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terça-feira, 14 de junho de 2016
14 de junho de 2016 | N° 18555
DAVID COIMBRA
Procura-se quem não lute
Tem uma coisa que todo político brasileiro faz: ele luta. Pelo menos no discurso. Essa palavra, luta, está sempre bailando na boca dos políticos brasileiros.
Dias atrás, a deputada Jandira Feghali, aquela que tem cara de cartomante, aquela que foi fazer um vídeo de bajulação a Lula e mostrou-o mandando a Justiça enfiar o processo contra ele num dos nove orifícios do corpo humano, pois dias atrás a deputada, ao se defender de uma suspeita de corrupção, disse o seguinte:
– A minha história é de luta.
Era uma justificativa. Isto é: o fato de ela lutar, seja lá contra o que for, concede-lhe atestado de idoneidade. Por quê? Todos os outros também não dizem que lutam? Os políticos que se opõem a Jandira se valem do mesmo discurso. Bolsonaro luta, Caiado luta, luta-se muito no Brasil.
Queria encontrar um político que não lutasse. Esse talvez merecesse meu voto. Porque políticos predispostos para a luta são maus políticos. A política é a arte da convivência de opostos. De “oposto” é que vem “oposição”. A essência da democracia é a existência da oposição, mas oposição não significa sabotagem nem inimizade. Significa contraponto. Significa vigilância.
Jandira, Caiado, Bolsonaro, Wyllys, Rosário, eles são parlamentares. Parlamentares necessariamente têm de parlamentar. Têm de falar. E nunca sozinhos: é preciso dialogar.
Quando você luta, você não dialoga.
Os políticos americanos não são muito melhores do que os brasileiros, mas eles usam uma expressão que me agrada mais do que “luta”. Eles falam, a todo momento, “trabalho duro”.
Talvez seja decorrência da tal ética protestante que os pioneiros trouxeram para cá. Provavelmente é. Seja. O fato é que trabalhar duro é construtivo; lutar é destrutivo.
O conceito de luta espalhou-se pelo país e infiltrou-se nos ossos dos brasileiros. O Brasil se tornou um lugar cheio de inimigos.
Amigos rompem a cada dia por causa de ideias, no Brasil. Mas, se rompem por causa de ideias, não eram amigos. Ideias não são tão importantes; importantes são os sentimentos. Ideias não podem ser mudadas; sentimentos, sim.
Não há, debaixo do sol, entre 7 bilhões de seres humanos vivos, dois que comunguem integralmente as mesmas ideias. Seríamos todos inimigos, então? Estaríamos todos em eterna luta?
Não. Fosse assim, há muito não estaríamos aqui. A civilização é produto da colaboração. Da conversa. Jamais da luta. O que nos diferencia dos animais é, exatamente, a palavra.
É certo que a política brasileira está inoculada de más ideias e péssimos sentimentos. É certo que muita gente vai ter de pagar pelo que fez. É certo que a política brasileira precisa mudar, que o sistema precisa mudar, que o governo e o Estado precisam mudar. Todos precisamos, enfim. Mas não com luta. Com trabalho. Há trabalho duro pela frente.
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