terça-feira, 14 de junho de 2016



14 de junho de 2016 | N° 18555
ARTIGO | DENIS LERRER ROSENFIELD*

O SURREAL

O debate político é frequentemente atravessado por falsas colocações, como se bastasse um mero ato de vontade política para satisfazer uma demanda corporativa salarial ou para atender os ditos “direitos sociais”.

Em qualquer nível da União, Estado ou município, funcionários públicos dos diferentes poderes simplesmente apresentam suas reivindicações como se devessem ser meramente atendidas. Tais demandas se apresentam sob os mais diferentes aspectos: reposição da inflação, aumentos, planos de carreira e assim por diante.

Cria-se, assim, toda uma pressão política de setores muito bem organizados do Estado, que sabem atuar corporativamente junto ao poder público. Ameaçam com greves, paralisações, operações-padrão, retaliações e não atendimento do governo, como se o Tesouro público fosse uma fonte inesgotável, que deveria ser apropriada por esses interesses particulares.

A sociedade assiste a esse espetáculo seja sem poder compreendê-lo, seja com indignação. O desemprego já alcança 11 milhões de pessoas, podendo esse número aumentar rapidamente. Como uma pessoa desempregada percebe esse espetáculo? Não consegue nem imaginar o significado de determinados slogans de esquerda.

A cena torna-se ainda mais surreal quando observamos aumentos salariais e reajustes de quem tem estabilidade no emprego e aposentadoria garantida. Para quem procura penosamente manter o seu emprego, tal percepção dói, e dói fundo.

A pergunta é simples: quem paga a conta?

Os trabalhadores que resistem ao desemprego, as empresas que lutam para não sucumbirem, os empreendedores que têm cada vez mais dificuldades em empreender. Está prevista uma recessão neste ano que seria pior do que a da crise de 1929. Temos uma situação muito dramática que se desenha no horizonte imediato.

O novo governo está tentando botar a casa em dia. As dificuldades e as resistências são enormes. Nada está assegurado se não houver um efetivo apoio social. Neste meio tempo, porém, os atores sociais e políticos lutam por fatias cada vez maiores dos cofres públicos, como se os outros devessem sempre pagar as contas. A irresponsabilidade sindical e corporativa, sobretudo dos setores públicos, é imensa.

Trata-se de uma verdade óbvia. Só não vê quem não quer. Para distribuir, é preciso produzir. Um país que paralisou a sua produção não tem a menor condição de seguir com certas políticas sociais.

O vazio do discurso não encontra nenhum amparo na realidade.

*Professor de Filosofia - O colunista escreve neste espaço às terças-feiras

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