sábado, 18 de junho de 2016



18 de junho de 2016 | N° 18559 
ANTONIO PRATA

EmpreÉDENdorismo


Sentados no auditório, de smoking e vestidos Dior, Chanel e Armani, demônios e demônias tamborilam ansiosos nas hastes dos seus tridentes Louboutin. Em instantes, será anunciado o grande laureado da noite: o vencedor do 1° Prêmio Jovem Diabo Empreendedor.

Toca uma musiquinha, o apresentador começa a chamar os finalistas: “Azazyel!”. O diabito entra no palco com uma corridinha marota. “Jovem, fala pra gente, qual a sua invenção e como ela pode infernizar a humanidade, no futuro?”. “Chuveiro elétrico”. “Fala mais!”. “Na embalagem a gente vai prometer pressão e temperatura, mas é mentira, ou a pessoa vai tomar banho frio com muita água ou pelando só com um filetinho ridículo. Sem falar que de vez em quando o chuveiro vai pegar fogo ou eletrocutar algum cristão”. Palmas.

O apresentador chama o segundo candidato. “Com vocês, Belial!”. Belial também entra correndinho e para diante do microfone. “Que que cê manda, querido?!”. “Celular”. “Conta pra gente!”. “É um telefone que vai no bolso, tá? As pessoas vão poder ser encontradas a qualquer hora, em qualquer lugar. Mas o pior é que vai ter internet. Quando elas estiverem bem velhinhas, vão pensar: que que eu fiz da vida? Vi foto de gato no Instagram, reclamei do técnico no Twitter e briguei nos comentários de desconhecidos no FB”. Muitas palmas.

“Maravilha, que talento essa juventude! Agora nosso terceiro concorrente, Arimã!”. Arimã entra tocando as mãos da turma da primeira fila. “E aí, Arimã, que que você criou que pode ser pior que o chuveiro elétrico e o celular?”. “Carro”. “Que que é?”. “É uma máquina pra locomoção que queima combustíveis fósseis. As pessoas vão parar de andar a pé e vão ficar gordas. Mais de 1 milhão vão morrer todos os anos em acidentes e a fumaça vai zoar geral o clima. Sem falar na qualidade das rádios FM. Quem não morrer no trânsito nem no efeito estufa vai cortar os pulsos ouvindo Phil Collins”. Aplausos muito, muito empolgados.

“Agora, o último concorrente da noite! Pazuzu! Que que você traz pra gente, Pazuzu?!”. “Bala toffee”. “Bala toffee?”. “Isso. É uma bala de caramelo deliciosa. Ninguém resiste. Mas no que neguinho morde, ela gruda no dente, lá atrás. A pessoa passa horas e horas tentando desgrudar com a língua, mas é um caramelo de açúcar e argamassa que não solta nem derrete, e a língua começa a formigar e a mandíbula a doer e vai bater um arrependimento, porque a pessoa sabe que não pode morder bala toffee, mas ela morde mesmo assim, e vai se achar burra e vai questionar outras atitudes na vida dela, como a profissão e o casamento e as amizades e a opção sexual e o time e as escolhas políticas, e quem não ficar louco depois de 12 horas com bala toffee no dente vai ficar pelo menos com cárie e vai ter que fazer tratamento de canal”. Aplausos ensandecidos.

“Que beleza!”. O apresentador pega um envelope, “Vamos ver, vamos ver quem que a academia escolheu, foi o... Pazuzu! Bala toffee! Palmas pro Pazuzu, que vai levar o audiobook Da queda à maçã: lições de empreÉDENdorismo, coaching grátis com o autor, o Belzebu em pessoa, além de 1 milhão de cruzados pra bombar a sua startup!”. (A moeda do inferno sempre foi o cruzado, com a inflação brasileira de 1989). “E o resto, tigrada, já de volta pro caldeirão!”.

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