Aqui voces encontrarão muitas figuras construídas em Fireworks, Flash MX, Swift 3D e outros aplicativos. Encontrarão, também, muitas crônicas de jornais diários, como as do Veríssimo, Martha Medeiros, Paulo Coelho, e de revistas semanais, como as da Veja, Isto É e Época. Espero que ele seja útil a você de alguma maneira, pois esta é uma das razões fundamentais dele existir.
sábado, 9 de fevereiro de 2008
09 de fevereiro de 2008
N° 15505 - Ricardo Silvestrin
Do Oiapoque até aqui
Um p, de pássaro, passeia ao longo do verso: "pousa na palma parada". O p pousa, o p na palma, o p e a palma parados.
Agora, o haicai todo: "Andorinha só / pousa na palma parada - / não é verão ainda." Anibal Beça nos envia essas Folhas da Selva, um ótimo livro com 360 páginas de haicai, lá do Amazonas. Foi publicado numa bonita edição pela editora Valer, de Manaus.
O haicai, poema que é visão, olhar, mas também palavra: "Sol quente na areia - / o caracol sai da casa / pra se acasalar". Sim, para se acasalar, é preciso, paradoxalmente, sair da casa, mesmo que dentro da palavra acasalar tenha a palavra casa.
Daí o ditado: quem casa quer casa. Anibal mostra que para casar é preciso sair primeiro da casa. É preciso sair de si, como o caracol e suas caraminholas. De repente, uma situação inusitada: "Sobe a montanha / com uma pedra na mão / e desce com ela".
A pedra pulando, brincando na mão, volta companheira da árdua viagem. Aliás, de montanha, a pedra entende. Que melhor companhia do que ela? Ou o galo que leva brisa às folhas: "Galo-da-campina - / traz no vento de suas asas / leve brisa às folhas".
Então, o haicai é mais do que palavra e olhar. É ver numa cena uma coisa interessante. Como quem aponta para um amigo e mostra, olha só: "Nas vestes rasgadas / já não espanta os pássaros - / ninho no espantalho." E não apenas olha só, mas escuta só: "Seis horas da tarde - / sons das cigarras prolongam / os sinos do templo."
Ou ainda, sente só o cheiro: "Manhã de domingo - / cheirando mais que o café / a baunilha em flor." E pode ainda chegar ao paladar: "Goiaba madura / de polpa carnuda e rubra - / banquete de pássaros."
E até ao tato, como esse inadvertido macaco velho que meteu a mão em cumbuca: "Lição esquecida - / mico-leão mete a mão / no ouriço da castanha." Estar aqui e agora, com os cinco sentidos ligados e, a partir daí, encontrar um sexto sentido: o haicai. Essa experiência é que faz do haicai um tipo especial de poesia.
Não é uma poesia para dentro, para as idéias de quem está escrevendo. Mas uma poesia para fora, para captar o que vem de fora. Claro, filtrado e lido por quem está dentro. Isso não é também uma realização exclusiva do haicai.
É possível captar instantes e realizá-los em outra forma que não a desse pequeno poema de três versos exportado pelos japoneses. É possível ainda imaginar tudo. Afinal, quem vai provar que o poema não nasceu de uma experiência?
Do ponto de vista do leitor, tanto faz. Mas quem quiser se dedicar ao haicai pode encontrar no entorno instantes semi-prontos e transportá-los para o mundo das palavras.
Como o fotógrafo que olha o que todo mundo vê, mas acha um ângulo que só encontramos na fotografia que ele tirou. Anibal Beça é um desses poetas-fotógrafos. E como poeta que é, fotografa para além da imagem: "Trilhos de grafite / riscando por ruas tortas - / o bonde e a minha vida".
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