmo motivo que deveriam ser dadas todas as sentenças: por consequência de seus atos.

O mesmo ocorre com militares de alta patente e ex-ministros de seu governo, pelo mesmo motivo: todos os cidadãos precisam saber que seus atos têm consequências. No país do "não vai dar nada", é a melhor lição possível. Simples assim, como todos os pais deveriam ensinar a seus filhos: é preciso se responsabilizar por suas escolhas.

Os deliberados e conscientes atentados de Bolsonaro às leis do país - essas que todos os cidadãos devem seguir - foram reiterados em praça pública. O ex-presidente confessou ter "buscado alternativas". A quê? À posse de seu adversário eleito de forma democrática - por mais que não agrade a muitos.

A lei prevê que, se um presidente não faz bom trabalho, será cobrado na próxima eleição. Se cometer erros graves, pode ser alvo de impeachment. Mas não existe "alternativa constitucional" para impedir sua posse.

Como o Brasil tem reviravoltas que seriam consideradas inverossímeis em obras de ficção, não se sabe qual será o futuro dessa pena. A condenação de um ex-presidente e de militares de alta patente por tentativa de golpe - única circunstância em que pode haver punição - já havia sido histórica. O fato de já estar sendo cumprida não deveria ser surpresa. E no entanto, ainda é. _

Itaú prevê saída de dólares quase no dobro da habitual

Economista-chefe do Itaú, Mario Mesquita, previu que a usual saída de dólares do Brasil no final do ano, por remessas de lucros a matrizes de multinacionais que operam no país, pode mais do que duplicar em dezembro, de 1,8% do passivo externo líquido (média histórica) para até 4%. Alertou:

- Pode ter mais remessa neste ano, antecipando que no próximo ano pagarão imposto sobre dividendos, que neste ano não pagam. Houve algo semelhante em 2021, quando foi aprovada tributação de dividendos na Câmara. Depois, não passou no Senado, mas houve saída de 4%, não dos habituais 1,8%. Se o mesmo ocorrer agora, pode haver saída de US$ 25 bilhões a US$ 35 bilhões. Não é algo inadministrável, mas suscitaria reação por parte do BC.

O economista reforçou que a queda do dólar neste ano ocorreu por desvalorização da moeda americana em relação a quase todas as denominações.

Na questão que divide os economistas no Brasil - se o BC vai começar a cortar o juro em janeiro ou março -, Mesquita tem uma interpretação de quem conhece os mecanismos do Comitê de Política Monetária (Copom) por ter sido diretor do BC:

- O Copom de janeiro vai ser decidido em dezembro.

Explicou que, se quiser reduzir a Selic em janeiro, o Copom terá de tirar duas expressões do comunicado de 10 de dezembro: a que afirma ser preciso sustentar taxa contracionista por "período bastante prolongado" e a que sustenta que "não hesitará em elevar" o juro atual. Se essas expressões seguirem em dezembro, prevê, não deve haver corte em janeiro. _

GPS DA ECONOMIA



26 de Novembro de 2025
INFORME ESPECIAL - Rodrigo Lopes

Votando errado?

Certa vez, com algum assombro, reuni em uma coluna todos os presidentes ou ex-presidentes do Peru presos por corrupção ou outros crimes. A lista era tão extensa que parecia aquelas novelas latino-americanas, em que sempre surge mais um personagem no capítulo seguinte.

O mais notório deles, Alberto Fujimori, morreu em 2024. Mas não precisamos exigir muito da memória. A lista recente é pródiga: Alejandro Toledo, Pedro Pablo Kuczynski, Alan García, Martín Vizcarra, Pedro Castillo. De antemão, peço habeas corpus preventivo. Devo estar esquecendo algum. Neste momento, quatro deles estão na cadeia, com certeza.

A primeira coluna que escrevi sobre esse infortúnio peruano foi lá por 2018. Era notícia, quase uma excentricidade latino-americana.

Mas o mundo gira, a cordilheira dos Andes segue firme, e nós começamos a perceber que o Brasil, infelizmente, não está muito distante dos vizinhos.

Jair Bolsonaro é o quarto ex-presidente brasileiro preso na última década - ao lado de Fernando Collor de Mello, Michel Temer e Lula - e o décimo na história da República.

O colega Rodrigo da Silva, do Estadão, fez o cálculo: o Brasil prende um presidente, atual ou ex, a cada 14 anos (embora seis dos 10 membros dessa lista tenham encarado a prisão em contextos de golpe, estado de sítio ou ditadura).

Aí eu pergunto: prender presidentes significa uma democracia frágil ou, ao contrário, evidencia a robustez das instituições de uma nação?

Há boas respostas para os dois argumentos - eu fico com o segundo.

Mas, salvo exceções, atropelos e erros processuais, há um ponto que não conseguimos varrer para debaixo do tapete: estamos pensando pouco na hora de votar, analisando e cobrando de menos. _

80%

Antes mesmo de a COP30 terminar, os preços de hospedagem em Belém já tinham caído. Na última sexta-feira, uma pesquisa rápida feita pela coluna no aplicativo Booking sobre o valor da diária em um hotel, próximo ao Parque da Cidade, estava R$ 1.319. No mesmo hotel, seis meses atrás, a diária custava R$ 7 mil. A redução foi de 81,2%. O apartamento em que estávamos hospedados, contratado por aplicativo de locação há seis meses, saiu por R$ 2.485 a diária. Na segunda-feira, baixou para R$ 277. A queda foi de 88,8%.

Projeto espanhol inspirado no RS vence prêmio internacional

Um projeto espanhol de recuperação de escolas, inspirado em uma iniciativa da Junior Achievement do Rio Grande do Sul (JARS), venceu o JA Activator Award 2025, uma premiação internacional.

O projeto vencedor, Liderança Comunitária, foi adaptado pela Junior Achievement da Espanha a partir da metodologia criada pela instituição gaúcha. A iniciativa espanhola foi implementada em Valência para ajudar na reconstrução de escolas após as cheias de 2024 na região. _

Entrevista - David Marques

Gerente de programas e projetos do Fórum Brasileiro de Segurança Pública

"As facções estão intensamente presentes na Floresta Amazônica"

A COP30 deu visibilidade para desafios da Floresta Amazônica também na área de defesa e segurança pública. Conforme o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP), facções ligadas ao narcotráfico avançaram na região. David Marques, gerente de programas e projetos do Fórum, que esteve na COP, falou com a coluna:

Cresceu o avanço das facções na região da Floresta Amazônica nos últimos anos?

Infelizmente, cresceu. Temos, aqui no Fórum, um trabalho chamado Amazônia e Segurança Pública, desde 2020. Ao longo de cinco anos, houve o crescimento da presença de organizações criminosas nesse modelo das facções de base prisional na região amazônica. Não é como se não existisse antes, mas há a intensificação dessa presença, principalmente com a chegada das organizações do Sudeste, com destaque para o Comando Vermelho. Anteriormente, havia até uma disputa com o PCC, de São Paulo. Essa virada se intensifica principalmente entre 2016 e 2017, a partir da guerra pelo controle da chamada Rota Caipira, na divisa com o Mato Grosso do Sul. O PCC passa a controlá-la, o que acabou empurrando o Comando Vermelho em direção às regiões Norte e Nordeste.

Como esses grupos se articulam com países produtores de cocaína?

É um diferencial estratégico. Colômbia, Peru e Bolívia são os principais produtores mundiais de cocaína e fazem fronteira com o Brasil. Cresce em importância a chamada Rota dos Solimões, que adentra o Brasil principalmente pelo Amazonas, mas também Acre e Rondônia. Eles se aproveitam de fragilidades de política pública, estatais da região, na qual é mais difícil de policiar por conta da extensão territorial, da floresta, da complexidade da malha hidroviária da região. Essas organizações acabam se aproveitando dessas características geográficas para a presença territorial, principalmente associada ao narcotráfico.

Como eles se conectam com crimes ambientais?

Com participação direta no garimpo ilegal de ouro, que tem afinidade com o circuito da cocaína em compartilhamento de infraestrutura, de pistas de pouso, muitas vezes clandestinas, aeronaves de transporte irregular, postos de abastecimento e assim por diante. Não é que não existisse violência na Amazônia, mas, agora, há sobreposição desses desafios com essa nova camada, representada por facções criminosas, que estão intensamente presentes na região amazônica.

Essa droga fica no Brasil ou vai para outros mercado?

Essas mercadorias são, em parte, consumidas no mercado brasileiro, que é um mercado consumidor muito grande, mas também temos o Brasil como hub logístico, que vai direcionar essa mercadoria para outros continentes, como por exemplo Europa, África e a Ásia. Quando estamos falando especificamente do garimpo legal de ouro, há espaços de sociabilidade associados ao garimpo, que têm uma afinidade com a dinâmica criminal, porque, muitas vezes, são lugares de difícil acesso para as instituições policiais, para a Justiça, para a fiscalização ambiental. 

Acabam sendo ambientes muito interessantes para foragidos da Justiça se esconderem. E aí você acaba tendo, em alguns contextos, como na região do Tapajós, uma atuação de faccionados atuando em posições intermediárias do garimpo, fazendo o varejo da droga, cuidando da administração dos contratos, conflitos, da disciplina, fazendo a segurança de carregamentos. No Mato Grosso, na Terra Indígena Sararé, a situação é um pouco diferente: faccionados atuando no garimpo, investindo em maquinário.

Diversificação de mercado?

Exato, uma diversificação dos ilícitos. E tentando até mesmo, por meio do controle territorial, fazer a extorsão de outros garimpeiros ilegais. No caso do Mato Grosso, isso tem gerado um incremento dos conflitos, o que eleva taxas de homicídio, porque esses outros garimpeiros ilegais têm tentado formar protomilícias para fazer a resistência a essa tentativa de controle do Comando Vermelho. _

INFORME ESPECIAL