quarta-feira, 1 de junho de 2016


01 de junho de 2016 | N° 18540 
FÁBIO PRIKLADNICKI

O PRINCÍPIO DA COOPERAÇÃO

Das melhores lembranças que guardo da disciplina de Filosofia da Linguagem I, na época da graduação, está o princípio da conversação de Grice. Calma, eu explico – ou pelo menos posso tentar. Herbert Paul Grice (1913 – 1988) foi um importante filósofo inglês da linguagem da segunda metade do século 20, embora tenha enveredado também por outras áreas da filosofia. No célebre texto Lógica e Conversação (1967) – quero dizer, célebre para os especialistas –, Grice se debruça sobre a nossa linguagem do dia a dia. Minha maneira leiga de interpretá-lo é a seguinte: ele queria que entendêssemos melhor o modo como nos comunicamos rotineiramente para que possamos dialogar melhor.

O princípio da cooperação engloba quatro máximas muito fáceis de compreender: quantidade (seja tão informativo quanto requerido pelo interlocutor e não mais do que requerido), qualidade (não diga algo que você acredita ser falso e diga apenas o que você pode embasar com evidência), relação (seja relevante) e modo (seja claro e evite expressões obscuras). Danilo Marcondes explica isso muito bem no livrinho A Pragmática na Filosofia Contemporânea (Zahar), não se assuste com o título.

Vou dar um exemplo. Se um professor pergunta a outro se Fulaninho é um bom aluno de Matemática, e a resposta é “Fulaninho é um ótimo aluno de inglês”, você supõe que o interlocutor está propositalmente rompendo uma máxima da cooperação para lhe dizer, de maneira elegante, que Fulaninho não é bom em matemática. E tudo fica mais fácil.

Tenho uma confissão a fazer: ao primeiro contato, julguei Grice meio exagerado. Afinal, quem conseguiria se expressar direito com tantas regras? Também achei racional demais. Onde está a espontaneidade da relação interpessoal? Mais de 10 anos depois da leitura, no entanto, sinto falta do princípio da cooperação. Acho que todos nós sentimos isso no nosso dia a dia, mesmo que nunca tenhamos ouvido falar de filosofia da linguagem.

Nossas conversas viraram discussões intermináveis. O princípio da cooperação deu lugar ao princípio da acusação, do julgamento e do cinismo. Quem consegue realmente dialogar assim? Quando o horizonte fica turvo, precisamos nos agarrar à sensatez. Coloque um pouco de Grice na sua vida, e eu prometo que coloco na minha também.

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